O despontar de São José

Lucas PachecoJunho 10, 20255min0

O despontar de São José

Lucas PachecoJunho 10, 20255min0
O São José está em grande e Lucas Pacheco olha para como podem ser decisivos para o futuro do basquetebol brasileiro

A monotonia da LBF vinha sendo cantada desde o começo da temporada (até antes). A previsibilidade assenta nas últimas finais, decididas pelos mesmos dois times que protagonizam os investimentos e condições de trabalho. A Copa LBF não somente repetiu o confronto quanto o baixo nível do basquete praticado. E, de repente, não mais que de repente, a poeira é agitada com a demissão de David Pelosini do Sampaio e o retorno de Rodrigo Galego, campeão em 2022.

O papa-títulos Sesi Araraquara, por sua vez, na ressaca de mais um troféu conquistado sem bom desempenho, cai seguidamente perante dois adversários inusitados. Primeiro, perde (EM CASA) para São José por 58 x 68; três dias depois vai para Campinas e nova derrota, 78 x 68. Sinal de alerta em Araraquara.

Apesar da praticamente definida classificação pros playoffs, os últimos dias não foram nada monótonos. Estendendo o olhar para o último mês, outra mudança, esta mais sutil, transpassou um dos times medianos na tabela. O São José venceu o Sesi na culminância de uma melhora no basquete, com vitórias inesperadas no caminho, fruto de uma nova formação no quinteto principal da rotação.

As chegadas da ala Maíra Horford (utilizada às vezes na posição 4 em formações mais baixas) e da pivô Bárbara oxigenaram as duas protagonistas do time ao longo da competição, as colombianas Manu Rios e Jennifer Muñoz. Horford chegou antes, com estreia exitosa sobre a Sodiê Mesquita; o triunfo selou o fim da dura sequência de reveses contra lanternas da competição, chegando a ameaçar a vaga nos playoffs. Foi o primeiro sopro de mudança e frescor.

Bárbara, jogadora subestimada no cenário nacional, colocou a cereja no bolo; sua estreia aconteceu três partidas depois, na apertada e disputada derrota para Ourinhos (66 x 62), quarta força na tabela. Na partida seguinte, um Corinthians mais encorpado e mais entrosado, terceira força da temporada, sofreu para derrotar São José – 66 x 69. A tabela continuou cruel para São José e reservou Araraquara na sequência, vindo do título na Copa.

São José estava pronto para surpreender e sinalizar a guinada na campanha (e no estilo de jogo). O perímetro segue sem alterações desde a estreia, seja na composição formada por Manu Rios, Jennifer Muñoz e Mayara Leôncio, seja na distribuição de funções e hierarquia dentro de quadra (respectivamente: conduzir a transição e atacar a partir de bloqueio; espaçar e arremessar, inclusive como desafogo; 3-and-d). O trio funcionou bem na primeira parte da competição, quando a pivô Juliana impôs um ritmo acelerado e de corte pra cesta (pick and roll). A contusão de Juliana, desfalque pro resto do torneio, parecia jogar pá de cal nas pretensões do time.

Maíra Horford é uma ala com bom chute de três (para os padrões da LBF), envergadura, altura e mobilidade para dificultar diferentes posições. Sua chegada jogou Laurah para o banco, onde floresceu e encontrou seu arremesso confortável, de média distância. A principal adição, porém, foi o pacote trazido pela pivô Bárbara, perfil radicalmente diferente ao de sua antecessora na posição 5. Seu ritmo é mais lento,  cadenciando mais o ataque e explorando sua inteligência e visão de quadra; ela ocupa lugares mais espaçados, mais perto do poste alto e do cotovelo; Bárbara, principalmente, prefere espaçar a quadra após o bloqueio direto na armadora, ao contrário dos principais recursos de Juliana.

Além de boa bloqueadora, ao espaçar a quadra a pivô abre mais opções e linhas de ataque à condutora da bola. Manu Rios se esbalda; se a ajuda do lado contrário aparece, Mayara e Munõz e Horford esperam pelo passe, abertas na linha de 3. Todas se beneficiam do talento de Bárbara e despontam como armas perigosas, capazes de estressar a defesa adversária e espalhar os riscos pela quadra.

A experiência também pesou na condução da vitória sobre o Sesi Araraquara; o resultado foi construído durante os 40 minutos, o time soube controlar a vantagem e conter as aproximações do Sesi. No final, uma vitória tranquila por 58 x 68, com boas contribuições de todas que entraram.

Se esse padrão continuar, o time pode sonhar com uma surpresa nos playoffs. Quase garantido na sexta posição, o confronto dar-se-ia contra o terceiro (Sesi ou Corinthians). Por que razão não sonhar? As estatísticas comprovam a melhora após a chegada dos dois reforços que definiram a cara do time: nos 12 jogos iniciais, foram 67,5 pontos anotados e 69,6 levados (plus minus negativo). Nas sete últimas partidas, as médias subiram e positivaram o plus minus: 74,5 pontos anotados contra 71 levados. Nada mau.

Todo esse plot twist de São José nos leva a um mea culpa sobre o técnico Leandro Leal, sempre tão criticado por estas bandas. Crítica não de toda desmerecida: o técnico nunca conseguiu extrair o melhor de seus elencos jovens, sem tampouco solucionar problemas crônicos, como a transição defensiva e a intensidade baixa. A temporada atual deu um respiro para o técnico, a frente do  projeto desde o retorno aos principais palcos do país (LBF e Paulista adulto).

Que a evolução na reta final marque o início de sucessivas melhoras na carreira do treinador. Susu e Ana Júlia, sem qualquer responsabilidade ofensiva, podem contribuir  por curtos períodos na defesa e na intensidade. O teste dos playoffs costumam definir uma temporada – São José soube se reencontrar com um basquete inteligente durante a competição. Resta o teste decisivo, para o qual  o time chegará preparado.


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