Qual o futuro após o 4º lugar histórico no Europeu de sub-19?

Ana CarvalhoJulho 26, 202311min0

Qual o futuro após o 4º lugar histórico no Europeu de sub-19?

Ana CarvalhoJulho 26, 202311min0
Ana Carvalho olha para os feitos da selecção nacional feminina de sub-19 no Europeu e deixa um pedido para o futuro das atletas

Ainda no rescaldo do Europeu de Andebol Feminino de Sub-19, que decorreu na Roménia de 6 a 16 de Julho que trouxe um excelente 4º lugar na competição, fazemos o rescaldo com destaque para algumas jogadoras chave.

Tal como referimos no último artigo, Portugal começou este Europeu com uma derrota contra a seleção alemã, mas com mais duas vitórias contundentes sobre a equipa da casa e sobre a Islândia no grupo garantiu a passagem ao main round da competição na primeira posição. No main round jogou e venceu a seleção da Suíça por uns brilhantes 38-25, ficando à espera do último jogo do grupo contra a Suécia para garantir a passagem às meias-finais da competição. Garantiu essa passagem levando para campo um jogo maduro e seguro por parte das atletas do treinador José António Silva. O resultado final de 30-23 mostra bem a superioridade da armada lusa, levando os portugueses a sonhar com voos mais altos.

De referir que a generalidade das seleções que Portugal foi apanhando no caminho até às meias-finais têm grande tradição no andebol feminino, como sendo uma Roménia ou Suécia, ou são países emergentes na modalidade e que têm investido bastante na formação nos últimos anos, tal como é o exemplo da Suíça. Os resultados apresentados mostram que também por cá podem aparecer bons talentos e que com trabalho e investimento na base, poderemos ter no futuro boas gerações e bons resultados também no escalão sénior.

A meia-final trouxe como adversário a poderosa Dinamarca, que se apresenta sempre muito forte no andebol feminino, seja na formação seja no escalão sénior. Portugal fez um jogo competente a nível ofensivo, sendo um pouco mais permeável a nível defensivo, fruto do modelo de jogo apresentado desde o início do campeonato, que esteve assente num 6:0 rapidamente mutável num 5+1, abrindo espaços atrás e desequilibrando as linhas defensivas. Num jogo de tal importância, cuja vitória significava a passagem à final da competição e o garante de uma medalha inédita no andebol feminino, foi visível a diferença de maturidade entre a equipa dinamarquesa e a equipa portuguesa.

De um lado uma seleção com jogadoras habituadas a estar em palcos maiores, mas acima de tudo, que cresceram a ver as várias seleções anteriores a estar presentes nestas fases avançadas da competição. Do outro as jogadoras portuguesas que levavam às costas a responsabilidade de serem pioneiras e abrirem o caminho para as seleções vindouras, que militam na primeira divisão nacional, que não tem comparação com os campeonatos nórdicos onde jogam as suas adversárias. Portugal conseguiu estar muitas vezes na frente do resultado, conseguindo chegar ao último minuto a vencer por um e com posse de bola. A ansiedade da equipa lusa foi evidente nesta fase de jogo, não conseguindo ter clarividência suficiente para criar uma situação clara de golo, acabando por efetuar um remate muito condicionado, que pouco perigo levou à baliza dinamarquesa. A faltar cerca de 15 segundos, a equipa dinamarquesa pôs o último time-out do jogo e criou uma situação clara de golo, empatando o jogo nos segundos finais (31-31), levando o jogo para prolongamento.

Após este momento em que a armada lusa sentiu que tinha a final na mão e acabou por deixar escapar, e também devido ao desgaste do jogo (e de todos os jogos anteriores) aumentado pela pouca rotatividade nas jogadoras utilizadas, a Dinamarca foi claramente superior, vencendo o prolongamento 7-4, garantindo assim a passagem à final. As jogadoras portuguesas estavam desoladas no final da partida, mas apresentaram-se em grande parte da partida com uma maturidade acima do esperado para quem não costuma estar nestes palcos. Havia ainda uma medalha a ganhar e o foco rapidamente teve de mudar para esse mesmo objetivo.

No jogo de atribuição do 3º/4º lugares, Portugal teve como adversário a equipa da Roménia, equipa que já havia vencido no jogo do grupo. Sendo a equipa da casa, sabia-se que a história do jogo seria completamente diferente do encontrado no primeiro encontro entre as duas seleções, já que se esperava um pavilhão lotado de um público habituado a apoiar as suas seleções de andebol e uma equipa da Roménia muito possante na luta por esse 3º lugar. A equipa portuguesa não teve um início de jogo muito positivo, ficando desde cedo com uma desvantagem no marcador, obrigando o selecionador a parar o jogo na tentativa de ajustar a equipa nacional, mas tal não aconteceu, avolumando-se ainda mais a desvantagem no marcador, chegando a 8 golos (6-14) aos 19 minutos da partida.

O selecionador José António Silva viu-se obrigado a parar novamente a partida. Até ao final da primeira parte a diferença diminuiu ligeiramente, impulsionados por uma brilhante exibição da pivot Sofia Ferreira, sendo o resultado ao intervalo 13-18 favorável à equipa romena. O Início da segunda parte não foi diferente do início do jogo, e Portugal viu novamente a seleção adversária fugir no resultado, chegando a ter uma desvantagem de 10 golos.

Portugal não conseguia ter fluidez no ataque, notava-se o desgaste do campeonato nas jogadoras lusas, mais uma vez consequência da baixa rotação das jogadoras durante os jogos do Europeu, inclusive em jogos cujo resultado era grandemente favorável a Portugal. As jogadoras lusas lutaram até ao último minuto, conseguiram diminuir a distância no marcador mas nunca estiveram perto de por em causa a vitória romena. O resultado final mostra um elevado número de ataques de parte a parte (32-39) e também a fraca exibição defensiva da equipa lusa.

Constança Sequeira foi a MVP e a melhor marcadora da equipa portuguesa, sendo a par de Sofia Ferreira as jogadoras mais seguras e com mais maturidade para encarar um jogo decisivo destes, após a derrota na meia-final. As restantes jogadoras que foram a jogo acusaram bastante a pressão de jogarem para as medalhas, estando alguns pontos abaixo das exibições apresentadas anteriormente.

Destaque merecidíssimo a Luciana Rebelo que entrou no 7 ideal da competição sendo considerada a melhor lateral direita do campeonato.

Junta a este destaque o fato de ter sido a segunda melhor marcadora do torneio com uns impressionantes 62 golos marcados durante toda a prova.

Independentemente dos dois últimos jogos, o percurso desta seleção deve deixar-nos a todos muito orgulhos e a pensar no que fazer para o futuro. Estas atletas, e outras que possam vir a seguir, precisam de estar em jogos de pressão mais frequentemente, precisam de ter apoios e investimento para poderem dedicar-se essencialmente à prática da modalidade e para poderem manter-se a par das jogadoras que enfrentaram neste Campeonato Europeu.

 Chegar a este patamar deve-se a muito trabalho por parte destas atletas, de um investimento neste grupo por parte dos selecionadores nacionais e dos clubes onde jogam, mas o cenário muda daqui para a frente. Este grupo ainda terá o Mundial de Sub-20 no próximo ano, para o qual se apurou com a brilhante classificação que garantiu neste campeonato, mas após o término das competições jovens, as atletas de seleção nacional que não ingressam nos trabalhos da seleção A são normalmente “esquecidas” e não continuam a ser trabalhadas para futuro. Não se espera que todas estas atletas consigam entrar de caras na seleção maior, mas precisam de estar sujeitas a jogos competitivos e com pressão para que daqui a uns anos possam estar preparadas e com mais experiências para esse patamar.

Atualmente esperamos o aparecimento sempre de talentos para que possamos respirar de alívio e acreditar que teremos bons resultados na seleção sénior, mas a realidade é que num grupo de 16/18 atletas que compõem cada convocatória não é normal que consigamos ter tantos talentos puros, precisamos de trabalhar as jogadoras para que tenham o seu tempo de maturação. É necessário promover a saída da atleta portuguesa para outros campeonatos, por exemplo, o campeonato espanhol bem mais competitivo e não tão difícil de incluir atletas nacionais, como tem acontecido nos últimos anos.

Seria também interessante pensar em formas internas de aumentar o investimento no campeonato nacional para aumentar também a competitividade. Poderá ser a restruturação dos campeonatos nacionais uma resposta positiva a este problema? Veremos com o tempo como funcionará. Este é um tema que iremos falar num artigo no início da próxima época. Outro ponto importante é o trabalho vertical que deve ser feito em todas as camadas da seleção nacional. É necessário que haja uma espinha dorsal bem definida, um modelo de jogo comum entre todas as equipas, e que seja dado tempo às várias equipas técnicas das seleções nacionais de fazer o seu trabalho, essencialmente dar tempo também de falhar. Sendo eu alguém que tem espírito critico no andebol nacional, sei também que independentemente de ser a minha preferência, o tempo deve ser dado para se ter resultados.

Na minha visão de trabalho com atletas, acredito que só se evoluiu a falhar e a saber aceitar que se falha para se melhorar. Tenho exatamente a mesma posição em relação às equipas técnicas e aos treinadores. No entanto acredito também que não se deve estar constantemente a alterar os processos de trabalho, o que é algo que acontece amiúde na estrutura das seleções nacionais femininas.

Estas atletas merecem ser lembradas, trabalhadas e que os seus feitos não sejam únicos. Já a partir da próxima semana terá início o Campeonato Europeu de sub-17, realizado de 3 a 13 de Agosto no Montenegro. Esperamos que os resultados continuem a apresentar um crescimento positivo do andebol feminino nacional.


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