C’est Fini! – a prestação do judo nacional em Paris 2024

João CamachoAgosto 13, 20249min0

C’est Fini! – a prestação do judo nacional em Paris 2024

João CamachoAgosto 13, 20249min0
João Camacho passa em revista o que se passou com o judo nacional nos Jogos Olímpicos 2024 e quais foram os principais destaques

Os Jogos Olímpicos de Paris chegaram ao fim e o Judo voltou a trazer, pela terceira edição consecutiva, uma medalha para Portugal. Patrícia Sampaio é a protagonista desta fantástica conquista, com uma prestação impressionante e arrebatadora que terminou com a Medalha de Bronze da categoria dos 78Kg! A Sociedade Filarmónica Gualdim Pais, de Tomar, tem uma MEDALHA OLÍMPICA!!

Na ressaca desta conquista, urge não esquecer que o Judo Português continua a não ter infraestruturas de qualidade, nomeadamente uma sede com um tapete moderno para a prática do Judo, com instalações dignas e modernas para acomodar os atletas, onde não só os Judocas portugueses como os Judocas de outras nacionalidades, possam treinar, trocar experiências, elevar o nível! A instalação federativa de referência, uma sala na garagem do complexo das piscinas do Jamor, sem ventilação, sem luz natural e sem condições dignas e de segurança para a prática da modalidade, reflete a atual realidade do Judo nacional, que sobrevive da superação e carolice de atletas e treinadores, e dos subsídios do estado…

Também destaco a premência da aposta no trabalho de base, do necessário investimento no desporto na escola e no desporto escolar, da articulação da escola com a prática desportiva, que hoje é inexistente e leva a que muitos potenciais talentos abdiquem de uma carreira desportiva de sucesso. O trabalho na base da pirâmide permitirá sinalizar jovens atletas com potencial, definir um plano, um conjunto de objetivos, e assim aspirar a que os resultados de excelência que temos alcançado continuem a surgir e se amplifiquem, naturalmente.

Para finalizar, saliento que para um atleta ter sucesso na alta competição também é preciso querer! Querer Muito! Estar disposto a abdicar, a sacrificar, a sofrer. Patrícia Sampaio é um excelente exemplo de resiliência, dedicação, de capacidade de sofrer, de renascer e se reinventar! São dez anos de trabalho intenso, ao mais alto nível, com uma carreia brilhante na formação, que culminou com este fabuloso Bronze Olímpico e, acredito, não ficará por aqui!

Jogos Olímpicos de Paris

A Competição Olímpica de Judo em Paris foi um reflexo da realidade atual do Judo mundial- Competitiva, imprevisível, emocionante e com um nível altíssimo, do qual não há memória! O Japão terminou como país dominador da competição individual (3 Ouros, 1 Prata e 3 Bronzes), apesar das muitas surpresas, com muitos campeões em título e fortes candidatos a ficarem pelo caminho logo nas eliminatórias, e aqui tenho de destacar ABE Uta, a jovem japonesa Campeã em Tóquio nos 52KG, que era apontada como a candidata sem concorrência à altura, que acabou derrotada na segunda ronda, frente à talentosa Diyora KELDIYOROVA, líder do ranking mundial desta categoria de peso, do Uzbequistão, e que viria a conquistar o titulo olímpico desta categoria. Foi penoso, diria arrepiante, ver como a japonesa literalmente desfaleceu, chorando compulsivamente enquanto era amparada pelo seu treinador e o público, que encheu por completo a arena Champ-de-Mars durante todo o evento, gritava o seu nome em sinal de respeito e admiração. Decididamente uma das imagens que ficará destes jogos. Também ficou evidente, que o excesso de confiança da equipa técnica japonesa, que prescindiu de uma presença mais regular de ABE, e não só, no Circuito Mundial, o que culminou com a saída desta do top 8 em prova e, assim, fora do estatuto de cabeça de série, se revelou desastroso, pois o sorteio colocou-a logo na segunda ronda frente à Uzbeque e a derrota, ainda na fase das eliminatórias, automaticamente colocou ABE fora da competição.

Há que destacar a enorme prestação dos Judocas do Azerbaijão, que ficaram em segundo lugar no “medalheiro”, com duas medalhas de ouro; HEYDAROV (73Kg) e KOTSOIEV (100Kg). Por fim os Franceses, que se superaram, embalados por um ambiente eletrizante, muito ruidoso, talvez o melhor ambiente de que há memória na competição olímpica de Judo e que, literalmente, ficava ao rubro sempre que atletas franceses entravam em ação. De notar que aconteceu o mesmo em todas as modalidades do programa olímpico!! Uma lição de patriotismo, desportivismo e de como apoiar a os atletas “da casa”! Na emocionante competição de equipas mistas, a França, mais uma vez, derrotou o Japão, conquistando, pela segunda vez consecutiva, a medalha de ouro.

Tenho de referir que o fator casa, em diversos momentos, acabou por ser determinante, não só pela vontade dos Judocas da casa, que era muita e aJudou a que estes crescessem e se superassem perante o seu público, família e amigos, mas, infelizmente, por também ficar evidente alguma permissividade nas arbitragens, que protegeram os Judocas da casa, falhando nos imprescindíveis critérios da uniformidade e coerência. Tal foi visível em diversos combates em que os Judocas franceses estavam em ação, mas destaco um, a final da competição de equipas mistas, no combate dos 73Kg masculinos que colocou frente a frente o Japonês Abe (campeão olímpico dos 66Kg e que subiu de categoria para esta competição), e o Francês Gaba (surpreendente vice-campeão olímpico dos 73Kg). Caso o japonês vencesse, o Japão seria imediatamente proclamado campeão, mas tal não veio a acontecer, o combate seguiu para golden score e ao fim de 5 minutos (9 minutos de combate total), Gaba acabou por projetar o Japonês, colocando a França de novo em jogo. A inércia da arbitragem e da comissão de supervisão da arbitragem foi evidente, o Francês deveria ter visto o 3.º castigo por passividade (ausência de ataques e de Judo positivo) e tal não aconteceu. Sinceramente não sei se para defender o espetáculo ou para proteger a nação anfitriã…

Sobre a prestação portuguesa, ficou a sensação que podíamos ter regressado de Paris com uma prestação melhor que em Tóquio 2020, onde Portugal terminou com um Bronze (Jorge Fonseca e o 5.º lugar de Catarina Costa). Como já referi, o nível estava muito alto e pagaram-se muito caras as desatenções, as hesitações e a inexperiência a este nível. Foi também evidente que alguns dos Judocas Portugueses não se apresentaram na melhor forma, não sei se por lesão ou deficiente preparação e também há que lembrar do impacto na progressão de não ser cabeça de série, colocando alguns dos Judocas portugueses em prova logo frente a frente com candidatos ao pódio, mais bem contados no ranking.

No próximo artigo, farei uma análise mais detalhada à prestação de cada um dos Judocas Portugueses em ação, sendo que o destaque, naturalmente, vai para Patrícia Sampaio.

Os Jogos de Paris foram mais uma memorável celebração do desporto, no entanto, foi evidente que a ausência da equipa da Rússia acabou ter um grande impacto nos resultados finais. No caso do Judo, algumas categorias de peso ficaram privadas de alguns dos principais candidatos ao ouro.

No que respeita à organização, e de acordo com múltiplos testemunhos de quem lá esteve, ocorreram falhas graves, nomeadamente ao nível do conforto nas habitações dos atletas, na aldeia olímpica (a ausência de ar condicionado e persianas/cortinas nos quartos dos atletas tornou o ambiente insuportável), da rede de transportes, deficiente, sem conforto e com muitas restrições em virtude das ameaças de segurança, e, por último, no que respeita à alimentação, que ficou claramente aquém do que é exigido para um evento desta magnitude!

No Judo em concreto, a localização das provas na Champ-de-Mars Arena (estrutura provisória) foi uma solução desastrosa e que se revelou manifestamente aquém do exigido para uma modalidade que é das maiores e com mais visibilidade em França. Relembro que todos os anos, na etapa rainha do Circuito Mundial, o Grand Slam de Paris, a emblemática Accor Arena (Bercy Arena) regista a presença diária de mais de 20.000 espetadores. Esta situação acabou por provocar um diferendo e enorme mal-estar de última hora entre o Presidente da FIJ-Federação Internacional de Judo, Marius Vizer, e o COI-Comité Olímpico Internacional e a organização dos Jogos Olímpicos.

Para terminar, destaco o momento alto desta intensa semana de competição, o 3.ºtitulo olímpico do colosso Francês dos +100Kg, Teddy Riner, que soma assim 5 medalhas olímpicas (3 de Ouro e 2 de Bronze), e o papel determinante que este fantástico Judoca teve na conquista do titulo de equipas Mistas! Colossal! Teddy provou que é o maior nome da história desta modalidade! Long Live King Riner!

PARABÉNS aos medalhados Iúri Leitão, Rui Oliveira, Pedro Pichardo, Patrícia Sampaio, aos atletas que garantiram Diploma Olímpico e a todos os atletas que marcaram presença em Paris 2024, aos seus treinadores e restante equipa (vasta) e, também, a todos os que, não conseguindo a qualificação, ajudaram na preparação, porque não se fazem Campeões isoladamente!

Agora é começar a planear Brisbane 2032, porque Los Angeles está aí à porta e o comboio já está em andamento… a todo o gás! Deixo um veemente apelo a políticos, dirigentes, atletas, todos os Portugueses, vamos ao trabalho, sem esquecer esses comentadores especialistas e oportunistas que “habitam” por esses canais televisivos fora, para que façam um “pacto de regime” e passem a pensar mais no Desporto, a falar de Desporto com seriedade, que não se poupem para estes momentos de superação e glória, quando é fácil a associação ao sucesso.


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