Basquete brasileiro masculino de volta às Olimpíadas

Lucas PachecoJulho 14, 20246min0

Basquete brasileiro masculino de volta às Olimpíadas

Lucas PachecoJulho 14, 20246min0
Lugar marcado para a equipa do Brasil de basquetebol masculino nas Olimpíadas 2024 e Lucas Pacheco conta-nos como foi viver o apuramento

Todos os ingredientes para o fracasso estavam presentes. Uma geração cujos principais expoentes sequer se consolidam na NBA, a troca de técnico às vésperas do qualificatório, uma confederação sem recurso e sem planejamento a médio prazo. Ainda assim, a seleção masculina de basquete do Brasil conseguiu a classificação para as Olimpíadas de Paris, a ser disputada em menos de 20 dias.

A mudança de técnico decretou o fim da era Gustavinho e o retorno ao comando do croata Aleksander Petrovic, predecessor a Gustavo. O comunicado oficial da dispensa seguiu o protocolo e não entrou em detalhes quanto às razões para o movimento, feito de última hora; falou-se da demissão, exigida pela CBB, de um assistente técnico, não aceita por Gustavinho. Cogitou-se um movimento de jogadores, insatisfeitos com o trabalho. Fato é que a troca aconteceu de forma intempestiva, no pior momento possível.

Mais que uma mudança de nomes, são dois estilos opostos de basquete. Voltaríamos a um ataque cadenciado, privilegiando movimentos completos, que gastassem a posse de bola, aliado a uma defesa pressionada. Para piorar as expectativas, nossos dois principais finalizadores enfrentavam problemas físicos (Yago retornou a tempo, longe das condições ideais; Raulzinho retornou de lesão e logo foi afastado novamente, devido a contratura muscular). Tinha tudo pra dar errado.

O Brasil foi agraciado com um sorteio bondoso; se não havia como escapar de confrontos difíceis, abriu-se o melhor cenário, com apenas uma equipe teoricamente superior, a anfitriã Letônia, algoz da seleção brasileira no Mundial do ano passado. O caminho à final parecia aberto e os prognósticos se confirmaram, não sem sustos.

Na estreia, uma vitória por virada, alcançada no último quarto da partida contra Montenegro. O placar de 81 x 72 mascara a dificuldade do duelo; um início periclitante colocou o Brasil atrás, obrigado a escalar uma montanha para virar. O pivô Caboclo, com seu atleticismo e talento, foi central, com 25 pontos e 9 rebotes; Petrovic demorou a encontrar o melhor quinteto, que contou com o experiente armadora Marcelinho Huertas. A defesa encaixou no segundo tempo e conquistamos uma suada vitória.

No segundo jogo, Camarões surpreendeu e atropelou no primeiro tempo. O resultado parcial no intervalo eliminava o Brasil da disputa; novamente foi preciso apertar a defesa e encontrar um quinteto capaz de pontuar. Lucas Dias ajudou e Leo Meindl começou a colocar suas digitais na seleção. Ao final, a derrota por 74 x 77 nos classificou para as semis em primeiro lugar do grupo, colocando-nos frente a frente com outra surpresa, as Filipinas responsáveis por eliminar a cotada Geórgia.

A sorte sinalizava de um lado e a seleção teimava em olhar para o lado oposto. Seguindo a dinâmica dos jogos anteriores, o Brasil foi ao intervalo perdendo, com uma atuação bem abaixo da crítica. Não fomos eliminados ali porque as Filipinas não pertencem ao rol das grandes seleções e não teve fôlego para manter a vantagem. Petrovic mudou, de novo, o time no intervalo e, com uma defesa muito mais ligada e atenta, viramos no terceiro quarto; seguramos o placar e vencemos por 71 x 60, graças à entrada de Georginho (+20 no plus minus) e ao arsenal completo de Leo Meindl.

Até que o destino colocou Brasil e Letônia na final do qualificatório, conforme todos os prognósticos. Jogaríamos na casa do adversário, embalado pela torcida e pelo retrospecto recente favorável. A Letônia surpreendera a todos no Mundial, praticando um basquete moderno e fluido, sem uma grande estrela, compensada pelo estilo coletivo e descentralizado. Contra um rival bem mais qualificado, não poderíamos nos dar ao luxo de um começo ruim e de encontrar a melhor formação durante o jogo; era necessário começar voando, impondo o ritmo.

E, no domingo último, a sorte sorriu para o Brasil. Huertas assumiu a armação como titular e imprimiu sua experiência, particularmente no excelente jogo de pick and roll com Caboclo; nas alas, dois jogadores altos, com envergadura e mobilidade. Leo Meindl e Georginho, alçado a titular após um torneio em que parecia relegado última opção do banco, acertaram a mão e, além de uma defesa incrível, foram desafogos ofensivos quando as primeiras opções travavam.

O Brasil não deu qualquer chance aos letões, abrindo 23 pontos de vantagem no primeiro quarto. Em se tratando de basquete brasileiro, a precaução nunca é demais, mas a seleção desempenhou como raras vezes vista nos últimos anos, ciente do necessário para sair vitorioso – e com a vaga olímpica. Na final, Petrovic encaixou o melhor quinteto logo de cara e o time respondeu com muita intensidade, trocas defensivas que impediram os arremessos livres da Letônia e muita agilidade e talento no ataque. Olimpíadas confirmadas.

Depois de ficar fora das Olimpíadas de Tóquio, a seleção masculina de basquete do Brasil venceu a final por tranquilos 94 x 69 e obteve a tão sonhada vaga olímpica. Fora do torneio feminino, eliminado nos dois naipes no 3×3, a seleção masculina garantiu a presença do basquete brasileiro em Paris.

Entraremos como azarões em um grupo com França (sede das Olimpíadas  e potência na modalidade, estreando Wembanyama), Alemanha (atual campeã mundial) e Japão. Como os dois melhores terceiros colocados dos três grupos avançam às quartas-de-final, uma mentalidade humilde e trabalhadora pode render bons resultados. O Brasil carece de uma estrela nível mundial e precisa compensar com trabalho coletivo, defesa forte e muita atitude, justamente os atributos que sobraram na final contra a Letônia.

Uma vitória boa contra o Japão, com derrotas justas para os favoritos do grupo, pode assegurar uma vaga no mata-mata, onde qualquer coisa pode acontecer. A bem da verdade, seria recomendável que o Brasil entrasse com esse approach em todas as partidas; recentemente, esse mesmo elenco venceu seleções muito mais encorpadas (como Grécia, Canadá), bem como tropeçou contra times fracos (Camarões, Colômbia).

Se nós brasileiros sorrimos hoje, é para comemorar a participação olímpica, a despeito do trabalho modorrento da confederação no último ciclo olímpico. Quando a bola subir em Paris (a fase de grupos do basquete nas Olimpíadas será disputada em Lille), no dia 27, contra a França, esqueceremos por 40 minutos todos os problemas estruturais do nosso basquete e torceremos como nunca. A segunda partida, contra os alemães, ocorre no dia 30 e no dia 02 de agosto, o duelo contra o Japão.

Quem acompanha basquete no Brasil, sabe a importância da classificação para obtenção de verbas para a modalidade. Que essa boa sorte do sorteio e do torneio classificatório reverberem para as Olimpíadas e os dirigentes vislumbrem o potencial do basquete no Brasil, desde que bem cuidado, com planejamento e investimento.

Vamos com tudo em busca de um lugar ao sol! Por que não sonhar com uma medalha? O primeiro passo foi dado.


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