Conseguir a dobradinha, mas com a pulga atrás da orelha
O Sporting venceu a Primeira Liga e a Taça de Portugal, fazendo da temporada 2024/25 uma época para jamais se esquecer, especialmente para os adeptos mais novos, que se habituaram a ver FC Porto e Benfica a dominarem o futebol português. O Marquês de Pombal encheu pelo segundo ano consecutivo e o Jamor pintou-se de verde e branco após o apito final de Luís Godinho, com os aficionados a entrarem em êxtase. O projeto liderado por Frederico Varandas está a correr na perfeição, no que aos resultados desportivos diz respeito, conseguindo atingir a metas propostas no curto e no longo prazo.
Contudo, nem todos os adeptos/comentadores/analistas estão rendidos a esta versão vencedora do Sporting, que está um patamar acima dos demais. Os leões passaram por várias fases ao longo da época. Com Ruben Amorim, foram 11 vitórias em 11 jogos para o campeonato. Parecia que a Primeira Liga ia ter pouco interesse, mas o treinador decidiu rumar ao Manchester United e houve um pequeno terramoto em Alvalade. João Pereira, numa aposta na continuidade, foi o nome eleito, mas os resultados ficaram aquém do esperado e o antigo lateral direito acabou demitido. No natal, Rui Borges assumiu as rédeas da equipa e foi o técnico que ficou mais tempo no posto em 2024/25.
O antigo treinador do Vitória SC conseguiu colocar o Sporting na rota das decisões, mesmo com uma equipa que contava com várias baixas (muitas delas determinantes), estando impossibilitado de contar com o onze de gala na maioria dos jogos. Ainda assim, o plantel do Sporting continuava a ser superior ao da maioria dos adversários. A grande crítica que foi/está a ser feita a Rui Borges está relacionada com a qualidade do futebol praticado. Inicialmente, abdicou do 3x4x3 e não se deu bem, voltando à tática para a qual o plantel estava desenhado para se obter resultados.
O Sporting não entusiasmou na maioria dos jogos. Quando começava a ganhar, as linhas recuavam e o adversário tinha margem para crescer em jogo e essa atitude custou pontos à formação do Campo Grande (veja-se o caso da partida frente ao AVS SAD). Rui Borges foi criticado todas as semanas, mesmo quando a sua própria equipa ganhava. Sejamos honestos, Rui Borges não é Ruben Amorim e não são parecidos em grande parte dos aspetos. A sua grande virtude foi ter voltado a conseguir unir um grupo que parecia estar desfeito desde a saída do antigo médio para o Old Trafford. Esta foi a chave para o Sporting ser campeão e Frederico Varandas sabe perfeitamente disso. Um treinador hoje em dia não tem apenas que ditar a tática, mas sim liderar um conjunto de homens, que contam com feitios e egos diferentes, mas que fazem todos parte do mesmo grupo de trabalho.
No entanto, parte da justificação dos títulos de Sporting deve-se aos rivais, especialmente ao Benfica (o FC Porto nunca pareceu entrar nas contas, mesmo conquistando a Supertaça de Portugal). A equipa da Luz tinha um elenco com mais opções, um orçamento superior e apenas trocou de técnico uma vez, mas falhou nos momentos cruciais. Contra o Arouca, se vencesse a partida teria o título na mão, mas permitiu à formação de Vasco Seabra empatar o jogo perto do apito final. Na penúltima jornada, estava obrigado a vencer o Sporting para poder sonhar com a conquista do título, mas não passou do empate, apesar de ter dominado a partida. Já na final da Taça de Portugal, permitiu aos leões darem a volta ao marcador, tentando fazer esquecer esta derrota com um lance envolvendo Matheus Reis e Andrea Belotti (o brasileiro deveria ter sido expulso e corre o sério risco de ser suspenso por várias partidas), que não pode justificar tudo.
O Benfica poderia acabar a época com um triplete, mas por falta de sorte e incapacidade de ‘matar os encontros’, o rival da Segunda Circular acabou por levantar duas taças, deixando o rival numa crise pouco vista em anos anteriores, com Rui Costa a poder sair do clube nas eleições de outubro de 2025.
O Sporting venceu, mas nunca conseguiu conquistar a crítica, que sabe perfeitamente que a instabilidade dos demais foi fundamental para a resolução de 2024/25. É natural que os leões sejam encarados como os favoritos a todos os troféus a nível interno na próxima temporada, mesmo com a saída de Vitor Gyokeres. No entanto, esta tal confiança pode perder-se nas primeiras semanas, no caso de maus resultados. Rui Borges terá uma pré-temporada para decidir o que quer fazer: continuar a sua adaptação ao 3x4x3 ou impor a sua ideia, com mais tempo para ser trabalhada. Por Alvalade há a noção que a competência vai aumentar. O Benfica quer melhorar o seu onze inicial e montar uma equipa de luxo, eventualmente com alguns regressos. Já o FC Porto começará a época com Martín Anselmi no comando e deverá contar com alguns nomes novos (Gabri Veiga está praticamente fechado).
Rui Borges conseguiu ser engraçado e cair em estado de graça, mas pode perder o seu estatuto logo no começo da temporada. Neste momento é um herói para os adeptos, mas rapidamente pode virar um vilão, tal como aconteceu no Vitória SC. O técnico mais famoso de Mirandela tem tudo na sua mão, mas rapidamente pode ver o jogo virar contra si. É tempo dos sportinguistas celebrarem, mas é conveniente ter um olho no que por aí vem.