Retrospectiva dos continentais, parte 3: Asia Cup

Lucas PachecoSetembro 14, 20258min0

Retrospectiva dos continentais, parte 3: Asia Cup

Lucas PachecoSetembro 14, 20258min0
Lucas Pacheco continua com o balanço às competições internacionais de basquetebol, com a Asia Cup a merecer a atenção do nosso autor

Sob um ponto de vista histórico de média duração, o grande embate da Asia Cup envolve Japão e China, protagonistas do continental desde 2009. As últimas oito edições foram vencidas por uma das duas seleções; para vermos uma terceira campeã, precisamos retornar até 2007, último grande momento da Coréia do Sul no âmbito internacional. A edição deste ano marcou uma cisão nessa dinâmica polarizada: a Austrália enfim faturou o troféu, após a Federação Internacional (Fiba) juntar as seleções da Ásia e da Oceania em um único continental, mudança datada de 2017. Falemos, porém, da dupla asiática antes de partir para a campeã.

A competição, realizada em julho, seguiu dentro do esperado, dividido em três blocos de forças bem delimitados (Chegou o tempo das seleções no basquete feminino); o título ficaria entre China, Japão e Austrália, a não ser se ocorresse uma hecatombe gigantesca. Em um torneio a parte, os confrontos diretos entre as três definiram o pódio; nesse quadro, a semi-final entre Japão e China figurou como a principal partida do continental. Além da rivalidade, foi um duelo de estilos opostos de jogo.

Tanto China quanto Japão inauguraram comandos técnicos novos, após os fracassos nas Olimpíadas de Paris. A China, sob comando de Luming Gong, apostou em suas pivôs e no domínio físico baseado na altura; a despeito da ausência de Li Yueru (e da ala Li Meng, outra base do sucesso recente da seleção), Han Xu (2,05m, eleita para o quinteto ideal da competição) recebeu uma companheira ainda mais alta – a sensação Zhang Ziyu (18 anos) pulou o Mundial sub 19 e foi parte importante da seleção adulta. Seus 2,20m impressionam o mundo do basquete e, em sua primeira competição adulta, vindo do banco, foi a cestinha da China com 15,6 pontos de média.

Do outro lado, Corey Gaines assumiu o comando japonês, trazendo a experiência de campeão da WNBA em 2009 para recolocar a seleção no caminho das conquistas internacionais. Com mais mudanças que sua arqui-rival, a seleção japonesa sofreu muitas mudanças no perímetro (sem as 6 armadoras [posições 1 e 2] e sem duas alas/wings do elenco de Paris), demorando a encaixar seu melhor basquete durante a Asia Cup. Independente do elenco, o Japão manteve sua identidade de velocidade, alto volume e aproveitamento de arremessos de três pontos, além das artimanhas defensivas para compensar a baixa estatura de suas pivôs.

Enquanto a China impôs-se na fase de grupos, com vitórias fáceis e largas, o Japão sofreu contra adversários pouco experimentados; as campanhas indicavam favoritismo chinês. Foi um jogaço de basquete, com placar alto, duelo tático e desempenhos individuais excelentes. Para conter o garrafão chinês, as japonesas apertaram nas passadoras e cercaram as torres gêmeas chinesas de muitos corpos quando recebiam no poste baixo – a ordem era afastar a China do aro. No ataque, deviam utilizar a diferença de altura em seu favor, apostando em velocidade nos bloqueios e obrigando as altas chinesas a defender no espaço.

Foto: JBR
Foto: JBR

Nos momentos difíceis, nos jogos decisivos, as grandes jogadoras aparecem. Outra jovem a desfalcar o Mundial sub 19 para compor a seleção adulta, a armadora Kokoro Tanaka chamou a responsabilidade na pontuação no início do jogo: a sensação mostrou suas credenciais (eleita para o quinteto ideal em sua primeira participação adulta) ao mundo do basquete e fez 21 pontos no 1Q da semi-final! Sua gravidade obrigou a defesa chinesa a pressioná-la mais durante o resto do jogo, abrindo espaço para suas companheiras. Quando o Japão impõe seu basquete característico, com igual quantidade de arremessos de dois e de três pontos, e surreais 47% de três, a seleção vence: 81 x 90.

As características físicas do elenco reduzem as variações táticas para a China. Quando Zhang Ziyu entra em quadra, sua mobilidade reduzida expõe uma fragilidade defensiva e o time vê-se obrigado a adotar a defesa zona; Ziyu não pode se afastar muito do aro e suas companheiras precisam compensar. Contra uma seleção com alto QI de basquete e ciente de sua identidade, é um buraco difícil de ser coberto. Nem mesmo o ginásio lotado e barulhento favoreceu a China, jogada com a derrota para a disputa do bronze, quando novamente tratorou sua adversária (Coréia do Sul). Luming Gong precisará oxigenar mais seus quintetos, de preferência com alas mais agressivas (nesse sentido, a jovem [23 anos] Yang Shuyu foi uma grata surpresa); diferente de sua antecessora, ele pareceu disposto a utilizar suas pivôs juntas em quadra – vejamos quando Yueru estiver disponível.

O Japão, após suar para derrotar Líbano e Filipinas na fase de grupos, com oscilação extrema, avançou à final com um basquete em crescimento. A seleção reencontrou a Austrália, de quem sofrera o revés na fase de grupos. Em outra partida de alto volume ofensivo, as australianas mostraram a fórmula para brecar as japonesas: muita defesa individual, pressionada e forte, evitando trocas. A escola australiana mostrou novamente sua força, superando a ausência das principais jogadoras (em atividade na WNBA) e de sua técnica Sandy Brondello, com aposta em jogadoras fundamentadas, fortes e físicas.

A Austrália até sofreu contra as japonesas: na primeira fase, tiveram que virar o placar do intervalo, restringindo o Japão a míseros 16 pontos no segundo tempo. Na final, o Japão conseguiu empatar no último quarto, obrigando o técnico australiano Paul Goriss a escalar jogadoras do terço final de sua rotação, as quais entraram e recuperaram a vantagem perdida (especialmente a armadora Alex Wilson, autora de pontos essenciais e cuja envergadura atrapalhou a habilidade das armadoras adversárias).

A vitória por 88 x 79 marcou o primeiro título australiano na Asia Cup desde a integração dos continentais (Ásia + Oceania); em uma campanha exemplar, cuja menor margem deu-se na final, a Austrália ampliou o rol de selecionáveis e ainda apresentou a jovem Alexandra Fowler, MVP do continental aos 24 anos. Extremamente inteligente, física e boa defensora, ela demonstrou ser parte do futuro da seleção; sua companheira, a armadora Stephanie Reid, também foi eleita ao quinteto ideal, graças à forte defesa na bola e à segurança em organizar o ataque.

 

Fora do pódio, no segundo bloco de forças do torneio, a Coréia do Sul superou a Nova Zelândia logo na estreia da competição (78 x 76). Outra partida excelente, em que as coreanas (com o novo técnico, Soo Ho Park) abriram vantagem nos 30 minutos iniciais e quase deixaram o triunfo escapar no quarto decisivo. O basquete coreano é o mais próximo do japonês e também aposta em velocidade, muita movimentação (tanto da bola quanto das jogadoras) ofensiva e estratagemas defensivos para desestabilizar as adversárias e obriga-las a decisões instantâneas. JiSu Park segue como a principal jogadora, a despeito da excelente campanha da ala Jihyun Park, que completou o quinteto ideal da Asia Cup.

A Coréia firmou-se como a quarta força, posição de intensa disputa com a Nova Zelândia, porém ainda muito distante do trio de ferro (sofreram duas derrotas largas para a China, por exemplo, e não ameaçaram verdadeiramente a Austrália na outra semi-final). À Nova Zelândia, restou a esperada vaga no pré-mundial depois de deixar a vitória escapar contra a Coréia do Sul na última posse do jogo inaugural.

Chegando à rabeira da Asia Cup, a Indonésia terminou em último, rebaixada para o grupo B do continental (único com duas divisões). A última vaga para o pré-mundial foi conquistada pelas Filipinas, em disputa acirrada contra o Líbano ainda na fase de grupos. A vitória filipina (73 x 70) foi obtida na última rodada do grupo B, em outro bom e equilibrado jogo. Repleta de alternâncias no placar, a partida manteve o sonho filipino de chegar ao Mundial, graças à onipresente pivô Jack Animam e às impetuosas armadoras Vanessa de Jesus, Sumayah Sugapong e Naomi Panganiban.

As Filipinas dependem em excesso de sua pivô, mas não se enganem: seu perímetro compensa a baixa estatura com bons movimentos de arremesso e coragem para atacar defesas desatentas. É um elenco jovem que, se melhorar sua defesa, pode causar surpresas no pré-mundial contra as seleções mais fracas oriundas do Eurobasket (Retrospectiva dos continentais, parte 1: Eurobasket) e da Americup (Retrospectiva dos continentais, parte 2: AmeriCup).


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