Giro d’Italia – Simon Yates, porque surpreende o homem que reina de Rosa?
Com o apreço de uns e a contestação de outros, Simon Yates é o grande dominador deste Giro. Começa a ser difícil não ficar rendido ao que o pequeno trepador tem feito nos últimos dias. Simon tem sido sinónimo de Giro e Giro tem sido sinónimo de espectáculo. E é isso mesmo, Simon Yates tem sido um espectáculo, todos os dias. O britânico tem centrado todas as atenções em seu redor, sendo de tal forma surpreendente que acaba por ser alvo de grande contestação, principalmente por parte dos adeptos que a esta altura esperavam ver outros favoritos vestidos de rosa. Ao fazer a abordagem da segunda semana do Giro, o Fair Play, decidiu apresentar o homem do momento no mundo do ciclismo e tentar perceber o porquê de muitos estarem surpreendidos com os feitos deste pequeno Grande ciclista.
Fiquem então a conhecer:
- Nome: Simon Philip Yates
- Idade: 25 anos
- Altura: 1,72 m
- Peso: 59 kg
- Nacionalidade: Britânico
- Equipa: Mitchelton Scott
- Vitórias: 11
- Épocas no World Tour: 4ª época (atualmente)
Antes de 4 de Maio de 2018
Seja qual for o desfecho, dia 4 de Maio de 2018, será para sempre o dia que marca o ponto de viragem na carreira de Simon Yates.
Segundo uma das definições do dicionário português, surpresa é algo “que acontece ou surge de repente; que não está previsto”. Como se pode ler pelas manchetes dos jornais desportivos, Simon é a surpresa do Giro 2018. E surpresa porquê? Exactamente pelo que a definição afirma.
Apesar de ser um jovem ciclista reconhecido e de muita qualidade; apesar de ser apresentado com um dos favoritos à vitória final; apesar de ser conhecido como um bom trepador; apesar de já ter fechado Top 10 no Tour e na Vuelta, ninguém apostaria num cenário de tanta superioridade, tanta capacidade e tanta vontade como Simon está a mostrar até esta altura no Giro d’Italia.
E isto porquê? Porque apesar de já ter dado indícios de ter toda esta qualidade, o jovem trepador ainda não tinha comprovado que pudesse atingir este nível e bater-se frente a frente com os melhores do mundo, tanto na alta montanha como numa prova de três semanas.
Simon no início da sua carreira, até era mais visto como um puncheur, tendo o sentido mais apurado para vencer etapas, sendo reconhecido ao irmão Adam uma maior qualidade como voltista, tendo uma maior regularidade ao longo das provas por etapas.
Analise-se então factos e a carreira de Simon até ao dia 4 de Maio de 2018.
Até este dia, Simon tinha 8 vitórias na sua carreira, 2 das quais atingidas na corrente época.
Chegou ao World Tour em 2014 e integrou a estrutura da Orica-GreenEDGE, a mesma onde se mantém até hoje. Trazia no currículo uma vitória na Volta à Grã-Bretanha ao serviço da selecção britânica.
Desde que está no escalão mais alto do ciclismo tem 5 vitórias entre 2014 e 2017. Dessas 5, apenas uma vitória é numa grande volta, na Vuelta 2016, sendo a sua segunda melhor classificação um 5º lugar numa etapa do Tour 2017. Participou no Tour de 2014, 2015 e 2017, não concluindo o primeiro. Participou também na Vuelta 2016 e 2017. Fechou Top 10 na Vuelta 2016, em que foi 6º, e no Tour 2017, sendo 7º e vencendo a camisola da juventude. Das suas 5 participações em grandes voltas apenas concluiu 11 etapas dentro do Top 10, sendo que 2 foram contra-relógio por equipas. Temos então 9 Top 10 em etapas de grandes voltas.
Tirando as grandes voltas Simon alcançou ainda o 2º lugar da geral do Paris-Nice 2018, tendo sido 9º em 2017. Conta também com top 10 na Volta à Catalunha 2018 (4º), Volta ao País Basco 2015 (5º), Volta à Romandia 2015 (6º) e 2017 (2º) e Critérium du Dauphiné 2015 (5º).
Depois de 4 de Maio de 2018
Dia 4 de Maio chegou e logo no contra-relógio inicial Simon mostrou que estava diferente. Fica em 7º lugar da etapa e perde apenas 20 segundos para o grande contra-relogista da atualidade Tom Dumoulin. Logo aí surpreendeu, uma vez que não é considerado grande especialista desta disciplina.
De certa forma, era de esperar ver um bom desempenho na etapa 4, em que foi 4º, e na etapa 5, em que foi 5º. Eram subidas ao seu jeito. Terrenos onde Yates mostrou aos adeptos ao longo do tempo que era forte. E se queria lutar pela Volta à Itália teria de aproveitar onde, até então, se pensava ser as etapas indicadas para ele ganhar vantagem.
Com o final da primeira semana veio o Etna e se podíamos esperar que Simon Yates subisse com os melhores, aquela aceleração já nos últimos metros da etapa com que reclamou 26 segundos sobre os seus adversários e a camisola Rosa, surpreendeu de certo muita gente. Ficava em 2º lugar nesse dia não querendo roubar a vitória a um colega de equipa. No entanto, não terminaria a primeira semana sem haver uma vitória por parte do homem que até agora só não tinha ficado no Top 10 das etapas que foram discutidas ao sprint. Etapa número 9 e o britânico vence fechando a primeira semana vestindo a Maglia Rosa e com um 7º, 4º, 5º, 2º e 1º lugar.
Segunda semana e a mesma senda de resultados. A etapa 11 volta a ter um perfil que se adequava ao ciclista, que aproveitou um final de corrida eléctrico e venceu. Deixou arrefecer os lugares do pódio durante mais duas etapas com chegada ao sprint, para depois fechar 2º na mítica subida do Zoncolan e vencer novamente na etapa 15 acabando com as dúvidas de que é até ao momento o trepador mais forte do Giro 101º.
Duas semanas, 15 etapas, 3 vitórias, 2 segundo lugar, 8 top 10 da etapa.
Porque surpreende?
Das 11 vitorias que tem atualmente, Simon conquistou 5 (45,45%) no presente ano. Se contarmos só com as vitórias desde que atua no World Tour, concluí-se que demorou três anos (2014-2017) a alcançar o mesmo número de vitórias que alcançou este ano.
A surpresa fica ainda mais justificada quando se concluí que 27,3% das vitórias da sua carreira aconteceram nos últimos 15 dias, no Giro. Este pode ser um dos pontos que justifique o porquê da surpresa de grande parte dos adeptos face ao que está a fazer no Giro
Em 15 dias, fez apenas menos 1 Top 10 em etapas de uma grande volta do que tinha feito no total das 5 grandes voltas que tinha participado anteriormente. Tinha alcançado 9, neste momento só neste edição do Giro tem 8.
Por outras palavras Simon venceu quase tanto em quinze dias como em três anos no World Tour, sendo incomparável a dimensão das últimas vitórias às que tinha anteriormente. Em duas semanas alcançou feitos que grande parte dos ciclistas não alcança ao longo de uma boa carreira. E isto é que deixa toda a gente surpreendida.
Simon tinha dado boas indicações e o público já esperava que os seus mais recentes feitos viessem a acontecer. O que o público não esperava é que chegasse a este nível tão cedo e logo perante dois dos homens que concentram a maioria do apoio dos fãs das duas rodas, Chris Froome e Tom Dumoulin.
Certamente todos esperavam que quando alcançasse este nível, Simon trouxesse no currículo mais umas quantas vitórias de importância que justificassem a entrada em tal patamar. Mas repare-se, quantos ciclistas do pelotão internacional podem dizer que com 25 anos fecharam Top 10 na Vuelta e no Tour? E quantos o fizeram com 30 ou 35 anos?
Não está definido que é necessário obter determinado performance ou determinado número de vitórias para ser o momento de nascer um vencedor de uma grande volta. Simon Yates está a sentir que o momento dele é agora. Em boa hora está a deixar-se levar pelas suas sensações e a dar espetáculo enquanto persegue o seu objetivo. Mesmo que não venha a conseguir de uma coisa ninguém o pode acusar, de não ter tentado.
Uma página negra…
Não é politica do Fair Play falar em doping. Assim como julgar se é, foi ou vai ser verdade qualquer opinião que se espalhe pelo público. O Fair Play limita-se a analisar acontecimentos comprovados de um ponto vista imparcial. Como tal, este foi um ponto que marcou a grande e ainda curta carreira deste ciclista, sendo obrigatório referir que aconteceu mas sem fazer juízos de valor. Foi um processo que teve início, meio e fim e se encontra no passado.
Simon cometeu um erro, assumiu-o e pagou por ele. Agora, irá ter de saber lidar com a desconfiança daqueles que forem mais fãs dos seus adversários do que dele. E este será o maior castigo que irá ter pela sua atitude. No ano de 2016, o ciclista enfrentou uma suspensão de quatro meses por ter acusado positivo num controlo de doping.