A Odisseia do dia 25 de Abril do primeiro campeão da Liberdade
Corria o ano de 1974, na noite de 10 de abril, o Sporting recebia em Alvalade o 1.FC Magdeburg – equipa da Alemanha de Leste onde a figura de estaque era um dos maiores craques do futebol do “outro lado do Muro”, Jürgen Sparwasser. Eram as meias finais da taça das taças de 1973/74. O jogo ficou 1-1 com golos de Carlos Manaca e de Sparwasser.
A segunda-mão estava agendada para a cidade da Saxónia no dia 24 de Abril. A época esta a correr bem a ambas as equipas que se encontravam no 1º lugar dos respetivos campeonatos. A partida foi transmitida em direto pela RTP – uma situação pouco comum na altura – onde apenas um par de horas mais tarde, militares do MFA ocupariam e anunciaram o dobre de finados ao 48 anos de fascismo.
Quanto ao jogo em si, o Sporting perdia o jogo por 2-1 com golos de Pommerenke, o inevitável Sparwasser e Marinho – Yazalde, não jogou as duas mãos por se encontrar lesionado. O jogo ficou marcado pelo azar de Fernando Tomé, que a 3 minutos do fim viu o seu cabeceamento quase perfeito esbarrar no poste. Quanto a equipa alemã, segiu para final onde arrebatou o trofeu vencendo o AC Milan por 2-0.
A turma de alvalade tinha a viagem de regresso para Portugal agendada para 25 de Abril. Saiu de Magdemburgo as 4h30 da manha – a 4 horas atras ecoava na emissão do Radio Renascença a Grandola Vila Morena de Zeca Afonso. Chegada a comitiva portuguesa a Lisboeta a Berlim Ocidental recebeu dos funcionários do posto fronteiriço a boa nova de que estava a ocorrer uma revolução Portugal. Porém, a falta de informação – desinformação que corria para o exterior – fizeram com que a noticia fosse transmitida de uma forma diametralmente oposta a realidade, como recorda Fernando Tomé: «No aeroporto, falaram-nos em milhares de mortos. Depois ficámos retidos na fronteira entre Espanha e Portugal, tivemos de passar lá a noite. Foi uma experiência inesquecível.»
Rezam as crónicas que o presidente João Rocha reagiu de forma caricata à noticia da revolução, manifestando uma preocupação com o seu mercedes: “porra… e eu que deixei o carro na Baixa!!”.
Ao voar de Frankfurt para Badajoz, a equipa ficou retida 40 horas em território espanhol – na altura dominado pelo regime franquista e que não via com bons olhos o acontecimento do país vizinho. A situação foi resolvida quando João Rocha contactou com o MFA para que a equipa pudesse seguir para Lisboa, onde chegou a 26 de Abril.
Se fora dos relvados o ano de 74 era radiante dentro deles também o foi para equipa de verde e branco: campeão, vencedor da taça de Portugal e atingiu as meias finais da Taças das Taças. Yazalde imortalizar-se-ia também nesse ano com 46 golos com a camisola listada.
Acabo com o relato de Phil Mailer – jornalista irlandês, que se mudou para Portugal em 1974 e publicou o livro “Portugal – a revolução impossível?” – das primeiras horas da manha de um dos dias mais gloriosos da nossa História:
“Os blindados fazem a sua aparição. As aclamações são mais ruidosas do que se o Sporting tivesse ganho ao Benfica. As pessoas correm atrás dos carros de combate e trepam para cima deles. Soldades sorriem e erguem no ar as suas metralhadoras.”