Frederico Varandas como nunca se viu: claro, conciso e direto
Frederico Varandas foi o convidado especial do programa Trio d’Ataque que celebra em outubro de 2024, o seu vigésimo aniversário. O presidente do Sporting concedeu uma entrevista ao jornalista Hugo Gilberto, onde abordou vários temas. Não há muito por onde criticar, já que o dirigente realizou possivelmente a sua melhor entrevista desde que ocupa o cardo de líder do emblema de Alvalade, apresentando um discurso lucido, com poucas contradições (talvez o tema da banca e os 100 milhões de euros perdoados tenham ficado aquém na sua explicação, mas Francisco Salgado Zenha é o verdadeiro especialista), e poucos floreados. Frederico Varandas optou por ser curto e direto, um estilo que lhe assenta muito melhor.
Há alguns pontos que vale a pena debruçarmo-nos. O primeiro, a relação com Rúben Amorim e Hugo Viana. O dirigente verá Hugo Viana partir para o Manchester City em junho de 2025, finalizando o seu trabalho no José de Alvalade. Frederico Varandas recordou que o antigo médio foi uma aposta pessoal, recordando que o antigo médio tinha muito pouca experiência no cargo. No entanto, não se demonstrou pouco preocupado com o final da parceria. Afinal, o médico sabe que perdeu o ‘elo mais fraco’ da Santíssima Trindade do Sporting, ou pelo menos o mais fácil de substituir. O presidente terá que reconstruir uma parcela da estrutura do clube, mas tem em Bernardo Palmeiro e em Flávio Costa duas pessoas nas quais pode confiar e que até podem ser vistas como um upgrade a Hugo Viana, embora essa opinião vá depender em demasia do mercado de verão de 2025. Seria muito mais grave perder Rúben Amorim, o que também irá acontecer, mais cedo que tarde. Todos nos lembramos das primeiras janelas de transferências de Hugo Viana e a quantidade de flops que trouxe. O seu crescimento foi notório, mas teve o claro suporte do treinador. Está longe de ser o melhor do mundo, mas é uma mais valia para qualquer estrutura, continuando neste percurso ascendente.
“Hugo Viana merece tudo, não só do ponto de vista profissional mas também da parte humana vai para um dos clubes mais poderosos do mundo (Man. City) a par do Real Madrid. Algo que nunca aconteceu… um dirigente português a ir para um patamar máximo dos máximos.”
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Frederico Varandas surpreendeu igualmente quando revelou alguns técnicos que rejeitaram assinar com o Sporting (numa fase em que fechou com Silas):
«E eu posso dizer aqui, sem qualquer problema, Leonardo Jardim, Abel Ferreira, Rui Jorge, Quique Setién, Unai Emery (com quem o Viana tinha uma ótima relação), todos, por diferentes razões, agradeceram mas não queriam vir», afirmou a Hugo Gilberto.
Ao nível nacional, Rúben Amorim já ultrapassou Leonardo Jardim e Rui Jorge, sendo aceitável quem defende que Abel Ferreira ainda possa estar no patamar do antigo médio, já que tem conquistas continentais. No panorama internacional, o treinador do Sporting está ao mesmo nível de Unai Emery, que não esteve particularmente bem nos projetos ‘grandes’ em que marcou presença (pese os recentes trabalhos em Villarreal e Aston Villa). Quique Setién já ficou para trás. Isto não invalida que possam ser excelentes nomes para os leões depois da saída de Rúben Amorim, embora alguns sejam irrealistas no momento (especialmente Emery). Nota para o facto de que qualquer um teria sido uma alternativa superior a qualquer um dos treinadores que o Sporting teve antes de Rúben Amorim. José Peseiro, Macel Keizer e Silas são um leque manifestamente fraco.
Frederico Varandas seguramente já entendeu que é impossível contratar um elemento com o gabarito de Rúben Amorim, quando este sair. O técnico do Sporting está a bater à porta da elite e essa gama não quer vir para Portugal, mesmo que seja conquistado o bicampeonato.
🗣️ Frederico Varandas:
“Contratar Amorim por 10M€ foi um ato 100% racional. Em 2020 ao contrário de outros, Rúben Amorim não hesitou. Teve a coragem de aceitar este cargo… teoricamente um jovem que vinha para um cemitérios de treinadores.” pic.twitter.com/qkLI6eou6e
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O presidente também mostrou uma camada de realismo que antes não tinha apresentado. Frederico Varandas disse o que toda a gente sabe, mas poucos o dizem:
«Se me disserem a mim, a um sócio do Sporting, que eu acredito que o Sporting vai vencer uma Liga dos Campeões, estaria a mentir. Não acredito. Não acredito. E não é pela falta de competência que a minha equipa tem, que a minha estrutura tem, mas simplesmente nós temos de ter a consciência do que é que somos, enquanto país, e a economia que somos e com quem competimos».
A verdade é que 2004 já lá vai. A Liga Portugal não é uma potência, sem contar com o facto de que a Champions League mudou o seu formato. Sporting, Benfica ou FC Porto (que até está fora em 2024/25), o máximo que podem almejar nesta competição são os quartos de final, onde sobram os ‘tubarões’ com quem ninguém quer jogar. Poderia existir uma réstia de esperança se as eliminatórias fossem a uma mão, mas nem assim é. Frederico Varandas explicou muito bem a realidade do futebol português, com palavras claras e somente os fanáticos irão discordar dele. A Liga Europa é uma competição secundária, mas muito mais realista de chegar a Portugal. No entanto, nenhum dos ‘grandes’ vão querer marcar presença neste ‘segundo escalão’, já que é sinal que se falhou no campeonato na temporada anterior.
“Algum português ao ouvir as escutas do apito dourado tem dúvidas do que é o Pinto da Costa?”
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O tema que marcou a entrevista foram as palavras dedicadas a Pinto da Costa e a Luís Filipe Vieira, assumindo que os dois representam duas eras do ‘mal’ no futebol português. Frederico Varandas não se considerará o grande rival do antigo presidente do FC Porto, mas possivelmente foi quem lhe fez mais frente nos últimos anos, sem qualquer receio de o criticar:
«Seria horrível se eu fosse comparado a Pinto da Costa. Para mim, toda a competência que uma pessoa possa ter, toda a inteligência, vale zero, para mim é uma fraude, se não for alicerçada em valores e na ética. E, por isso, para mim, na minha conceção de ser, seria horrível se eu fosse comparado a esse presidente».
Há pontos em que Frederico Varandas será inevitavelmente comparado a Pinto da Costa, nomeadamente se a sua presença no Sporting terminar com o final feliz. O dirigente é o responsável pela revitalização do emblema de Alvalade. Não se tratou de uma refundação, mas sim de uma recuperação. Poucos se lembram de o Sporting a ganhar assim ou de passar um ano sem contestações elevadas. Pinto da Costa e José Maria Pedroto (figura que passa entre os ‘pingos da chuva’ no que à corrupção diz respeito) reergueram o FC Porto e pelo Campo Grande sucedeu algo semelhante, mas com Varandas e Amorim, numa era onde tudo é mais claro e há menos zonas cinzentas.
Frederico Varandas ainda foi a tempo de deixar uma pequena ‘laracha’ para Bruno de Carvalho, reduzindo o antigo presidente a uma linha de discurso, quando o mesmo já foi o protagonista do futebol português:
«Também tenho de lhe dizer que nós, o Sporting, para nós, e esse acho que é o nosso segredo, os valores estão a base do nosso sucesso. A dignidade, a integridade e o desportivismo, para nós, estão acima de qualquer título ou acima de qualquer conquista. Também é verdade que na nossa história o Sporting se desviou recentemente desses valores. Mas a verdade é que foi o Sporting também a expelir e a resolver esse problema. Mas nós não negamos essa fase. Independentemente das conquistas e dos feitos dessa fase, nós não elogiamos publicamente essa liderança. Depois, porque eu acho que tem de existir alguma coerência moral. Ou seja, eu, se preconizo e se adoto e divulgo que nós agimos sob determinados valores e transparência, então não faz sentido elogiarmos publicamente quem representa o oposto disso tudo».
Perdão de 100M€? “Foi um trabalho duro e longo. Mas atenção, isto só foi feito porque no final de contas foi um bom negócio para todos. Para o Sporting e para a Banca. Se não fosse, não o teríamos feito.”
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Podemos concluir que esta entrevista explana a evolução de Frederico Varandas na área do discurso, numa entrevista em que não possuiu qualquer suporte para o auxiliar. As ideias possivelmente são as mesmas. Já o ouvimos a atacar Pinto da Costa e a elogiar Hugo Viana, mas nunca com esta clareza e frieza, algo necessário para o cargo que ocupa.
As próximas eleições do Sporting realizam-se em 2026 e ainda não se conhece nenhum dos candidatos. Frederico Varandas terá a vitória no bolso, caso se lance na corrida. Caso opte por uma retirada, os sportinguistas poderão ter algum trabalho a analisar possíveis suces