A crise desportiva na Red Bull Racing
Como é sabido do público geral, a Red Bull GmbH conta com vários investimentos no setor desportivo, sendo os principais no mundo do futebol e desporto motorizado. Desde a sua fundação, em 1984, o austríaco Dietricht Mateschitz e o tailandês Chaleo Yoovidhya lideravam a empresa como uma verdadeira equipa, apesar de que o empresário tailandês era o proprietário maioritário, a relação de amizade entre ambos sempre se sobrepôs às percentagens. Mas a parceria entre os dois durou apenas até 2012, data em que Yoovidhya faleceu. O seu filho, Chalem, assumiu o seu posto, não alterando a hierarquia da empresa, mantendo assim, Mateschitz como o responsável máximo da corporação. Até outubro de 2022, quando foi anunciada a morte de Dietricht Mateschitz, aos 78 anos. O filho de Dietricht, Mark, ascendeu à posição do seu pai e, desde aí, a Red Bull entrou num ciclo ruinoso.
Poucas semanas depois, Oliver Mintzlaffe, até então CEO do RB Leipzig, foi promovido a diretor-executivo das operações desportivas da Red Bull, passando a controlar todo o universo referido.
2023 foi um ano muito bom para a Red Bull Racing. Max Verstappen e a equipa austríaca dominaram a temporada. 19 vitórias em 22 corridas para o piloto neerlandês e 21 vitórias para a sua construtora. Na Alpha Tauri, a conhecida equipa B, a temporada foi mais ‘azeda’, criando mesmo focos de tensão entre Christian Horner e Helmut Marko, principalmente na escolha de Nyck De Vries para fazer par com Yuki Tsunoda. Horner não aprovava a contratação do neerlandês, Marko sim.
A passagem de De Vries pela equipa de Faenza foi algo humilhante, não tendo conquistado nenhum ponto e tendo passado imensas corridas na luta para não ser o último classificado. Por certo que Tsunoda apenas tinha dois pontos, mas o nipónico era regular na luta pelos pontos, tendo ficado por três vezes a bater à porta dos mesmos.
As más exibições do piloto campeão de F2 em 2019 adensaram as tensões entre o team principal da Red Bull e o conselheiro da equipa – é preciso dizer que as relações entre o os dois são más há largos anos, mas nos últimos tempos deterioram-se a cada dia -, que amenizaram de uma forma muito ligeira quando ambos acertaram que Daniel Ricciardo devia substituir o piloto do carro 21. Os bons resultados de Ricciardo e de Lawson – o neozelandês que substituiu o australiano quando este se lesionou na mão – contribuíram para que Marko e Horner pudessem trocar alguns sorrisos mútuos.
Mas foi sol de pouca dura. Em fevereiro, um representante da Red Bull divulgou ao jornal neerlandês ‘De Telegraaf’, a queixa de uma funcionária da equipa em Milton Keynes que acusava Christian Horner de assédio sexual e que Oliver Mintzlaffe já teria conhecimento e que uma investigação independente teria sido aberta. A informação foi confirmada e o chefe de equipa, numa curta declaração ao mesmo jornal, ‘negou veementemente a acusação’.
“Es tan confuso para nosotros”
Christian Horner, jefe de equipo de Red Bull, habló sobre el inesperado descenso en el rendimiento de @SChecoPerez 🗣️https://t.co/YmX6SnXaFW
— Claro Sports (@ClaroSports) August 18, 2024
Ora, se já havia duas fações dentro da equipa, estas ficaram mais expressas com esta situação. De um lado, temos Helmut Marko, apoiado por Jos Verstappen, que apesar de ser só o pai de Max, é alguém que consegue reunir apoios dentro da estrutura da equipa, e por Oliver Mintzlaffe. Do outro lado, temos Christian Horner, apoiado pelos líderes tailandeses.
Jos Verstappen chegou mesmo a afirmar que Horner devia deixar a equipa quando o escândalo surgiu. Helmut Marko, apesar de não ter tecido comentários dirigidos ao britânico, deixou no ar que seguia a ideia do Verstappen-pai.
O próprio Max Verstappen tentou demonstrar alguma neutralidade no tema. Nunca se pronunciou a favor ou contra quem quer que fosse e desejou que o caso fosse resolvido o mais rapidamente possível. Pérez também pediu rapidez na apuração dos factos, considerando que não fazia sentido o ‘team principal’ deixar a equipa sem haver um veredito por parte dos investigadores.
Também a Ford, que fornecerá unidades motrizes à equipa a partir de 2026, também pediu rapidez e transparência em todo o processo. Semanas depois, a Ford exigiu explicações, uma vez que considerava que já havia passado tempo suficiente para tal.
As explicações surgiram dias depois desta exigência da Ford, a 28 de fevereiro, e o veredito dava conta de que Christian Horner fora absolvido pela investigação independente e que a funcionária seria suspensa pela empresa por alegadas falsas acusações.
Ou seja, história fechada e reina a paz na Red Bull?
Pois… não, propriamente.
A funcionária recorreu da decisão no imediato, levando à abertura de outra investigação independente, com uma equipa de investigadores completamente diferente. Jos Verstappen não demorou a declarar-se ao lado da funcionaria e Helmut Marko disse que poderia ser suspenso pela equipa, dadas as declarações que deu sobre o tema. E Max Verstappen disse que não poderia permanecer na equipa sem o austríaco.
Quem aproveitou estas declarações do piloto tricampeão foi nada mais, nada menos que Toto Wolff. Isso mesmo, o ‘team principal’ da Mercedes anunciou que estava de ‘braços abertos’ para receber Helmut Marko.
Reparem, tudo isto aconteceu no espaço de um mês.
Entretanto, com o início da temporada e os belos resultados iniciais da equipa, estes problemas passaram para segundo plano. No entanto, voltou a ser por pouco tempo. Os maus resultados de Pérez não tardaram a aparecer e Helmut Marko foi rápido a insurgir-se contra o piloto mexicano e a sugerir a sua troca o mais rapidamente possível.
Eis que mais uma bomba explodiu nas mãos de Horner. Adrian Newey, o genial engenheiro que está na equipa há 18 anos, comunicou a sua saída de forma inesperada, mantendo-se em funções até ao fim do ano. No entanto, o diretor técnico ficou de imediato afastado do desenvolvimento do RB20 e do monoposto de 2025. Por esta altura, a Red Bull começa a ter mais dificuldade em vencer e viu-se a ser ultrapassada pela McLaren e Mercedes. Apesar disso, Max Verstappen ainda conseguiu vencer algumas corridas, voltando a desviar o foco.
Então, quando menos se esperava, Pérez renova o seu contrato com a Red Bull até 2026 com mais uma de opção. O problema é que Christian Horner terá renovado com o piloto de 34 anos à revelia da restante equipa, dada a surpresa de toda a gente dentro da equipa que já dava como certa a sua saída. Porém, a sua renovação não foi suficiente para garantir a sua continuidade, uma vez que as péssimas prestações se mantiveram.
Mesmo depois do GP da Bélgica, quando era sabido que iria haver uma reunião na semana seguinte entre Pérez, Horner e Marko, o líder da equipa afirmou que ‘a equipa não podia continuar a andar com uma só perna’.
Todavia, pasmem-se, após essa tal reunião, Pérez foi confirmado como piloto da equipa até ao fim da temporada. Mas perguntam-se vocês o porquê desta continuidade, sendo que o próprio Horner admite que Pérez não está a ser uma ajuda.
Ora bem, a teoria mais aceite é de que Horner e Marko voltaram a desentender-se em relação ao piloto que substituiria o mexicano. O britânico defendia Ricciardo para esse lugar, o austríaco defendia Tsunoda. Visto que nem para o sucessor de Pérez se entendiam, decidiram que o melhor seria manter o mexicano ao lado de Max Verstappen.
Rumores apontam que o chefe da equipa austríaca irá apontar uma nova estrutura em setembro, após também perder o seu diretor desportivo, Jonathan Weathley, para a Audi, a partir de 2025.
O que é certo é que Horner perdeu o rumo da equipa e, dentro do núcleo duro, só lhe falta perder a líder de estratégias Hannah Schmitz. Pérez não tem condições para se manter na escuderia. Helmut Marko é o incendiário da equipa e a maior fonte de informação do ‘De Telegraaf’. Max Verstappen já estará a olhar com bons olhos para a Mercedes, estando só à espera que Toto Wolff apresente o cheque.
Ainda temos cerca de três meses e meio no ano e podemos esperar que existam muitos mais episódios para esta série dramática. Nós cá estaremos para os assistir.