A semana do basquete feminino no mundo

Lucas PachecoDezembro 27, 20257min0

A semana do basquete feminino no mundo

Lucas PachecoDezembro 27, 20257min0
Lucas Pacheco analisou mais dois jogos do mundo do basquete feminino com apontamentos interessantes que podes ler no Fair Play

Todo final de ano reserva momentos de paz e calmaria no basquete feminino mundial. Muitas ligas atravessam a inter-temporada (casos da WNBA e das competições no Brasil), enquanto outras fazem pausas, ainda que curtas, de recesso. Diante da placidez do cenário, conseguimos nos deter em partidas específicas, tal qual fizemos semana passada (O basquete feminino no Mundo: 3 jogos ao raio-X). Invertamos a ordem desta vez.

Euroliga: Valencia x Casademont Zaragoza

O principal torneio de clubes da Europa interrompeu o calendário no meio de dezembro, com retorno previsto para o meio de janeiro. Antes do mês de recesso, entretanto, a última rodada de 2025 desenrolou-se sem nenhuma surpresa; os favoritos venceram e somente um confronto direto aconteceu: Beretta Famila Schio derrotou o ZVVZ USK Praga, por 99 x 78. Como dito na última semana, a trajetória do atual campeão marca um capítulo a parte na atual temporada.

As tchecas do Praga passaram à segunda fase de grupos com uma campanha claudicante e desempenho oscilante. Após uma fase anterior sofrível, o time precisava reverter a situação imediatamente, sob risco de eliminação precoce; a vitória sobre o até então invicto Galatasaray na rodada anterior trouxera bons augúrios, logo desmentidos na rodada seguinte, com a derrota para as italianas de Schio. Além da derrota, a diferença pode pesar como critério desempate, pois ambas devem lutar pelas últimas vagas do grupo E, junto ao francês Tango Bourges (que possui vantagem no desempate sobre Praga).

Mas voltemos nosso olhar agora ao grupo F, onde reina um equilíbrio ainda maior. O Fenerbahçe segue invencível e virtual classificado ao Final Six; no outro oposto, o húngaro DVTK Miskolc está eliminado. Para as 3 vagas restantes, 4 pretendentes fortes e ávidos. Se a última rodada não testemunhou surpresa, na anterior a vitória do Zaragoza sobre o Valencia mexeu com a tabela.

O Valencia entrou na Euroliga dentro do trio de favoritos, em função da manutenção da espinhal dorsal do elenco e da comissão técnica. Junto aos turcos Mersin e Feberbahçe, completa os maiores investimentos do continente; a expectativa, porém, não condiz com a realidade. Na primeira fase de grupos, as duas derrotas esperadas nos confrontos diretos contra o Fenerbahçe deixaram o clube espanhol com pequena margem de manobra no grupo F. A tabela reservou um clássico nacional na abertura do grupo; o Zaragoza estreou no grupo F ainda mais ameaçado, devido aos tropeços na fase anterior.

O clássico ocorreu em Valencia, que dispensou Alina Iagupova e contratou Nia Coffey, com as mandantes dando as cartas no início da partida. Valencia comandou o placar, sem muita dificuldade, nos três primeiros quartos. No início do 4Q, o time vencia por 16 pontos de vantagem e controlava o Zaragoza na defesa. O ataque fluía a partir dos pick and rolls de Leticia Romero e dos arremessos certeiros de Lenie Fiebich e Elena Buenavida; apesar de acionar pouco as pivôs no poste baixo, parecia que a vitória estava garantida.

As valencianas acreditaram na vantagem e não perceberam o crescimento ofensivo de Zaragoza, possibilitado pelas mudanças das alas pelo técnico Carlos Morales: ele sacou as titulares Vorackova e Pueyo, exímias defensoras porém pouco agressivas no ataque, e inseriu a francesa Carla Leite. A ala trouxe um elemento novo, com o qual o Valencia não soube reagir; sua agressividade no jogo de bloqueio, atacando linhas de infiltração e chegando ao aro, mudou a dinâmica do time, menos dependente do ritmo imposto pela armadora Marionna Ortiz.

VÍDEO – CARLA LEITE

Leite atraiu defensoras do Valencia, que passaram a permitir arremessos de média e longa distância de Merritt Hempe. O 4Q avançava e a diferença foi caindo gradativamente; enquanto Zaragoza achara seu melhor basquete, o Valencia estagnou. Após anotar pontos no minuto inicial do período, voltou a pontuar somente no minuto final, quando já tomara a virada. Falta ao Valencia o elemento que Zaragoza usou para vencer: alguém que produz seu próprio arremesso a partir do drible.

Rubem Burgos, técnico valenciano, foi incapaz de corrigir o lapso mental e de concentração no último quarto (parcial de 7 x 30), sem êxito sequer em desenhar jogadas seguras para garantir pontos. Seu trabalho é consistente e resultou no domínio da liga espanhola, mas a cada nova rodada parece insuficiente para o próximo passo no continente. Com a derrota (63 x 70), o Valencia entrou no bolo da concorrência selvagem pela classificação, além de reabilitar seu rival espanhol – Zaragoza precisava de faíscas assim que o grupo F começasse e logrou uma estréia vital.

NCAA: Tennessee x Louisville

O duelo das tradicionais universidades envolveu duas equipes ranqueadas, na 16 e 17ª posições. O isolado jogo competitivo nesta época do ano ocorreu antes da disputa interna às conferências, ou seja, a partida serviu de prévia para as duras SEC (Tennessee) e ACC (Louisville).

Ambas iniciaram a temporada 2025-26 cumprindo com o esperado, sem nenhum grande resultado até aqui. Louisville não igualou classes anteriores no recrutamento e o time atual carece de pivôs dominantes e profundidade; Jeff Walz, porém, segue no comando, impondo sua defesa pressionada e um ataque cadenciado e bem estruturado. Tennessee embarca no segundo ano do basquete-experimento de Kim Caldwell; após uma boa temporada inaugural, o elenco sofreu bastante mudança, ganhando em profundidade (com calouras bem ranqueadas e promissoras), mas perdendo peças essenciais.

Na armação, por exemplo, Caldwell ainda não encontrou a reposição: nem a caloura Mia Pauldo nem a transferida Nya Robertson consolidaram a titularidade. O estilo da treinadora, a bem da verdade, é baseado em velocidade extrema e abuso da individualidade e chutes longos, aliado a defesa quadra toda e substituições em ritmo intenso. Talaysia Cooper segue com bons números e a fonte mais confiável de pontos; Janiah Barker enfim achou um esquema para decidir quando quiser e subiu suas estatísticas, gerando por outro lado turnovers em profusão e expondo todas as suas deficiências técnicas.

Tennessee baseia seu jogo no atleticismo exacerbado – em um elenco com tantas caras novas e calouras, ressente-se de mais estrutura tática e liderança em quadra. Contra Louisville, a equipe fez um jogo equilibrado até metade do 3Q; levando ao extrema a afirmação de que ‘basquete é um esporte de corridas’, Caldwell carece de ajustes e orientação fina. O jogo vinha competitivo, com diferença pequena, quando Walz adotou uma defesa zona que desnorteou Tennessee. Contra um elenco atlético e veloz, Louisville dobrou a aposta e contra-atacou explorando as falhas de cobertura da defesa de Tennessee.

Kim Caldwell simplesmente não encontrou alternativa. Nem corrigiu os posicionamentos de suas atletas, nem desenhou jogadas de segurança: sua atitude é substituir, a rodo, de cinco em cinco jogadoras. Contra uma equipe bem estruturada, que possui talentos individuais capazes de ferir o estilo arrojado (a ala-armadora reserva Imari Berry brilhou), é necessário mais que as individualidades.

Tal qual água em pedra dura, Louisville minou o estilo de jogo de Tennessee, refletindo no atropelo dos dez minutos finais. A vitória por 65 x 89 trouxe alívio para Louisville, carente por uma vitória maiúscula, contra uma universidade de renome. Há muito caminho pela frente, mas a universidade firma-se como uma das concorrentes ao título da ACC. Já Tennessee acumula a terceira derrota contra equipes ranqueadas e entra na feroz SEC sem nenhum resultado expressivo.


Entre na discussão


Quem somos

É com Fair Play que pretendemos trazer uma diversificada panóplia de assuntos e temas. A análise ao detalhe que definiu o jogo; a perspectiva histórica que faz sentido enquadrar; a equipa que tacticamente tem subjugado os seus concorrentes; a individualidade que teima em não deixar de brilhar – é tudo disso que é feito o Fair Play. Que o leitor poderá e deverá não só ler e acompanhar, mas dele participar, através do comentário, fomentando, assim, ainda mais o debate e a partilha.


CONTACTE-NOS