3 Cromos de “feitios complicados”: Bogarde, Gravesen e Adams
O futebol (e o desporto) é feito de artistas e cientistas, de jogadores que levantam multidões num minuto para logo a seguir deixá-las em fúria com uma acção reprovável, de homens com valores mas com problemas… nessa óptica a Caderneta dos Cromos fala de três personagens do futebol mundial que, por vezes, foram “complicados” em momentos da carreira. Qual deles o mais problemático?
TONY ADAMS… ENTRE O VÍCIO E A REDENÇÃO
Jogou a sua vida inteira no melhor clube do norte de Londres. Mas nasceu em Dagenham, na zona leste de Londres, um subúrbio. A sua mãe era obesa e o seu pai alcoólico. Dois dos seus primeiros vícios: comida e álcool. Ainda assim, ele mesmo afirma que o primeiro vício foi o futebol.
“Não tive uma infância fácil. Eu era um miúdo muito tímido e inseguro. Não me sentia bem na minha pele. O futebol levou-me para longe dos meus sentimentos e dos meus pensamentos. Assim como o álcool me fez uns anos depois”.
Era comum Tony Adams ir bêbado ou ressacado para os jogos. Ainda mais comum era ver o capitão do Arsenal nos pubs londrinos em figuras lastimáveis. 1990, Tony Adams espeta o seu carro contra uma parede. Descobriram que tinha 4 vezes o valor admitido de álcool no sangue.
Foi para a prisão. Um jogador do Arsenal na prisão, de loucos. Na prisão, convenceu o um dos cozinheiros da prisão (que era o guarda redes da equipa de futebol dos reclusos) a dar-lhe frango frito durante todas as refeições. Frango frito que era o cozinhado que a mãe lhe dava a maioria das vezes enquanto criança. Hoje, recuperado do álcool, diz que o único vício que não consegue largar é frango frito com batatas fritas. Freud explica.
Enquanto jogador do Arsenal, todos os Natais havia uma festa do clube com muito álcool (a cultura boémia do inglês que se estendeu ao futebol ainda viveu até aos anos 2000). Tony Adams disse que, depois de ficar sóbrio, nunca mais bebeu nessas festas. Diz ele que, enquanto os colegas bebem 23 cervejas ele bebe 23 cappuccinos.
No final da sua carreira, Tony Adams abriu uma clínica de reabilitação para alcoólicos anónimos.
O OGRE DINAMARQUÊS E UM PROBLEMA “MÉDICO”
Num determinado jogo pelo Everton, Gravesen, aquele médio raivoso que batia no pai e na mãe (figurativamente, claro), lesionou-se no ombro. Caiu, agarrou-se ao ombro e esperou que chegasse o fisioterapeuta. Naquela altura era Mick Rathbone o responsável de ir ao terreno de jogo analisar o estado físico do jogador.
Que, no caso de ser Gravesen lesionado, significa calhar a fava. Mick chega-se perto e pergunta qual o problema. Gravesen responde: “Qual o problema? Diz-me tu car****, seu idiota de mer**. Tu é que és o médico”, tudo isto dito num inglês com sotaque dinamarquês num tom à Gravesen. O médico diz que nunca tal lhe tinha acontecido, nunca tinha apanhado um jogador tão nervoso, então decidiu perguntar-lhe se ele queria beber água. “Água?? Uma mer** de água? Só passaram cinco minutos de jogo, seu car****”. Nem a água o acalmava.
Mick, sem saber mais o que fazer, resignou-se a tratar daquele ombro e sair de perto de Gravesen o mais rapidamente possível. Ainda dentro de campo, colocou-lhe a mão no ombro para resolver o problema. “Tira a mer** das mãos de cima de mim antes que te parta todo!”, gritou Gravesen.
Mick contou que estava a dar em doido. Lá conseguiu resolver o problema já fora de campo e Gravesen… Agradeceu-lhe. A besta só queria que as dores lhe passassem. Ou então tem algum trauma com fisioterapia. A verdade é que, enquanto jogador do Everton também, decidiu ir até à sala de fisioterapia do clube com os fisioterapeutas e os jogadores lesionados lá dentro e explodir com foguetes e material pirotécnico. Toda a gente se passou. Mas tinha sido o Gravesen. Alguém tinha coragem de o repreender? Deixa-o estar….
BOGARDE… GOLD DIGGER EM LONDRES?
Para os que não conhecem este cromo, foi um central de referência do futebol holandês. Apesar de ter nascido no Suriname, como tantos daquela geração. Apesar de pouco ter saído do banco na época em que o Ajax escreveu aquela bela e vitoriosa história na Champions League de 1994/1995, quando pegou nas orelhas da taça dos campeões europeus, gritou “esta é para ti, Suriname”.
No fundo, foi um jogador que marcou a história do futebol pelas suas convicções fortes. Na época seguinte à conquista da Champions, Bogarde afirmou-se no eixo da defesa do Ajax e rapidamente mostrou capacidades para voos maiores. E foi o que aconteceu em 1997 quando assinou pelo AC Milan. Jogou apenas três jogos nessa época e saiu para o FC Barcelona.
Ficou pela Catalunha duas épocas onde efectuou apenas 41 jogos no total. Ainda assim, conseguiu convencer o Chelsea FC a assinar um contrato chorudo com a duração de quatro anos em que recebia 40.000 libras por semana. Até aqui tudo bem. Porém, Bogarde, que foi contratado numa altura que o clube era comandado por Gianluca Vialli, nunca convenceu nas suas exibições. Pior quando Vialli sai do comando e entra Ranieri, que disse que não queria aquele jogador. O pesadelo começa. Bogarde não queria sair e o clube não o queria, apesar do contrato de quatro anos estar em vigor.
Conclusão: o central nunca teve oportunidades para jogar e ele pouco se importava. Não falhava a um treino (fosse na equipa principal ou na B) e queria cumprir o contrato até ao fim, jogasse ou não. Para que tenham uma ideia, em quatro anos de contrato, Bogarde fez…. 9 jogos. Nos últimos dois anos de contrato fez um jogo apenas. “Porque é que haveria de desperdiçar um contrato de 15 milhões de euros?
O mundo é sobre dinheiro, por isso, quando te oferecem milhões, tu aceitas. Poucas pessoas vão algum dia ganhar tanto dinheiro. Eu sou um dos poucos afortunados que vai ganhar esses valores. Posso ser uma das piores contratações da Premiership mas isso pouco me importa”, disse ele. Depois desse contrato, Bogarde terminou a sua carreira. Uma carreira que começou em 1994 e terminou em 2004 com 129 jogos realizados. Uma média 13 jogos por época.