Jorge Jesus continua a ser o treinador que o Sporting precisa?
Vamos já na terceira épcoa de Jorge Jesus no Sporting e, como é normal com um treinador carismático, mas que tem ainda por cumprir o principal designio que levou à sua contratação, o consenso à sua volta está ainda por alcançar.
Os eventos que se seguiram ao jogo de Madrid, com o presidente de um lado a suspender a quase totalidade do plantel e Jorge Jesus a conseguir impor – imagina-se in extremis… – uma última réstia de bom senso, trouxe a descoberto uma faceta que os seus detractores desconheciam ou julgavam inexistente: as preocupações do treinador não se ficam apenas pelo chorudo ordenado e por projectos com condições imbatíveis para superar a concorrência.
Jorge Jesus não abdicou do seu papel de líder, revelando além disso um total compromisso com os interesses do clube que representa.
Se assim não fosse a Jesus bastaria recostar-se no seu cadeirão e aguardar calmamente pelo final da época de cada um dos poucos meses que ainda restavam para o final do campeonato para recolher o seu quinhão e escolher a próxima paragem.
Certamente que não faltariam – nem faltarão – aliciantes projectos, sejam eles apenas de cariz financeiro, num qualquer destino exótico, ou que até clubes dos melhores campeonatos europeus olhem para ele com atenção e mesmo apetite.
Sem se saber muito bem como tudo isto vai acabar sabe-se pelo menos que a discussão sobre o interesse da permanência do treinador foi mais uma vez relançada.
Estamos já muito longe do ano da sua estreia como treinador em Alvalade, indiscutivelmente o seu melhor período até agora. O impacto da sua chegada foi enorme pela espectacularidade do futebol apresentado, na retumbância das vitórias e especialmente da superioridade exibida ante os rivais FC Porto e sobretudo SL Benfica, a quem ganharia a Supertaça logo no dealbar da temporada.
O titulo desse a ano haveria de ficar à distância de um ressalto na canela de Bryan Ruiz. Pelo menos será assim eternizado, sendo a explicação claramente redutora.
Não podia por isso ser mais contrastante a época seguinte. Quase se pode dizer que tudo começou também em Madrid.
A exibição foi merecedora de nota elevada, mas o resultado foi apenas o anúncio de uma característica que tinha vindo para essa época: incapacidade de segurar bons resultados, permeabilidade defensiva estranha em equipas de Jesus. Isto num ano em que os meios colocados à disposição, somados à época anterior levaram a antever uma equipa temível.
Na realidade essa característica nunca o foi para os adversários, mas apenas para os adeptos tantos foram os resultados negativos coleccionados.
Os anticorpos que Jesus tinha criado aquando da passagem pelo rival do outro lado da estrada começaram a fazer-se ouvir. O seu talento para construir plantéis passou a ser questionado, especialmente pela indiferença a que foi votada a “cantera” várias vezes preferida, em fúria despesista, por soluções que nunca o viriam a ser.
Apostas em nomes sonantes mas de carreiras intermitentes ou sob o signo ocaso – dos quais André, Campbell e Markovic sejam os melhores exemplos – revelar-se-ia um erro e o contributo para a maior contestação ao trabalho do treinador.
A questão da formação não é de somenos. É uma das bandeiras que o clube ostenta e que os adeptos gostam de ver ulular orgulhosa e altaneira. Com uma agravante, Jesus encontrou em Alvalade aquela que se pensava ser mais uma geração de ouro made in Alcochete, mas sem produzir os resultados que certamente muitos esperavam.
Iuri Medeiros, Carlos Mané, Wallyson, Matheus Pereira, Palhinha, Esgaio, Tobias Figueiredo e Francisco Geraldes, entre outros, não viram ainda os benefícios da passagem do treinador que tem no currículo a descoberta de inúmeros talentos e reinvenções de carreiras.
Mas esta moeda tem outra face nas vendas de João Mário e Rúben Semedo e na exponenciação do valor de Gelson Martins. Ainda assim parece pouco quando se olha para alguns dos jogadores mencionados acima e de quem se esperava poderem crescer sob o manto de Jesus.
Mas foi também por ele e com ele que Bruno de Carvalho conseguiu fazer os seus trespasses mais volumosos. É que ainda que não tenha conseguido títulos é consensual que a chegada de Jorge Jesus a Alvalade ajudou diminuir distâncias para os principais rivais muito pela qualidade dos seus processos e como eles são eficazes na subida de competitividade do Sporting. Mas também pela mudança de mentalidades.
Isso foi evidente no ano da sua chegada, pela primeira vez ao fim de muitos anos os Sportinguistas viram a sua equipa jogar sem medos, sendo até temido por FC Porto.
Infelizmente Jesus viria a ser vitima de si mesmo e da sua entrada triunfal, muito por causa de uma das suas maiores imperfeições: a comunicação. O entusiasmo e a rivalidade com a anterior entidade patronal contribuiriam para um discurso que teria o efeito de toque a reunir, acabando os seus mind games por ser não só inócuos como até mesmo o combustível de que o carro vermelho de Rui Vitória tanto precisava.
A época ainda curso parecia sobre rodas até ao estranho despiste no Estoril, quando o clube se distraiu com um par de assembleias gerais. Parecia já perdida após a derrota abúlica em Braga, para renascer exactamente quando parecia que tudo se ia desmoronar após a já falada derrota de Madrid.
Está ainda por saber o significado e importância que a passagem, mesmo que episódica e breve, do treinador e presidente por campos opostos terá no futuro da sua relação. Ninguém duvida que Jorge Jesus marcou pontos junto de largos sectores de adeptos e associados verde e brancos.
Também ninguém duvida que no núcleo duro e indefectível de apoiantes de Bruno de Carvalho serão muitos aqueles que não perdoarão o embaraço e o protagonismo do treinador.
Este episódio marcará a passagem de Jorge Jesus no Sporting. Infelizmente trará à discussão questões de pendor “politico”, afastando-a da objectividade com que se deveria ponderar o seu abandono ou continuidade.
Tem ele o perfil ideal para ser treinador do Sporting? Mas é também nesse episódio que nasce um ponto muito importante em seu favor: foi ele o cimento que ajudou a manter de pé o que restava da época.
O que teria acontecido se a seguir ao jogo de Madrid o Sporting se tivesse apresentado, como era desejo do seu presidente, com a sua equipa B? Ninguém sabe exactamente mas mesmo que vagamente se intui que a final da Taça de Portugal seria apenas uma miragem e o segundo lugar agora ao alcance numa perspectiva opitimismo não passaria de uma luta denodada para se manter no pódio.
Daí à conclusão inevitável vai um passo: a discussão sobre as qualidades de Jorge Jesus e a adequação do seu perfil é comprovadamente válida. Mas não pode ser isolada de outra, talvez ainda mais pertinente: o Sporting, como organização, reúne no seu seio as condições indispensáveis para interromper o ciclo vicioso que se arrasta sem títulos?
No que a Jesus diz respeito estou certo que no dia em que ele se tenha que preocupar exclusivamente com o treino e com o plantel à sua disposição ele estará mais perto de cumprir o sonho de seu pai, o seu e o dos associados do Sporting CP: voltar a ser campeão.