A mudança tática de Rui Borges e os seus efeitos no Sporting

Ricardo LopesJaneiro 12, 20256min0

A mudança tática de Rui Borges e os seus efeitos no Sporting

Ricardo LopesJaneiro 12, 20256min0
Apesar da derrota na Taça da Liga, há mudanças positivas no Sporting CP e Ricardo Lopes explica o impacto inicial de Ricardo Borges

Rui Borges assumiu no final de dezembro o comando técnico do Sporting, que percebeu que João Pereira tinha sido um ‘erro de casting’ e que não conseguiria levar os leões ao sucesso durante a temporada 2024/25, com a equipa a apresentar-se num declínio de resultados brutal. O antigo treinador do Vitória SC começou a sua nova aventura com o pé direito, conquistando os adeptos com o seu discurso simples, mas com atitude.

Já era de prever que o sistema tático do Sporting iria mudar. Ruben Amorim moldou um projeto num 3x4x3, que poderia sofrer algumas variações ao longo dos 90 minutos, mas em que a base nunca mexeu. João Pereira seguiu os passos do seu antecessor (veremos como fará no seu regresso à equipa B), embora com certas nuances distintas, que não pareceram encaixar bem com o plantel existente.

Rui Borges tem um estilo distinto, com personalidade, e que ao nível tático está muito distante do de Ruben Amorim. O ex-médio nunca utilizou o sistema de três centrais durante a sua carreira e uma mudança radical era esperada. A partir de agora, o 4x4x2 e o 4x3x3 serão a nova moda por Alvalade, e alguns jogadores até podem beneficiar com isso, mas outros sairão seguramente prejudicados.

Possivelmente os atletas que podem sorrir com estas alterações serão Geny Catamo e Geovany Quenda. Habituados a serem alas, encarregues com certas tarefas defensivas, os dois voltarão ao seu posto original: extremo. Assim sendo, poderão centrar-se naquilo em que são melhores, as suas versões atacantes, conscientes de que contam com um lateral por detrás para os apoiar tanto no momento ofensivo como no momento defensivo. Matheus Reis é outro beneficiário. Um defesa esquerdo que para Ruben Amorim contava mais como central poderá regressar à sua posição de origem, não contando com tantas obrigações ofensivas. Se tudo correr, será um indiscutível, quando estiver em condições físicas. O mesmo discurso poderia ser aplicado a Iván Fresneda, lateral direito que nunca se destacou pelas suas caraterísticas ofensivas e que seria uma ótima opção para o posto, já que falamos de um jogador promissor. Porém, a direção optou por vender o espanhol ao Como, correndo o risco de fazer uma carreira de elevada qualidade na Serie A.

Os mais prejudicados no meio de tanta mexida são os centrais: Eduardo Quaresma, Ousmane Diomande, Jeremiah St. Juste, Gonçalo Inácio e Zeno Debast. Nenhum destes nomes é conhecido pela capacidade de atuar num sistema de dois centrais. Provavelmente Diomande e St. Juste serão os que trazem mais segurança nessa situação. Zeno Debast e Gonçalo Inácio têm falhas claras, sendo ótimos na capacidade de construção de jogo (não é descabida a utilização do internacional português no meio campo, se necessário). Eduardo Quaresma verá os seus defeitos mais expostos do que nunca. Não nos podemos esquecer que estamos a falar de um pacote com demasiadas peças (e caras), quando apenas dois nomes podem ir a jogo. Não seria de descartar a venda de um jogador desta posição no mercado de janeiro. Além disto, apenas Gonçalo Inácio é esquerdino, já que retiramos da equação Matheus Reis, regressado à posição de lateral.

Um dos grandes desafios de Rui Borges, se mantiver o 4x4x2, será a colocação de Pedro Gonçalves no terreno de jogo. Como o irá fazer? A dupla do meio campo, no caso de estarem todos a 100%, deverá variar pouco, com Morten Hjulamnd e Hidemasa Morita com uma certa vantagem perante os outros. Já na frente de ataque, Francisco Trincão é claramente o nome ideal para fazer companhia a Viktor Gyokeres. Sobra o posto de médio esquerdo, vaga que tem sido de Geovany Quenda. Mas será que o ex-Famalicão conseguirá produzir tanto num posto mais próximo da linha? Com Amorim tratava-se de um avançado interior, mais presente por dentro do que por fora. Com Rui Borges esse movimento fará sentido caso exista um lateral ofensivo, como poderá ser Maxi Araújo, que não tem tido um começo fácil por Lisboa.

Quando Pedro Gonçalves receber luz verde do departamento médio, Rui Borges poderia apostar num 4x3x3, com o jogador a fazer companhia a Morten Hujlmand e a Hidemasa Morita, mas numa posição um pouco mais avançada (perto de transformar a tática num 4x2x3x1). Geny Catamo e Francisco Trincão poderiam ser os extremos da tática, mas perderíamos provavelmente a melhor versão do antigo atleta do Barcelona.

Parece-me certo que quando a direção escolheu Rui Borges não pensou no modelo tático. Esse não foi um dos pontos analisados com vigor. O Sporting procurava voltar às vitórias e ‘sem querer’ começou um novo projeto. O 3x4x3 foi deposto e deixou de estar na moda pelo Campo Grande, numa fase em que várias equipas da Primeira Liga estavam a seguir o exemplo de Ruben Amorim. Frederico Varandas decerto saberá que um sistema tático não é tudo e que um treinador é muito mais do que isto, é também um estratega, um gestor de recursos humanos, até mesmo um psicólogo em certas ocasiões.

É 100% certo que nem todos os jogadores se vão adaptar ao 4x4x2 e alguns atletas vão ter expostas as suas debilidades, algo que até conseguimos ver nos primeiros encontros da era Rui Borges. Iván Fresneda, que já foi elogiado neste texto, provou estar ‘verde’, Eduardo Quaresma a lateral improvisado não pode ser uma solução definitiva. Maxi Araújo aparenta estar mais perdido em campo do que nunca, especialmente quando tem que defender (algo que já acontecia com Ruben Amorim).

Veremos qual a atitude do Sporting no mercado de transferências, com um plantel que poderá sofrer algumas alterações pontuais, numa fase em que é impossível a existência de uma renovação. Teremos que nos habituar a este novo leão com uma linha de quatro, quando os adeptos foram encantados pela antiga equipa técnica nos últimos anos com o sistema de três centrais. Afinal, a vida é feita de mudanças, a maioria mais radical que esta). Uma situação para acompanhar.


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