Didier Drogba, uma carreira emblemática dentro e fora das 4 linhas
Não faltam boas histórias em que o futebol foi muito além das quatro linhas. Encerrou guerras, uniu povos, abriu as portas para minorias. Assim como deu conforto a quem já estava a beira da morte, proporcionou alegrias a quem quase não as tinha, ajudou a superar barreiras. Neste artigo e nos próximos meses, resgatamos alguns desses belos capítulos do esporte.
Costa do Marfim e a guerra civil
Em 2002 a Costa do Marfim passou a conviver com uma guerra civil. Os rebeldes conhecidos como Forces Nouvelles (“Forças Novas”) ocuparam progressivamente a metade norte do país, a luta era travada entre as forças do governo e os rebeldes que representavam o norte do país, maioritariamente muçulmano e com vasto número de imigrantes, o lado norte e centro era controlado por eles; e a sul, controlada pelas Forças Armadas Nacionais.
Em meio ao conflito, a população sofria. Milhares morreram, inúmeras violações dos direitos humanos foram relatadas e por várias vezes intervenções estrangeiras foram cogitadas e algumas até realizadas, sempre sem sucesso. Até que o futebol revelou sua força.
Drogba, mais que um grande atacante
A vitória sobre o Sudão por 3 a 1 rendeu a primeira classificação da história da Costa do Marfim para uma Copa do Mundo. Essa classificação à Copa do Mundo de 2006, na Alemanha, ajudou a unir o país. A população pode esquecer o terror que vivia e comemorar.
Após o jogo, no auge da emoção, Drogba fez questão de lembrar que país enfrentava uma guerra, e fez um discurso televisionado para toda a Costa do Marfim que mais parecia um apelo já que, de joelhos, acompanhado dos demais companheiros, ele falou:
“Homens e mulheres do norte, do sul, do leste e do oeste, provamos hoje que todas as pessoas da Costa do Marfim podem co-existir e jogar juntas com um objetivo em comum: se classificar para a Copa do Mundo. Prometemos a vocês que essa celebração irá unir todas as pessoas. Hoje, nós pedimos, de joelhos: Perdoem. Perdoem. Perdoem. O único país na África com tantas riquezas não deve acabar em uma guerra. Por favor, abaixem suas armas. Promovam as eleições. Tudo ficará melhor. Queremos nos divertir, então parem de disparar suas armas. Queremos jogar futebol, então parem de disparar suas armas. Tem fogo, mas os Malians, os Bete, os Dioula… Não queremos isso de novo. Não somos xenófobos, somos gentis. Não queremos este fogo, não queremos isto de novo. ”
Cessar fogo
Um discurso de poucos segundos, mas com uma repercussão gigante. Uma semana depois, governo e rebeldes firmaram uma trégua, que segundo dados já havia vitimizado mais de 4 mil pessoas.
No ano seguinte a copa trouxe um momento de alegrias para marfinenses, seria a primeira vez que seus ídolos iriam jogar contra os melhores do mundo.
Copa 2006
Veio a Copa do Mundo e quis o destino que a simpática Costa do Marfim caísse num grupo complicado com Argentina, Holanda e Sérvia e Montenegro, com duas derrotas e uma vitória(3×2 sobre a Sérvia) e fosse eliminada ainda na primeira fase sem, porém, dar nenhum vexame. Drogba fez seu primeiro golos em copas do mundo e no seu íntimo ficava um sentimento que deveria fazer mais pelo seu povo, não gols mas ações.
Drogba – revolucionário
Escolhido o melhor jogador africano de 2006, Drogba, já em 2007, terminou com os pés aquilo que tinha começado com as palavras dois anos antes: fez um apelo ao presidente que a equipe jogasse a partida contra Madagáscar na cidade de Bouaké, capital da rebelião e sede das tropas rebeldes.
Assim, o país inteiro pela primeira vez parava, com as tropas rivais assistindo ao jogo lado a lado de forma pacífica. A Costa do Marfim goleou por 5×0 Madagáscar. Ao final o público invadiu o campo para comemorar com seus heróis.
Infelizmente, em 2011, o país afundou novamente numa Guerra Civil, no entanto Drogba continuou fazendo por sua nação. Consolidou-se como um representante da paz no país. Ele reuniu-se com autoridades políticas dos dois lados do conflito e participou de reuniões com os mais diversos grupos étnicos.
Dessa forma, Didier Yves Drogba Tébily deixou de ser apenas um jogador de futebol e virou o símbolo máximo de um povo