Futsal: um desporto de cultura tática

Rafael RaimundoFevereiro 24, 20187min0

Futsal: um desporto de cultura tática

Rafael RaimundoFevereiro 24, 20187min0
O futsal é um desporto táticamente exigente e por isso o Fair PLay deixa-lhe algumas ideias de como ver um jogo de futsal com "olhos" de ver.

No último mês o futsal tem ganho cada vez mais apreciadores, ainda que apenas seja por Portugal conquistado um título europeu. Para os que apenas gostam de ver a bola a rolar e olham de forma desatenta, este é só mais um jogo de futebol, diferenciando-se do mesmo por ser jogado dentro de um pavilhão, com cinco jogadores de cada lado e balizas mais pequenas. Contudo, o futsal é muito mais do que o futebol em dimensões mais pequenas, tacticamente é de certo mais exigente do que o futebol.

Ao contrário de Ronaldo e Messi que são autênticos desequilibradores no ataque, mas que a defender são mais fracos, os jogadores de futsal não só têm de saber atacar como a forma como posicionar-se a defender. Veja-se que o melhor do mundo da modalidade, Ricardinho, é um jogador muito completo nesse aspeto. Depois, claro, junta à capacidade tática um pé esquerdo fabuloso.

O Fair Play não pretende dar uma aula técnica e discutir qual a melhor forma de jogar, até porque para isso existem treinadores diplomados que o são capazes de fazer com bastante mais facilidade, mas sim dar “luzes” para que da próxima vez que for ver um jogo de futsal tenha uma outra capacidade de “olhar o jogo”.

O futsal tem bases idênticas ao futebol em momento de ataque e de defesa

Cinco jogadores de cada equipa começam o jogo e precisamente desde o segundo em que o árbitro apita há logo jogadas preparadas para executar, nomeadamente da equipa que iniciou o jogo com a posse de bola. Não é obrigatório que assim seja, porém, regra geral, as equipas preparam esses momentos conhecidos por “bola de saída”.

Seja em paralelas/diagonais, seja em entradas duplas, apoios entre linhas, bloqueios para permitir o remate a um jogador da sua equipa, por norma, o que tem melhor longa distância. Apenas são necessários entre cinco a dez segundos para que o marcador altere.

Pelas dimensões reduzidas do campo, atacar torna-se uma tarefa mais difícil e que precisa de mais do que um jogador com capacidade de individualmente desequilibrar a defesa contrária. Neste aspeto, bem como na defesa, o futsal é semelhante ao futebol. A atacar a equipa dispõe-se consoante aquela que é a abordagem ao jogo.

Com um pivot posicional – normalmente associado a um tipo de jogo direto em que o jogador nesse posição tenta ganhar posição ao seu opositor direto ou segura a bola para que um colega chegue perto dele e consiga fazer um remate potencialmente perigoso; com um pivot móvel – aí o jogador que há dois segundos era o jogador mais recuado da equipa passa a ser o que está mais perto da baliza contrária, na tentativa de através de movimentos rápidos criar linhas de passe sucessivas à medida que cria ainda desorganização na defesa da equipa adversária.

Há ainda a opção de jogar sem pivot em que os jogadores fazem entradas curtas esperando a rutura da primeira linha defensiva contrária para depois criar situações de superioridade numérica ofensiva.

Já na defesa as opções passam por pressionar logo a saída da bola do guarda-redes, defender na zona do meio-campo ou recuar as linhas a ponto de o jogador que defende mais à frente estar na zona dos dez metros. Esta defesa é característica de um momento de 5×4.

Defesa à zona ou em que cada jogador acompanha um adversário até ao fim, ou até algum colega assumir a defesa desse mesmo adversário, não é muito distinta da defesa feita no futebol.

Os lances de bola parada são absolutamente determinantes na modalidade

As grandes diferenças estão sobretudo nos lances de bola parada. Sejam eles cantos, livres ou foras laterais. Se no futebol quando um golo nasce de uma jogada trabalhada previamente se diz que é “uma jogada de laboratório” então o futsal é um jogo de laboratório.

Para cada livre ou fora existem por norma cerca de três ou quatro jogadas diferentes e que são efectuadas mediante o local onde ocorram. Para foras na zona de meio campo defensivo há um tipo de jogada trabalhada, já em zona de ataque há outro. Diversas vezes, e quando o fora é perto da linha final, opta-se por tentar realizar a jogada como se um canto se tratasse.

Em situações de livre ocorre a mesma situação. Numa primeira fase é fulcral adequar a abordagem à zona onde a falta vai ser marcada. Se o livre for mais descaído para uma das laterais o principal interesse é colocar a bola num local onde o remate possa ser feito numa zona privilegiada em relação à baliza. Com movimentos de arrasto ou bloqueios a intenção será sempre libertar um colega para este tentar finalizar.

Fotografia: UEFA

Já se o livre for central é sempre uma hipótese o remate direto, e neste tipo de livre ganha muito relevância o jogador que esteja perto do segundo poste. Uma vez que a barreira está a “fechar” a baliza, é o jogador ao segundo poste que muitas vezes “sai um metro para fora da sua zona” para tentar finalizar. O golo que a seleção espanhola marcou a Portugal na final do campeonato europeu é o exemplo perfeito deste tipo de livre. Na jogada ficaram muitas culpas para Ricardinho que o deixou o jogador espanhol sozinho naquela zona.

Por último, e não menos importante, até porque são dos lances mais simples mas que mais perigo criam, existem os cantos.

Fotografia: UEFA

Neste caso não é a equipa que ataca que decide o tipo de canto a realizar, mas sim a defesa contrária. Isto porque a jogada trabalhada vai ser consequência da forma como a defesa contrária defende a situação.

Se tiver os quatro jogadores dentro da área o lance vai ser feito em zona exterior, aqui podemos assistir aqueles golos de “encher o olho” em que há um passe picado seguido de um remate, normalmente, de primeira.

Caso a defesa contrário tenha os jogadores a defender na periferia da área, o tipo de canto vai ter a sua base de sucesso na zona entre a primeira e a segunda linha defensiva. Aqui as entradas dos jogadores dentro de área ganham força e exige que o guarda-redes da equipa que defende tenha uma atenção maior ao meio da área, uma vez que vai ser nessa zona que o atacante vai tentar desviar a bola para dentro da baliza.

Fotografia: UEFA

O Fair Play deseja que o futsal permaneça uma modalidade de senhores

Tudo o que o Fair Play tentou aqui explicar não é mais do que um resumo geral da forma como se joga futsal de qualidade, porém, entre estas ideias há muitas outras que surgem. Numa abordagem mais pormenorizada, há ainda mais detalhes que podem ser analisados, nomeadamente, como se deve jogar com guarda-redes avançado, quais as vantagens e desvantagens de defender à zona ou individualmente ou, ainda, qual a melhor forma de abordar o jogo a nível ofensivo: se com pivot posicional ou com um conjunto de jogadores mais “móveis”.

Se a modalidade vai ganhando cada vez mais reconhecimento em Portugal é vital que este seja o principal fator de interesse dos adeptos, ao invés das “picardias” que abundam no futebol nacional e que só o diminuem perante os outros campeonatos. Que o futsal permaneça um jogo de senhores e de cultura tática elevada.


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