“Cromos” do Mundial de 1978 e um capítulo sombrio no futebol

Pedro PereiraAbril 21, 20204min0

“Cromos” do Mundial de 1978 e um capítulo sombrio no futebol

Pedro PereiraAbril 21, 20204min0
O Mundial de 1978 ficará para sempre marcado com uma imagem negra e de grande fraude, contada por alguns dos próprios jogadores. A Caderneta dos Cromos traz dois episódios que explicam esse momento menos positivo da redonda

Uma história que nunca poderá ser esquecida, o Campeonato do Mundo de 1978 foi recordado pela Caderneta dos Cromo como um dos momentos mais críticos e pobres do desporto mundial.

FRAUDE, DITADURA E OPRESSÃO… UM MUNDIAL TRISTE E SEM MEMÓRIA

O Mundial de 1978 na Argentina é um capítulo sombrio na história do futebol. Durante um período de quase uma década, a Argentina esteve em guerra. A ditadura mantinha-se no poder e derramava toda e qualquer gota de sangue em prol da ordem e da obediência de um povo asfixiado. Um ano antes do Mundial, mais de 5000 pessoas desapareceram. Pessoas essas que estavam associadas à força revolucionária anti fascismo. O mito de que Cruyff não participou neste Mundial por motivações políticas não passa disso mesmo: um mito. A verdade é que Cruyff, a sua mulher e filhos foram raptados na sua casa de Barcelona por assaltantes em 1977 e ele sentiu que não estava em condições para deixar a sua família sozinha durante o Mundial.

Voltemos à Argentina. Outro episódio que marcou este Mundial foi o jogo entre a Argentina e o Peru. Desde o início da competição que se espalhavam rumores de que a taça já estava entregue aos argentinos. Porquê? O poder ditatorial precisava de desviar as atenções, queria fazer com que um povo celebrasse mesmo com lágrimas na cara. Queria brincar com a psique de uma sociedade.

Voltemos ao jogo. Naquele ano, a fase competitiva antes da final era jogada em grupos, não num formato a eliminar. A Argentina tinha que ganhar por mais de 4 golos ao Perú para avançar para a final. Caso contrario, passavam os seus eternos rivais, os brasileiros. Ficou 6-0.  Passou a Argentina.

Na final Argentina enfrentou a Holanda e venceu por 3-1 com 2 golos de Kempes e 1 de Bertoni.

Videla, general e presidente militar da altura esfregou as mãos de felicidade. Por momentos, a Argentina era um país de sucesso, de vitória e de festa. Muitos dizem que o governo ditador da Argentina mexeu todos e quaisquer cordelinhos para terminar esta competição vitoriosa. A opressão, essa, continuava forte.

E A HISTÓRIA DE RAMON QUIROGA

O jogo entre a Argentina e o Peru foi dos jogos que mais dúvidas levantou sobre a verdade desportiva daquela competição. Ramón Quiroga, guarda redes do Perú, foi o mais contestado. Para além disso, tornou-se suspeito de uma obra filha da corrupção. Quiroga nasceu na argentina mas nacionalizou-se peruano, o que aumentou ainda mais o tom das suspeitas. Passados 20 anos do Mundial, o portero concedeu uma entrevista onde abordou temas sensíveis desse mundial e desse jogo em particular:

“Acho que o árbitro e o fiscal estavam manipulados. Eu estava bem. Tive sempre os tomates no sítio. Se tivesse recebido dinheiro, não jogava mais nenhum jogo pelo Peru. Nem era cumprimentado nas ruas do Peru como sou. Nesse mundial, joguei todos os jogos e recebi 500 dolares. Nada mais. Antes do jogo, alguns jogadores queriam que eu não jogasse. “Como assim nao vou jogar?”. O Munante, esse tipo de merda. Eu acredito que há um Deus e Deus castiga. Todos os que aceitaram dinheiro… acho que há quem tenha ganho, mas não posso garantir…. Alguns morreram e outros morreram para o futebol. Roberto Rojas, um tipo que nunca jogou e jogou nesse jogo. Morreu de acidente. A mim explodiu uma bomba no estágio e não morri. Marcos Calderón, o treinador, caiu o avião e morreu. Manzo deixa passar o golo de Tarantini. Não sei onde anda Manzo agora. Nesse partido jogaram jogadores que nunca tinham jogado antes. Gorriti que está no quarto e no quinto golo. Rojitas também. Não me recordo se foi antes do jogo ou no intervalo… mas recebemos a visita de Videla, Massera, Kissinger e uns quantos militares.”

Videla foi um general do exército e presidente argentino da época, um sanguinário por excelência; Massera, membro da Marinha argentina e Kissinger, o Secretário de Estado dos USA, país que contribuiu com todos os esforços para manter um governo ditatorial e opressor neste país da América Latina.


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