A Nutrição numa equipa profissional, com Will Carvalho do Gloucester
Será que comem assim tanto? Será mais um mito urbano? Vou tentar dar uma visão mais profunda sobre a alimentação dentro de uma equipa profissional de rugby, neste caso, do Gloucester.
O meu nome é Guilherme de Carvalho, mas por terras britânicas fiquei “baptizado” e sou conhecido por Chef Will Carvalho desde de Outubro 2006.
Desde dos meus 16 anos de idade sempre quis ser cozinheiro. Trabalhei em São Tome e Príncipe, estive dois anos num restaurante de 1 estrela Michelin quando aqui cheguei em 2006. Depois foram mais 7 anos em Londres. Em 2012 comecei a trabalhar em desporto, mais concretamente com a CBF – Confederação Brasileira de Futebol, com a Selecção Feminina.
A partir daí, a adrenalina de fazer parte de uma equipa conquistou-me, mudando-me em 2015 para o Gloucester Rugby a convite do então Director Geral, Dave Humphreys, lenda do Ulster Rugby e da Selecção da Irlanda.
No Gloucester Rugby comecei um projecto do zero com o James Hudson, ex-jogador e Nutricionista em Deporto para atletas de alta-competição.
Começámos pelo dia 1 da pré-época – todos os nossos atletas são avaliados com exames dobra cutânea e “dexa scan” (percentagem da gordura corporal e sua localização como também a densidade da massa muscular).
A partir daqui definimos o nosso plano alimentar de acordo com as sessões de treinos, todos os jogadores são reavaliados de três em três semanas. Na pré-época, o regime alimentar é muito alto, devido não só aos excessos das férias mas também temos de eliminar “maus” comportamentos alimentares que possam existir.
Quando entramos na fase de jogos, entramos naquilo que eu chamo do efeito Carro Fórmula 1, ou seja, eles, atletas, precisam do combustível necessário para aquilo que vão desempenhar, no carro de Formula 1, precisam do combustível certo (ou quase certo) para o número de voltas. O objectivo é que não haja excesso de pesos “mortos” no corpo.
Segunda feira, dia típico de recuperação, após um jogo de Sábado. A carga física poderá ser alta, mas o nível energético da comida será baixo, a proteína mantém-se sempre nas 100 gramas para o pequeno-almoço, 200 gramas para o almoço e entretanto se houver algum snack, mantemos por volta das 50 gramas.
Terça-feira, o treino físico mantém-se alto e o nível energético da comida sobe… as duas “linhas” do treino e alimentação ficam iguais!
Quarta-feira, dia de descanso, os jogadores terão que se disciplinar e manter o nível energético a meio termo, nada a mais, nada a menos.
Quinta-feira, o nível físico baixa em consideração aos outros dois dias, mas o nível energético da comida sobe, as duas linhas separam-se pela primeira vez, aconselha-se aos jogadores que introduzam mais carboidratos , ou seja energia.
Sexta-feira é o dito dia do “Captains Run”, em que a carga física é quase nula, mas a comida tem o seu expoente máximo em valores energéticos, neste dia baseamos muito a alimentação em redor de carnes brancas e tudo o que seja de fácil digestão.
Sábado, dia de jogo, pequeno-almoço reforçado, pede-se que consumam comidas com pouca gordura e de fácil digestão para que não haja algum problema no dia do jogo.
E eu? Como começa o meu dia como Chef do Gloucester? O meu dia começa às 05h00 da manha, chego ao centro de treinos, começo por verificar se está tudo em ordem, chegam as primeiras encomendas e começo a preparar o pequeno-almoço.
Por exemplo numa segunda-feira começamos com: Papas de aveia com banana e passas, ovos escalfados com cebolinho (2 a 3 ovos por cada pessoa), bacon do lombo sem gordura (2 fatias, cerca de 100 gramas), tomates cereja em óleo de cocô, espinafres com sementes de abóbora e chia, Bircher muesli e várias frutas cortadas. Temos sempre um buffet de frutas secas e algumas misturas que fazemos nos próprios, como Omega3, sementes de abóbora, chia e sésamo, tudo passado na maquina, como uma receita de granola caseira.
Passamos para o almoço: Salmão com pancetta, lentilhas com abóbora e pimentos, courgettes grelhadas com amêndoas e queijo feta. Nesta altura também fazemos sempre uma sopa, neste caso, Sopa de Cherivia (um carboidrato que tem uma libertação lenta de energia), nada melhor quando as temperaturas começam a tocar os zeros graus.
Se não tivermos muito tempo durante as sessões de ginásio e terreno (tudo o que seja exercícios no relvado, tácticas ou qualquer actividade ao ar livre), usamos a proteína Whey da USN, mas só usamos a proteína whey que seja certificada pelo Instituto Anti-Doping, para além de frutas e vegetais congelados para dinamizar ainda mais o “snack”. No verão usamos muito açaí e frutas vermelhas, mas também beterraba e cereja para recuperação.
Nós aconselhamos os nossos atletas a primeiro cozinhar e comer do que usar suplementos.
Para dar uma ideia que ao almoço, o meu planeamento são 220 gramas por pessoa de proteína animal, ou seja, um bife de 220 gramas chega, não é preciso mais, porque ao adicionar depois legumes e outros ingredientes, a proteína também aumenta.
Muitas vezes o grande desafio do dia-a-dia com os atletas é a monotonia que possa existir, por isso, faço questão que todos os dias os menus sejam diferentes, e que tenham pelo menos uma rotação de três semanas. Depois entramos na época que é longa e dura, jogadores lesionados, uns escolhidos, outros não, precisa-se motivar as tropas e muitas vezes a alimentação torna-se muito importante.
Um bom atleta come bem, descansa bem e prepara-se bem, não é preciso exagerar, mas é preciso ser constante, escutar quem aconselha e quem sabe. Cada vez mais a nutrição tem um papel fundamental, existe quem divida o trabalho de treino em três partes: preparação física, preparação tática e nutrição.
Estivemos no Algarve uma semana durante o mês de Agosto, mais precisamente no Brown’s de Vilamoura, local muito bom e que gostámos muito, eu aproveitei para cozinhar alguns pratos portugueses e demonstrar um pouco da nossa cozinha aos nossos jogadores.
Seleccionámos os melhores fornecedores a nível da qualidade e o seu constante grau de excelência.
Detalhes como estes são muito importantes!