Chegada e evolução do futebol em terras brasileiras

Thiago MacielAbril 16, 20228min0

Chegada e evolução do futebol em terras brasileiras

Thiago MacielAbril 16, 20228min0
Existem vários registros da chegada do futebol no Brasil. E neste artigo te mostro como ele se transformou numa paixão nacional.

Charles Miller

A rua Monsenhor Andrade, em São Paulo, é hoje uma rua de práticas comerciais e bastante desconhecida para muitos. Mas não deveria ser assim: afinal, uma de suas construções abrigou os primeiros anos de vida do homem que trouxe o futebol para o Brasil.

Filho de um engenheiro escocês e de uma brasileira de descendência inglesa, Charles Miller nasceu no bairro do Brás em 1874. Foi para a Inglaterra estudar aos nove anos e só voltou para o Brasil em 1894, trazendo consigo, além da bagagem intelectual, algumas camisas e uma bola. Ao voltar de Londres, tratou de difundir o futebol entre os ingleses que residiam em São Paulo, já que o esporte praticado por eles era o críquete. Porém, muito mais importante que isso, ele trazia o sonho de tornar o futebol uma paixão nacional.

Graças a seu empenho junto aos clubes, a primeira partida em solo nacional foi disputada. O encontro entre Gas Company of São Paulo x São Paulo Railway Company, com o final de 4 x 2 para o São Paulo Railway. Miller jogou pela equipe vencedora e marcou dois gols.

Seis anos mais tarde, ele criou a Liga Paulista de Futebol, embrião da FPF (federação paulista de futebol), e em 1902 tivemos o primeiro campeonato oficial no Brasil: o Campeonato Paulista.

Aos 36 anos, Miller encerrou sua carreira de atleta e se tornou árbitro. Se o futebol brasileiro tem um pai, este foi Charles Miller.

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O Preconceito contra negros e pobres

O futebol e as primeiras ligas foram criados para atender as elites sociais, formadas por cidadãos de origem branca, ficando para as classes economicamente menos privilegiadas, em sua maioria composta por cidadãos de origem negra, o direito de jogar em ligas clandestinas. Os fatos de segregação se perpetuam ao longo dos anos, por motivos sociais, biológicos, culturais, produzidos pelas elites para continuar no poder e afirmar a superioridade racial.

Assim que começou a ser disputado por aqui, o futebol vetou velada e até mesmo explicitamente a participação de negros e pobres em suas equipes. Os clubes que não impediam a associação deles, mas em seus estatutos cobravam valores impensáveis a essas classes, o que acabava por impedir a indesejada presença em seus quadros sociais.

Havia quem não concordasse com essa pratica. A Ponte Preta, de Campinas/SP, segundo clube de futebol mais antigo do Brasil, foi a primeira a ter negros e pobres em seu elenco. Isso desde a formação do seu primeiro time em 1900.

No Rio de Janeiro, o Bangu (formado em sua maioria por trabalhadores negros das fábricas do bairro) escalou Francisco Carregal em 1905 e quebrou a nociva regra. Porém, a presença de negros entre os jogadores de futebol, assim como a de pobres, incomodava a elite branca. Com isso, em dezembro de 1917, o Diário Oficial Carioca divulgou a Lei do Amadorismo, que afirmava:

“Não poderão ser registrados como atletas os que tirem os meios de subsistência de profissão braçal, aqueles que exerçam profissão humilhante (que lhes permite recebimento de gorjeta), os analfabetos e os que, mesmo que não se enquadrem nas condições citadas, estejam abaixo do nível moral exigido pelo Conselho Superior de Esportes”.

 

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Lei do Amadorismo segregava brancos e negros

Ou seja, pretos e pobres, fora!

A pressão era tão grande, que nem mesmo com o passar do tempo e o surgimento de craques negros, como Friedenreich, amenizavam o problema. Em 1921, o ápice desse racismo aconteceu quando o então presidente da República, Epitácio Pessoa, se reuniu com diretores da CBD – Confederação Brasileira de Desportos – e pediu, explicitamente, para que apenas jogadores brancos e de cabelo liso fossem convocados para a Seleção Brasileira.

Arthur Friedenreich, o primeiro grande ídolo negro do futebol brasileiro

Por isso, muitos jogadores negros começaram a organizar ligas próprias. Assim, surgiram entidades como a Liga Suburbana de Futebol no Rio de Janeiro, a Liga Nacional de Football – pejorativamente chamada de ‘’Liga da Canela Preta’’- em Porto Alegre, e a Liga Brasileira de Desportos Terrestres – maldosamente apelidada de “Liga dos pretinhos” – em Salvador.

Em São Paulo, 12 equipes foram formadas apenas por pobres, pardos e negros, e uma delas tinha o nome de Black Team. Entre 1927 e 1939, chegou a acontecer anualmente na capital paulista o clássico “Preto x Branco”, em que jogadores das duas cores formavam equipes e disputavam a Taça Princesa Isabel. O jogo ocorria sempre no dia 13 de maio.

O aparecimento de Pelé, após a Copa do Mundo de 1958, também contribuiu para uma amenização nos problemas em relação ao racismo. O destaque desse jogador produziu, no país, o sentido de que os jogadores de futebol deveriam vir da camada pobre da sociedade e alcançar o ápice da carreira, após muito sofrimento e batalhas.

Pelé, em ação na Copa do Mundo de 1958

Com o passar dos anos, outros grandes nomes surgiram no cenário nacional do futebol, trazendo as características que eram semelhantes às do “Rei do Futebol” — caso dos jogadores Romário; Ronaldo Luís Nazário de Lima, chamado popularmente de Fenômeno; e também de Ronaldo Assis Moreira, conhecido como Ronaldinho Gaúcho.

Entre tantos outros, eles puderam, por intermédio do futebol, sair de uma classe social baixa para alcançar um alto nível de consagração, representando grandes equipes nacionais e internacionais, além da Seleção Brasileira, e alcançando os principais prêmios do futebol.

Futebol Feminino

Mesmo sem a organização de campeonatos nacionais e com a falta de valorização da categoria, pode-se dizer que, atualmente, o futebol feminino é um esporte popular no Brasil. O fato de a brasileira Marta ter sido eleita seis vezes a melhor jogadora do mundo, além das boas participações da seleção feminina em competições, contribuiu para que o esporte feminino atraísse mais espectadores. Porém, poucos conhecem a história de como as mulheres começaram no futebol.

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Marta foi eleita seis vezes a melhor jogadora do mundo

O ano de 1989 é datado para a primeira partida de futebol feminino, que ocorreu entre Inglaterra e Escócia, em Londres. No Brasil, não se sabe ao certo como o futebol começou a ser praticado por mulheres, mas, inicialmente, as partidas eram mistas, ou seja, homens e mulheres jogavam juntos.

A prática do futebol feminino sempre teve muitas dificuldades no Brasil, mais ainda que a masculina. Em 1921, foi realizada a primeira partida de futebol feminino, em São Paulo, onde se enfrentaram os times das senhoritas dos bairros Tremembé e Cantareira, na Zona Norte de São Paulo. A partida chamou a atenção do público presente, pois o futebol era considerado um esporte bruto e impróprio para ser praticado por mulheres.

Os primeiros times nacionais femininos começaram a surgir a partir da década de 30, mas, de forma tímida. Em 1964, com a Ditadura Militar, o Conselho Nacional de Desportos (CND) proibiu a prática do futebol feminino no país, o que freou o desenvolvimento do esporte entre as mulheres.

A proibição permaneceu por 15 anos, até que fosse revogada, em 1979. Após a revogação, começaram a ser criadas ligas e equipes nacionais. A primeira foi a equipe carioca do Esporte Clube Radar, que começou a praticar o esporte nas areias da Praia de Copacabana. Depois, outros clubes começaram a ser formados e alavancaram o futebol feminino. Isso fez com que o esporte ganhasse mais destaque. Em 1986, a primeira seleção de futebol feminino foi convocada pela CBF e, em 1996, o futebol feminino foi incluído como modalidade das Olimpíadas.

O crescimento do futebol no Brasil acabou fazendo com que o esporte mais praticado na época, o remo, viesse a ficar em segundo plano, chegando a ser quase esquecido pelos brasileiros posteriormente. Com isso, algumas equipes de remo tornaram-se clubes de futebol, como o Flamengo, Vasco da Gama e Botafogo, no Rio de Janeiro.


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