José Peseiro na boca do Leão
Peseiro será sempre lembrado no Sporting Clube de Portugal pelo quase sucesso que redundou depois em fracasso num curto espaço de dias em 2005. Na altura viu esfumar-se a glória de um titulo nacional e um titulo europeu que acabaria por lhe ditar o destino logo no inicio da época seguinte. A desconfiança de ser incapaz de ganhar acabou por impor a sua lei nos primeiros desaires da época que se seguiu.
É essa desconfiança que inevitavelmente ganhou forma após a derrota de Braga, anulando rapidamente a surpresa pela forma como vinha conseguindo juntar as peças de um Sporting estilhaçado. Mesmo que o futebol jogado não fosse propriamente sedutor, Peseiro parecia ter conseguido montar uma equipa eficaz. Mas era consabido que o beneficio de algum estado de graça se extinguiria no primeiro desaire. Foi isso que inevitavelmente aconteceu.
Assim foi em Braga. Mais importante que a qualidade do jogo jogado, onde as estatísticas confirmam a igualdade no desempenho das equipas, acabou por ser o resultado a premiar a eficácia dos da casa a ser determinante nas análises que se fizeram ao jogo. Como sempre quem perde sai por baixo e quem ganha recolhe os louros.
Fosse agora ou depois, o problema da desconfiança levantar-se-ia na mesma como um denso e escuro nevoeiro sobre Peseiro ao primeiro mau resultado. No caso em apreço, de pouco parece valer agora invocar o historial recente entre ambas as equipas, ignorando que as dificuldades sentidas ante os arsenalistas não são novas e remontam a períodos de maior fulgor e estabilidade do que os vividos desde o dealbar da época em curso.
Contudo, nem o Sporting CP seria o principal favorito ao titulo mesmo que tivesse saído vencedor, nem o Braga passou a ser mais candidato do que era antes do jogo começar. Por razões diversas, mas óbvias, cada um deles permanece na luta, conservando o seu estatuto de outsider face aos favoritos FC Porto e SL Benfica. No caso particular do Sporting, o passar do tempo, se com ele regressarem os resultados, este resultado será lembrado como um percalço, mas nunca como o fim as aspirações para o campeonato.
Quando se soube que José Peseiro ia regressar ao Sporting o próprio se encarregou de afirmar o quanto era diferente do que havia chegado há 14 anos:
“Chego com a mesma motivação e responsabilidade de ser treinador de um enorme clube, mas agora com mais experiência“.
Será agora essa qualidade que terá de convocar para lidar pessoalmente com o actual momento, bem como perante o grupo de trabalho que lidera. Se normalmente um jogo em casa é de vitória obrigatória, o resultado da passada jornada “obriga” ainda mais a vencer o próximo com o Marítimo. Saber lidar com a pressão e retirá-la do seio do plantel durante a semana que antecede o jogo é a primeira tarefa.
Mas não poderá ficar por aí. Apesar dos bons resultados conseguidos até Braga, não passaram despercebidas as dificuldades que o Sporting enfrentava na organização do seu processo ofensivo.
À primeira vista tal pode soar de forma contraditória à impressão de técnico de perfil ofensivo, mas descuidado a defender, que deixou na sua passagem. Talvez não seja tanto assim, se se atender que a organização do ataque funciona para uma equipa como o telhado e os acabamentos numa edificação nova: são os últimos a finalizar e sobretudo os segundos quanto mais elaborados mais difíceis são de alcançar.
Recuando a 2005, apenas à sexta jornada o Sporting estabilizou o seu jogo. Após um inicio prometedor na primeira jornada, o Sporting baquearia consecutivamente e de forma comprometedora para o resto do campeonato entre empates e derrotas que só seriam interrompidos num jogo com o Estoril (1-4). Mais à frente alternaria uma pesada derrota fora com o FC Porto (3-0) e uma exibição de gala com o Boavista (6-1).
Não sabemos se Peseiro conseguirá impor o futebol que então o caracterizou e que, apesar da ausência de títulos no final, representa do melhor que o Sporting apresentou no século em que estamos.
Tivesse o Sporting conseguido estar mais vezes nas decisões da Liga nacional e da Liga Europa como então, seria muito provável que houvesse disso registo na sua sala de troféus. Ficou bem patente que é preciso tempo e sobretudo um plano emocional colectivo bem mais estável do que aquele que o Sporting iniciou a época. De todos, Peseiro tem apenas a culpa pela coragem – ou loucura? – de não virar as costas a um desafio que tinha e continua a ter demasiados ingredientes errados para acabar bem.
Apesar dos equívocos evidentes no seu jogo do Sporting, não é difícil de perceber que há matéria humana para melhorar. Gudelj fez apenas o seu segundo jogo e pode beneficiar de uma visão mais ousada e menos conservadora que o atar à ilharga de Batagglia.
Bruno Fernandes não pode ser um controlador aéreo, antes sim um agulheiro que traça o destino da bola de pé para pé.
Raphinha não pode ser apenas aquilo que as suas iniciativas individuais dão, é preciso que a equipa esteja mais próxima dele.
Todos os sectores aliás precisam de comunicar melhor e para isso é preciso maior proximidade para que exista mais dinâmica e daí melhor fluência e segurança na posse da bola. Sem isso a equipa continuará a viver de fogachos individuais e daquilo que as falhas do adversário permitirem.