A falta de convicção da diretoria brasileira

João Pedro SundfeldJunho 12, 20214min0

A falta de convicção da diretoria brasileira

João Pedro SundfeldJunho 12, 20214min0
No Brasil, é comum um treinador ser demitido após poucos meses no comando da equipa; conheça a falta de convicção das diretorias no país

No Brasil, é comum se falar na ‘dança das cadeiras dos técnicos’, ou expressões similares, pois, de facto, os treinadores no país costumam ‘gozar’ de uma instabilidade sem igual. São contratados, têm de apresentar resultados rápido. Vencer e convencer. Senão… rua! É o modus operandi das diretorias no país, e isso já é conhecido por todos que acompanham o futebol em terras canarinhas.

Para 2021, houve uma mudança – muito pedida há tempos – que limitou a quantidade de troca de técnicos durante o Brasileirão. Desde modo, cada clube pode demitir e contratar apenas uma vez ao longo das 38 jornadas do campeonato nacional, uma medida que prometia trazer mais estabilidade e fazer com que as diretorias criassem um planejamento melhor na hora de contratar.

Esta estabilidade, porém, não passou de uma fábula contada pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) para os adeptos e profissionais. A realidade é a mesma de outrora, com contratações sem convicção e que, apesar de promissoras (ou não), seguem precisando de resultados imediatos.

É o caso de Alberto Valentim, no Cuiabá. Ao chegar no Mato Grosso, o treinador conseguiu rapidamente bons resultados e, principalmente, um título estadual. Estreou na Série A invicto, sem peso, e não fez uma boa partida. Empatou com o Juventude num confronto que mostrou pouquíssima qualidade. Valentim, porém, seguia sem perder.

A diretoria pouco quis saber. Mandou o técnico embora e justificou a dizer que o time não estava a render em campo, ou seja, contrataram um treinador, este ficou invicto e, na primeira jornada do Brasileirão, gastaram a única troca de técnico que o clube tem direito ao longo da competição. Convicção?

Alberto Valentim foi campeão estadual com o Cuiabá (Foto: AssCom Dourado)

Situação semelhante ocorre no Internacional. A diretoria colorada contratou Miguel Ángel Ramírez, que fez um grande trabalho no Independiente del Valle e quase trabalhou no Palmeiras. O nome é bom, ninguém questiona, mas seria o correto para o momento do clube?

Ramírez é conhecido pelo jogo posicional que aplica em suas equipas. Gosta de jogadores ofensivos, pontas de velocidade, jovens promissores. O plantel, no entanto, não oferece muitas destas opções. Existem, sim, talentos da base, mas opções ofensivas não sobram no time.

Para além disso, o espanhol, claramente, precisa de tempo para implementar suas ideias de jogo. Isso, como já dito, não existe no futebol brasileiro. Valentim demitido após 11 jogos (invicto), Jesualdo, em 2019, e Holan, em 2021, saíram do Santos depois de 15 e 12, respectivamente.

Deste modo, para conseguir sobreviver na selva do futebol no país, o técnico precisaria se adaptar rapidamente ao elenco ou ter carta branca para fazer contratações, como explicou Leonardo Suzuki, membro do Análise Verdão, em seu perfil no Twitter. Nenhum dos dois ocorreu e, após um início animador, o rendimento da equipa em campo caiu. Resultados pararam de aparecer, perdeu o Gauchão para o Grêmio e, a gota d’água, foi eliminado na terceira fase da Copa do Brasil, para o Vitória.

Com isso, a alta cúpula do clube optou por sua demissão. Um técnico bom, jovem e com ideia de jogo que poderia ajudar a melhorar o futebol brasileiro. ‘Caiu no conto do Brasileirão’ e sairá por baixo, como uma ilusão. Tem culpa? Claro. É o principal responsável? Nem de longe.

E assim, o desporto (não) se desenvolve no país. É nítido que existe uma melhora de anos pra cá. Equipas menores conseguem rivalizar mais com os grandes, times nordestinos tornaram-se exemplo de como administrar um clube e o upgrade na qualidade do jogo é evidente. Porém, muitas questões seguem igual sempre foram – e sempre foram erradas.

Resta apenas torcer para que, com a nova regra, erros diminuam e diretorias tornem-se mais profissionais. Treinadores têm de ser contratados pelo estilo de jogo e características da equipa, não por nome ou pressão política. E estes devem ter o respaldo dos presidentes. Isso, porém, não aparenta acontecer.


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