Jovens destaques no grupo C da Euroliga

Lucas PachecoOutubro 20, 20247min0

Jovens destaques no grupo C da Euroliga

Lucas PachecoOutubro 20, 20247min0
Lucas Pacheco escolhe as atletas mais jovens em grande destaque neste arranque da Euroliga 2024, com algumas surpresas à mistura

Duas rodadas da Euroliga foram suficientes para ligar o sinal de alerta em algumas equipes. Nenhuma grande surpresa aconteceu no topo da competição, com as duas (grandes) favoritas turcas vencendo com tranquilidade; Fenerbahçe e Çukurova Mersin seguem invictos. O alerta foi ligado, porém, já no bolo intermediário e a atual vice-campeã não tem mais margem de manobra.

Como dito na prévia da temporada, muitas equipes disputam nesse bloco, com maiores chances aquelas que largarem bem. Não foi o caso do Villeneuve D’Ascq, cujas derrotas por placares amplos a colocam na lanterna do grupo C. Na estreia, em casa, a reedição da final da temporada passada acabou como previsto: 52 x 81 para as visitantes do Fenerbahçe. Um elenco totalmente reformulado, desfalcado ainda por cima de sua jogadora mais experiente (a ala-armadora Shavonte Zellous), não teve chance perante Meesseman e companhia. Se o resultado não surpreendeu, por outro lado a equipe pareceu saber seu atual estágio de reformulação e não se desmontou mesmo com a desvantagem construída no primeiro tempo.

Em busca de entrosamento e de assimilar a proposta tática do técnico Rachid Meziane, a equipe foi liderada pela armadora Carla Leite, outro prospecto de primeira linha do basquete mundial que estreia na Euroliga. A francesa, após dominar a liga local em 2023-24, chegou em Villeneuve e mostrou seu talento de cara, a ponto do time depender de sua produção para pontuar no início do jogo. Sem sentir o peso do palco e da competição, Leite liderou suas companheiras e manteve o padrão durante os 40 minutos. Em 34 minutos de quadra, ela finalizou como cestinha de seu time (14 pontos), além de 6 assistências.

Importante frisar que, do elenco vice-campeão europeu, as principais peças deixaram a equipe: Kamiah Smalls (ala fogosa e pontuadora nata) migrou para Veneza, Janelle Salaun (ala forte, exímia defensora e atiradora de três) mudou-se para Schio, Kariata Diaby (pivô que segurava a bola no poste baixo) foi para Tango Bourges, Lisowa Mbaka e Mununga (importantes peças do banco) saíram, além da protagonista Kennedy Burke, que disputa neste momento a final da WNBA (sem informações se ela retornará a Villeneuve). Praticamente o time todo mudou, desmontando uma equipe muito marcada pelo conjunto coeso e pelo estilo de jogo muito bem azeitado.

Meziane começou a temporada do zero, sem nenhuma estrutura, e isso foi sentido na segunda partida da Euroliga: derrota na Polônia para o Polkowice, por indiscutíveis 90 x 63. Tratava-se, na teoria, de um confronto direto pela última vaga e o resultado obriga a equipe francesa a se recuperar na próxima rodada, sob risco da eliminação precoce. Diferente da estreia, quando Carla Leite conduziu as rédeas, na Polônia ela se envolveu em problemas de falta (4), reduzindo sua permanência a 21 minutos (8 pts e 4 ast). Zellous assumiu a armação, mas seu estilo mais agressivo não auxiliou no entrosamento coletivo; a equipe desestruturou-se nos dois lados da quadra, com problemas excessivos de marcação de bloqueios (ora em blitz, sem coesão nas duas defensoras envolvidas, ora em drop, sem cobertura eficiente).

Individualmente, as contratações ainda não se aproximam do nível da temporada passada. As alas Slonjsak e Turcinovic atuam mais como arremessadoras off-ball e sofrem ao conduzir pick and roll (um dos fundamentos do estilo de Meziane); Fopossi agride a cesta sem a mesma qualidade de Burke; as pivôs Kelsey Bone e Aminata Gueye ainda não conseguiram se inserir no esquema. Para piorar, Villeneuve perdeu seus três primeiros jogos da liga francesa, demonstrativo que os ajustes talvez levem mais tempo que o esperado, não disponível caso o time almeje avançar de fase na Euroliga.

Nem tudo são trevas (ainda): as experientes (armadora reserva) Caroline Heriaud e (pivô) Helena Ciak devem retornar em breve, assim como se espera que a promessa Maia Hirsch (pivô) estreie logo na Euroliga. Por ora, aproveitemos para se deliciar com a maturidade de Carla Leite: sem deixar de procurar a cesta, ela lidera sua equipe em quadra, e domina os espaços vazios e antevê as movimentações. Sim, em apenas dois jogos, sua categoria já ficou evidente – mesmo na dura derrota na Polônia, em exibição abaixo, ela foi a única titular a sair com plus minus positivo (+3).

O Polkowice também sofreu mudanças profundas no elenco, mas seu excelente técnico Karol Kowalewski está passos a frente na estruturação coletiva. Outro elenco que, individualmente, está abaixo da temporada anterior; a bem da verdade, um elenco bem limitado. A jovem ala Julia Piestrzynska (23 anos), pouco utilizada no ano passado (7,7 minutos por jogo), vem recebendo – e aproveitando – mais oportunidade (minutagem saltou para 18,6). Aliás, as duas rodadas evidenciam a queda no poder de investimento da Euroliga; retomando uma tendência interrompida pela pandemia de covid, o mercado chinês assumiu a dianteira no basquete feminino mundial, atraindo as principais jogadoras do mundo. O resultado é perceptível pela quantidade de jovens com minutagem na Euroliga; a competição europeia ainda deve receber mais contratações, porém a quantidade disponível reduziu, tanto pelo mercado chinês, quanto pela liga Unrivaled, favorecendo a permanência das estrelas nos Estados Unidos durante a offseason da WNBA.

O elenco do Fenerbahçe (líder do grupo C com duas vitórias) exemplifica esse fenômeno – se na temporada passada contou com Kayla McBride e Napheesa Collier, este ano suas substitutas são Ariel Atkins e Tina Charles (troca da dupla protagonista da finalista da WNBA por duas jogadoras que mal chegaram aos playoffs). O mercado é muito fluído, dispensas e chegadas durante a temporada são comuns na Euroliga. De qualquer maneira, as favoritas ao título continental são aquelas compostas pelas principais jogadoras europeias – razão pela qual tanto se especula sobre o destino de Leonie Fiebich após o término da WNBA.

Por falar em Fiebich, sua ex-equipe fecha o grupo, empatada no momento na segunda colocação. O Casademont Zaragoza não teve tantas mudanças quanto suas rivais, apesar de ter perdido peças-chave naquele conjunto especialista em cadenciar a partida. A manutenção da armadora Marionna Ortiz, motor e líder, influi na semelhança do padrão entre as duas temporadas, assim como a ala Tanaya Atkinson, apesar de seu desfalque na derrota da segunda rodada para o Fenerbahçe (84 x 64).

Quem tem todas as ferramentas, bem como a mentalidade, para assumir o lugar de Fiebich é a jovem ala Helena Pueyo. Sem necessidade de protagonismo, sem precisar da bola para impactar no jogo, disposição para o trabalho sujo e muitas vezes silencioso, ótima defesa e inteligência ofensiva, Pueyo é mais uma da linhagem das operárias que preenchem todos os quesitos em uma quadra de basquete. Uma peça de ligação que não deixa de pontuar quando exigida, uma defensora de perímetro para brecar as principais armas ofensivas das adversárias. Não à toa, na estreia (vitória em casa sobre o Polkowice, 76 x 73) com míseros 7 pontos, em 4 arremessos tentados, ela foi a segunda mais eficiente (16) de sua equipe; na segunda rodada, novamente igurou no topo de sua equipe em eficiência (17), na pontuação (16) e nos roubos (5).

Pueyo tem 23 anos e estreia na carreira profissional. Sua temporada começou bem e tende a melhorar. Mais uma jovem, estreante, a tomar de conta do principal torneio continental. Zaragoza vai depender de seu desempenho para sonhar alto.


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