Pílulas de LBF

Lucas PachecoMaio 9, 20247min0

Pílulas de LBF

Lucas PachecoMaio 9, 20247min0
Lucas Pacheco olha para alguns problemas internos da LBF e como poderá ser o futuro dela neste artigo para o Fair Play

A essa altura da competição, soa repetitiva a descrição da Liga de Basquete Feminino (LBF) como ‘perde-ganha’. Porém, nenhuma outra alcunha define tão bem a temporada atual, exemplificada pela sequência recente de Santo André: após desbancar o favoritíssimo Sesi Araraquara (60 x 52), a equipe sofreu para vencer a lanterna Ponta Grossa (85 x 79), seguida de uma derrota apertada para Blumenau (65 x 68). Contra Ituano, detentor da terceira posição na tabela de classificação, a volta por cima aconteceu em grande estilo, com uma vitória larga (90 x 59). O equilíbrio impera e qualquer resultado pode acontecer.

Se a competitividade acrescenta um atrativo, as expectativas com a chegada de uma nova leva de jogadoras para o terço final da temporada regular tendem a aumentar ainda mais. Por um lado, muitas equipes sofrerão verdadeiras metamorfoses, com praticamente a substituição completa da rotação; por outro, se bem realizada, a incorporação das estrelas oriundas da Europa pode catapultar alguns times a posições inimagináveis no começo da liga.

Chegadas tardias

No cenário da guinada brusca, Blumenau desponta a frente das demais. Com um elenco enxuto e carente de reposição no primeiro turno, de repente o time passa a sonhar alto, com a chegada da armadora argentina Meli Gretter, da pivô Maria Carolina e da ala-pivô Maiara. Logo na estreia da armadora, vitória sobre Santo André, com direito a 16 assistências da outrora MVP da liga; sua inteligência, visão de quadra e habilidade beneficiaram toda a equipe – Maria Carolina, por exemplo, saiu-se com o expressivo duplo-duplo de 19 pontos e 13 rebotes, explorando o jogo de bloqueio e pick and roll com Gretter.

Ainda cedo para cravar um limite a um time tão modificado, é certo que Blumenau crescerá muito na LBF. Assim como o Sampaio Basquete, que enfim integrou as estadunidenses Chrislyn Carr (armadora) e Trinity Baptiste (ala-pivô) ao elenco; apesar do elenco permanecer sem uma pivô de ofício, as adições darão novas camadas à proposta tática de Bruno Guidorizzi, pautada pela defesa agressiva, movimentação de bola e intensidade, sem uma protagonista.

O Unimed Campinas segue com treinador interino, o qual passa a ter mais opções para montar sua equipe. Enquanto as mais novas seguraram a barra no primeiro turno, elas devem perder espaço na rotação com a chegada da ala Maíra Horford e das alas-pivôs Isadora (egressa da NCAA) e Maísa.

Praticamente todas as equipes receberam/receberão reforços de peso: Ituano logo receberá a pivô Monique, vinda de excelente temporada em 2023 e com o vice-campeonato português na mala, permitindo algum descanso à estrela Gabi Guimarães (favorita ao MVP até aqui). O Corinthians terá uma das estrelas da seleção brasileira, com a chegada da ala Tainá Paixão; Sodiê Mesquita está ambientando a ala Thayná, outra com dois troféus pregressos de MVP. Santo André aguarda ansiosamente a recuperação física da pivô Letícia.

Para uma competição marcada pelo equilíbrio, nada melhor que aprofundar ainda mais a competitividade. Ganhamos os espectadores da liga.

Sobe e desce

Nádia Colhado sofreu uma contusão no joelho na estreia de Ponta Grossa na temporada, que a afastou por diversas rodadas. Nesse período, sua equipe acumulou derrotas e os esforços individuais da armadora colombiana Manu Rios ofuscavam-se na ausência de outra pontuadora e referência. O retorno de Nádia propiciou a ressurreição de Ponta Grossa, que saltou de uma campanha de 0v e 11d para a entusiasmante sequência de 3v e 1d nos últimos jogos.

De lanterna, o time paranaense passou a sonhar com playoff. Nádia entrega um duplo-duplo por jogo, número por si impressionante, mas sua presença incrementa a produção de Manu Rios e permite a consolidação do restante do elenco. Antes perdido, sobrecarregando funções, o elenco de apoio pôde focar em suas especialidades: Júlia Letty com seus chutes fatais de três, Bia Gabrielle com explosão rumo à cesta, Karina Jacob com ênfase nos rebotes. Tudo se encaixou em Ponta Grossa.

Enquanto uns sobem na LBF, outros descem vertiginosamente. Se Ponta Grossa encontrou seu estilo, São José perde-se mais a cada partida. Sem uma identidade tática, sem uma base definida de papéis, os bons valores individuais (muitos dos quais com pouca rodagem na LBF) veem seus números caírem e o bom desempenho do início do campeonato desapareceu. O time já figura fora da zona de classificação e o técnico Leandro Leal corre contra o tempo para reavivar a esperança e o bom basquete.

Categoria e fundamento

Manu Rios tem uma fome de pontos rara nas armadoras recentes da liga. Ela ataca a cesta, infiltra em profusão e abusa do pick and roll. No lance abaixo, uma jogada simples, em que ela recebe o bloqueio e engana a defesa com um movimento de hesitação, segundos preciosos nos quais lê a defesa e se aproveita da falta de comunicação de São José. Um primor!

Evolução gradativa e linear

Outra característica da atual temporada, possibilitada pelo aumento dos participantes na LBF, é a presença de jovens jogadoras, sem oportunidades em edições passadas. O desempenho varia, mas a presença delas têm sido uma constante. Uma das maiores beneficiadas é a armadora de Santo André, Marcella Prande, de 19 anos.

As principais estatísticas (pontos, rebotes, assistências) permanecem similares ao ano passado. Porém, ao abordar do desenvolvimento de jovens, devemos ampliar o olhar – seu desempenho melhorou a olhos vistos, o que fez sua minutagem disparar (de 6,7 min em 2023 para 17,2 em 2024). Anima o aproveitamento nas bolas de três, com ótimos 36,7% em 2 tentativas por jogo.

Seu físico franzino ainda carece de fortalecimento e impede o salto no aproveitamento de bandejas, quando evita o contato e restringe a finalização próxima ao aro; ainda assim, é das poucas armadoras da liga que utiliza floaters. Onde sua presença cresceu, nas sombras das estatísticas, é na defesa – Marcella tem conseguido manter-se na frente de jogadoras mais fortes e explosivas, manejando sua altura (1,80) e envergadura para proteger o aro e recuperar bolas aparentemente fáceis.

Marcella conquistou a confiança do técnico Rafael Choco e passou a membro fixo da rotação de Santo André. Com um longo caminho pela frente, ela aproveitou as oportunidades e expandiu seu jogo. Convem ficar de olho aberto.

História e homenagem

Em uma liga com patrocínio intermitente, acabamos deixando de lado aspectos importantes para qualquer competição esportiva. Relegamos a história da LBF em detrimento da sobrevivência e continuidade da liga, menosprezamos estatísticas comparativas e avançadas em prol de índices brutos.

Nesse cenário desolador, avanços como o aumento dos participantes merecem salvas. Todos os atores envolvidos precisam se esforçar para elevar a liga a patamares mais altos, incluindo a torcida. Por essa razão traz tanto reconforto a imagem abaixo, do ginásio do Santo André.

A torcida da primeira equipe campeã da liga homenageando sua eterna capitã, a pivô Simone Lima, falecida no final de 2023. Gesto pequeno, mas que demonstra a importância de alçar jogadoras históricas a categoria de ídolas. Sempre importante louvar as pioneiras que trilharam o caminho até o presente.


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