Vitor Vieira. “Seria uma honra vestir a camisa da seleção islandesa”
Há 20 anos, o Mundial da FIFA era uma realidade impossível para a modesta seleção islandesa que ficaria apenas com o modesto 5º lugar em seu respectivo grupo eliminatório europeu e o jovem meio-campista brasileiro Vitor Vieira Thomas, de 19 anos, ainda sequer sonhava que no futuro triunfaria nas terras do gelo. Mas quis o destino que este garoto de Porto Alegre, seguisse para a Islândia com toda a família em 2007 e nesta mesma época daria início a uma trajetória futebolística inigualável com o Knattspyrnufélag Fjallabyggðar.
Clube que levaria Vitor para o tradicional Valur, da capital Reykjavík, por qual agora alinha e onde é o único brasileiro, por enquanto, até um possível chamado dos Nossos Garotos que tentarão neste dia um grande resultado sobre os Croatas.
O Fair Play traz nesta manhã uma grande entrevista com o único brasileiro a atuar na primeira divisão do futebol islandês:
Começo por perguntar sobre o que fez de um menino de Porto Alegre ir para a Islândia e quais os motivos para tornar-se um futebolista, dentro de uma nação que historicamente possui também outros grandes esportes?
VV. Eu me mudei do Brasil para a Islândia com 8 anos de idade, o maior motivo foi que o meu pai conseguiu um emprego aqui na sua profissão como músico e daí a gente se mudou com toda a nossa família. Não sei se tem uma razão por certo mesmo para o futebol, mas desde criança sempre fui apaixonado. Jogava bola no apartamento. na rua lá no Brasil com meu pai, daí então comecei a jogar desde a nossa mudança.
Além do futebol, atualmente você estuda na Islândia ou planeja conciliar isso com o desporto no futuro?
VV. Sim, eu jogo futebol e estava estudando no ensino médio, porque aqui temos dez séries e depois mais três anos de ensino médio. Eu estava no terceiro ano, no último semestre e acabei de me formar agora em Maio. Em agosto vou iniciar minha faculdade. Apesar de eu não saber ainda o que irei cursar (risos).
No Brasil você chegou a atuar em algum clube? O que recordas ainda dessa passagem?
VV. Sim, eu atuei no Esporte Clube São José quando eu era pequeno, por volta dos meus seis anos até os oito anos eu treinei com o clube no futebol de salão. Tenho poucas lembranças, era muito pequeno, mas foi uma boa experiência em futebol de salão e também em 2015 quando estive de férias no Brasil, eu joguei um pouco novamente no São José.
Como é a sua vida hoje na Islândia, um país incrível e ainda com tradições/culturas tão diferentes da nossa?
VV. Minha vida hoje é muito boa aqui na Islândia, quanto ao idioma, alimentação. estou bem adaptado. Não preciso me preocupar com questões de segurança, porque aqui temos e dá para jogar futebol, estudar e viver bem.
O que dizer sobre a estrutura que se tem hoje nos clubes islandeses?
VV. As estruturas (que passam pelo centro de treinamento, formação e qualidade de jogo) realmente estão melhorando a cada dia mais por aqui na Islândia. A maioria dos clubes islandeses agora está com uma visão diferente e inserindo o gramado sintético em seus estádios, o que facilita para o treinamento e nossas partidas no inverno.
Seus primeiros anos no futebol islandês foram no quarto escalão nacional, com a camisola do KF Fjallabyggd. Como foi essa primeira experiência para você? Qual o nível da competição e a realidade destes futebolistas nesta divisão nacional (todos são profissionais ou possuem outras profissões)?
VV. O KF é o time da minha antiga cidade onde eu morava e quando eu cheguei à Islândia fui treinar com este clube. Naquela época a equipe estava na segunda divisão e com o passar dos anos infelizmente foi sofrendo consecutivos rebaixamentos. Mas como é um clube acolhedor e local, todo mundo treina por lá e não fazem muita questão de trocar sempre de jogadores, pois possuem muitos jovens. Foi uma experiência muito boa, por lá comecei a jogar contra adultos nos profissionais quando tinha 15 anos e neste mesmo período fiz o meu primeiro gol. No nível de competição até que é realmente boa, apesar do nível baixo (divisão) da liga, os atletas são muito físicos e intensos. Porém, de vez em quando na quarta liga falta qualidade técnica e eles compensam isso na força. Não, por lá quase todo mundo é profissional, somente quando a competição está de férias alguns companheiros trabalham e praticam o futebol ao mesmo tempo.
O que você espera nessa nova jornada como um meio-campista agora na primeira divisão da Islândia?
VV. Meu novo time é o tradicional Valur, da capital Reykjavik, eles foram campeões da liga na temporada passada e nos três últimos anos conquistaram duas edições da Copa da Islândia (2015-2016). Esse ano estava jogando com o sub-19 e irei agora jogar com o profissional do Valur na Pepsi Deildin (1ª divisão). Vou esperar pelas chances, o grupo é grande e forte com 25/26 atletas no clube, e essa será a minha jornada na temporada.
Você imaginava ser notado na quarta divisão e chegar tão rapidamente a esse grande clube islandês (por onde nasceu o atacante multicampeão Eidur Gudjohnsen)?
VV. Não, está sendo maravilhoso subir de uma equipe da quarta para a primeira divisão. Este é um passo bem grande e fico muito feliz em poder fazê-lo. Ano passado eu até pensava que podia subir, pois o nosso atual treinador do sub-19, foi meu comandante no KF na quarta divisão. Ele foi muito importante, porque já me conhecia e me convidou para treinar com os jovens do Valur. Então eu fui, me destaquei e ganhei a chance de chegar aos profissionais e estamos indo bem agora. Realmente é incrível essa oportunidade para eu poder continuar crescendo como jogador aqui na Islândia.
Como é a preparação física neste ambiente climático tão árduo?
VV. A nossa preparação e o desempenho estão ótimos no campeonato. Eu estou treinando com o Valur desde o mês de janeiro. Realmente é muito frio. Então a gente tem que se aquecer bem e sempre quando está com uma temperatura muito negativa aí dificulta, a perna fica pesada e muito difícil para respirar. Eu sempre gosto de atuar mais no inverno do que no verão. Pois quando está em 0°/2°C é um clima agradável e é sempre bem diferente de jogar com o calor forte no qual também cansamos bastante.
Atualmente a relação do torcedor islandês diante da seleção islandesa é uma das melhores do mundo. Mas como o povo local vive o futebol nacional e existe alguma pressão comparável com a vivenciada no seu país natal?
VV. O torcedor islandês é extremamente fanático pelo Strakarnir Okkar (nossos garotos), como é conhecida a seleção islandesa, eles amam os jogadores e acompanham o desempenho daqueles que jogam em outras ligas. No futebol islandês e nos clubes que estão na primeira divisão, os apoios dos torcedores das cidades são fortes. Óbvio que tem uma pressão, não aquela pressão imensa, mas os torcedores aqui não brigam como no futebol brasileiro.
Você vive sozinho na capital Reykjavík e já tem total domínio para os fazeres?
VV. Estou morando junto com um amigo da mesma idade (nascidos em 1999) que é futebolista e também está aqui no Valur comigo. Mudamos de Ólafsfjörður para cá, estamos alugando um apartamento e vamos aos treinamentos juntos todos os dias. Então quando a gente está em casa temos que cozinhar sozinhos, lavar roupas e limpar a casa. No início foi bem difícil, principalmente na alimentação, mas agora estamos acostumados e as tarefas estão sob controle em Reykjavík.
Como está sendo a adaptação e como é a nova estrutura da equipe do Valur?
VV. A adaptação está sendo muito boa, fui muito bem recebido e a estrutura aqui é maravilhosa. Tem academia no clube, fisioterapeuta e tudo aquilo que precisamos na mesma hora. Já me tornei amigos dos guris do sub-19, dos profissionais, então isso ajuda bastante também na adaptação e no relacionamento com as pessoas do clube.
Qual a expectativa para o início do campeonato e você já se projeta disputando uma UEFA Champions League?
VV. A expectativa e a meta do profissional e do Sub-19 é ser campeão em todas competições para chegar longe. Seria um sonho jogar na UEFA Champions League, um competição que todo mundo acompanha, agora em junho vamos disputar a fase de qualificação. Então se Deus quiser a gente pode chegar lá, mas sabemos que é difícil porque temos que jogar quatro ou mais mata-matas até a fase de grupos.
É impossível não tocar nesse assunto, já que a seleção da Islândia vive o seu melhor momento da história e está participando pela primeira vez da Copa do Mundo. Você pensa, sonha e aceitaria um convite para jogar pela seleção islandesa no futuro?
VV. Sim, a nossa seleção islandesa está vivendo a sua maior etapa na história indo para o Europeu de Futebol 2016 e essa participação na Copa do Mundo da Rússia. O objetivo era quem sabe ficar com o 1° lugar no grupo. Quanto ao convite, Se eu ganhasse certamente aceitaria. Até porque seleção está indo muito bem com um grupo muito unido, então seria uma honra vestir a camisa da seleção islandesa.
Como você ver a seleção islandesa para essa Copa do Mundo?
VV. O grupo da seleção islandesa está bem difícil, a Islândia jogou com a Croácia muitas vezes nos últimos quatro anos, então acredito que este é um confronto que podemos ganhar para fazer história. Com a Nigéria foi um jogo difícil, assim como no confronto com a Argentina. Foram jogos diferentes dos feitos no futebol europeu.
Mesmo distante você acompanha e se imagina jogando no futebol brasileiro?
VV. Sim, eu acompanho o SC Internacional, de Porto Alegre, sou torcedor colorado e quando estou no Brasil vou em todos os jogos do clube. É difícil pensar agora em voltar ao Brasil depois de tantos anos aqui na Islândia. Mas imaginando jogar no Inter ou no Brasil, seria uma realização de criança.
Quais são os seus planos para o futuro e qual liga do futebol europeu que pensas em chegar um dia?
VV. Penso que continuar a evoluir aqui e jogar em alto nível. Eu acompanho muito e talvez chegar à Premier League que é uma competição na qual o pessoal daqui também é apaixonado pelos clubes (onde estão a maioria dos grandes jogadores islandeses).
Qual a tua mensagem final para os nossos leitores portugueses aos torcedores do Valur?
VV. Sim, para que os leitores possam acompanhar mais a liga islandesa neste ano e para os torcedores que vamos em busca de todos os títulos. Além do avanço na rodada de qualificação da UEFA Champions League, trabalharemos para irmos o mais longe nacionalmente e também até a fase grupos. Um abraço.