A nova fase de grupos da Euroliga
A mudança no formato da Euroliga, deixando para trás um modelo consolidado porém um tanto quanto enfadonho, trouxe mais dinamismo à fase de grupos, anterior aos playoffs e confrontos diretos. Até a temporada passada, os grupos estendiam-se em demasia, diferente do formato adotado na temporada atual: com 6 jogos disputados por equipe, os lanternas de cada um dos quatro grupos (DVTK Miskolc, Olympiacos, Villeneuve D’Ascq e Uni Gyor) foram eliminados e “rebaixados” para a Eurocopa, segundo torneio continental.
Assim, já na sexta rodada tivemos partidas eliminatórias, com um dinamismo não visto com o formato anterior. Finda a primeira fase de grupos, os quatro ajuntamentos agora formarão apenas dois, compostos por seis equipes em cada. Os grupos A e B juntaram-se no novo grupo E; C e D, por sua vez, comporão o novo grupo F. Carregando toda a campanha da fase anterior, cada equipe enfrentará as equipes do outro grupo – ou seja, a fase terá a mesma duração da anterior, com 6 jogos restantes.
Antes de descrever os novos grupos, convem relatar as últimas rodadas da fase anterior. Como vínhamos anunciando, os grupos B e D foram decididos com rodada de antecedência, vez que ambos possuíam claro desequilíbrio. Olympiacos e Uni Gyor rumam para a Eurocopa sem conquistar nenhum triunfo na Euroliga (0v, 6d).
No grupo C, o equilíbrio prevaleceu e frustrou muitos prognósticos. As atuais vice-campeãs européias do francês Villeneuve passaram por uma reformulação profunda no elenco; embora não fossem as únicas nessa situação, o encaixe demorou mais que o esperado e a vitória solitária veio apenas na penúltima rodada, mantendo as chances de classificação vivas. Ao vencer o polonês Polkowice em um jogo em que os ataques dominaram (100 x 83), o Villeneuve igualou-se em campanha mas se manteve atrás no critério direto de desempate; com isso, na última rodada, a equipe precisaria vencer o Zaragoza (fora de casa) e torcer por derrota do Polkowice contra o Fenerbahçe. Se este resultado trazia ótimas probabilidades, a vitória na Espanha exigiria um desempenho superior ao apresentado até ali.
Não aconteceu: o volume ofensivo da rodada anterior voltou a minguar e, ao se deparar contra uma defesa bem postada e fechada, como a do Zaragoza, a derrota – e a consequente eliminação – veio, por 68 x 59. A maior surpresa da primeira fase de grupos restou na eliminação do time vice-campeão. A estreia da jovem armadora Carla Leite na Euroliga chegou ao fim, com muita oscilação (normal para a estreia) e flashes de um talento capaz de dominar o continente por muitos anos.
Se esperávamos equilíbrio no grupo C, tínhamos certeza que o encontraríamos no grupo A, composto por quatro times acostumados à competição e calejados por boas campanhas recentes e boa dose de tradição. Na última rodada, um confronto direto pela vaga derradeira: Avenida e DVTK precisavam vencer para avançar, com o adendo da necessidade de uma possível vitória húngara exigir a diferença de 5 pontos.
As espanholas utilizaram o fator casa; a tradição do ginásio de Salamanca, aliado à fanática torcida, adicionaram camadas à vitória do Avenida, pelo placar de 67 x 55. A eliminação precoce do DVTK Miskolc não surpreende pelo resultado em si – normal em um grupo tão equilibrado -, sim pelo decepcionante desempenho apresentado. Com praticamente o mesmo elenco, o técnico Peter Volgyi não repetiu a excelente campanha da temporada passada, quando atingiu as quartas-de-final e quedaram a uma partida do Final Four. Mais previsível, o time ressentiu-se da ausência de uma playmaking capaz de bater defesas postadas (Reka Lelik caiu progressivamente conforme os jogos caminhavam, Kaila Charles seguiu com volume e pouca eficiência); com menos arremesso externo, faltou o principal desafogo ofensivo de anos anteriores. Mesmo com instabilidade e oscilação absurdas, o reformulado Avenida evitou a queda e avançou à próxima fase de grupos.
Com esses resultados, chegamos aos grupos E e F. O grande favorito do grupo E é o turco Mersin Çukurova; o riquíssimo plantel salta na frente, com campanha invicta de 6 vitórias. Por certo, enfrentará maior competitividade a partir de agora, já que cruzará contra as três boas equipes oriundas do finado grupo A; no caminho, devem surgir tropeços, nada porém que afete o favoritismo e as altas chances de liderar o grupo. O elenco formado pela nata do basquete europeu entrosa-se mais e não deve encontrar dificuldade para atingir o Final Six. No outro extremo, o tcheco Zabiny Brno possui poucas chances de avançar e deve comemorar o feito de chegar até esta fase.
Restariam, assim, três vagas na Euroliga, em disputa por quatro equipes. Nesse bolo, esperemos muito equilíbrio e excelentes duelos; apenas uma vitória separa o segundo do quinto colocado – o dinamismo esperado pela mudança de formato vigora com toda força neste grupo E.
Landes, Schio e Bourges carregam 4v e 2d, com o Avenida logo atrás (3v, 3d). O francês Bourges faz um torneio correto e colocará à mostra sua real capacidade técnica, tática e física. Sua jovem armadora Pauline Astier surpreendeu com sua visão de jogo e capacidade de gerar arremessos (6,7 assistências por jogo). Os demais passaram por verdadeiro teste de fogo na fase anterior e precisarão evoluir (todas as três) caso almejem a classificação. Cada equipe apresentou fortalezas e buracos bem nítidos. O francês Landes equilibra qualquer jogo, mas carece de mais definição ofensiva; sua principal jogadora, a armadora Leila Lacan (outra estreante na Euroliga) oscilou bastante e chegou a perder a titularidade, mas segue como a principal esperança para desencantar o ataque.
O italiano Schio, pelo contrário, aposta suas fichas em um basquete moderno e fluido, centrado nos arremessos das alas Kitija Laksa e Janele Salaun, produzidos a partir de intensa movimentação sem a bola. As grandes não possuem jogo de poste baixo, mas compensam com muita movimentação e afinado jogo de pick-and-roll com a armadora Constanza Verona. As adições mais recentes (Dorka Juhasz e Ivana Dojkic) não mudam o patamar da equipe, mas acrescentam profundidade que faltou nas derrotas da fase anterior. O espanhol Avenida precisa demonstrar evolução gradativa e interromper a montanha russa; facilitará se fixar padrões de rotação para seu profundo e coeso elenco.
No grupo F, o favoritismo recai no time a ser batido, a potência turca Fenerbahçe. Emma Meesseman segue dominando e melhorando todas à sua volta. Com exceção das turcas, o grupo promete equilíbrio e qualquer resultado pode acontecer. Mesmo a lanterna atual (Polkowice, 1v e 5d) tem condições de competir, embora a classificação pareça distante para um elenco menos estrelado.
Espera-se que Valencia, USK Praga, Zaragoza e Venezia protagonizem bons duelos diretos, com dificuldade adicional ao Zaragoza (vindo de grupo mais fácil, não terá partida tranquila nesta fase). Enquanto o Valencia supera sua concorrência em profundidade e estrelas, as demais possuem bons esquemas táticos (a maestria da técnica Natalia Hejkova de Praga em manejar sua poderosa espinhal dorsal) e peças que podem surpreender (Helena Pueyo em Zaragoza, Matilde Villa e Awak Kuier em Veneza). O grupo tem tudo para produzir jogos de primeiro nível.
Importante ressaltar que a Euroliga possui a tradição de muitas mudanças nos elencos durante a temporada; raras as edições recentes em que grandes nomes não chegaram em fases avançadas da competição. O mercado chinês e a liga de basquete 3×3 Unrivaled inflacionaram o mercado e dificultam movimentações desse porte neste ano, mas não surpreenderá se alguma equipe mexer drasticamente em seu elenco.
A mudança no formato da Euroliga repercute nos grupos E e F: ao final da fase, mais 4 eliminações (2 de cada grupo), com as demais na busca do Final Six (não mais o tradicional Final Four). Primeiros e segundos colocados nos grupos E e F cruzam (1º do E x 2 do F, 1º do F x 2º do E) – os dois vencedores vão direto para a semifinal, enquanto os perdedores juntam-se aos vencedores dos duelos entre terceiros e quartos (3º do E x 4º F, 3º F x 4º E) para compor o Final Six.
Antes, porém, tem muita água para passar por baixo dessa ponte.