Pedro Aguilar Monteiro. “O que nos interessa é sustentabilidade”

Helena AmorimAbril 27, 20258min0

Pedro Aguilar Monteiro. “O que nos interessa é sustentabilidade”

Helena AmorimAbril 27, 20258min0
Helena Amorim esteve com Pedro Aguilar Monteiro para ouvir as ideias e objectivos do presidente do Braga Rugby em entrevista para o Fair Play

Depois de uma primeira entrevista realizada por Francisco Isaac em 2018, Helena Amorim volta à carga, numa nova entrevista com Pedro Aguilar Monteiro, presidente do Braga Rugby.

Pedro Aguilar, é engenheiro na área electrotécnica, estando actualmente a desempenhar funções de gestão. Nasceu em 1969 e em 1988 entra na Universidade do Minho, onde, com o irmão, decide constituir uma equipa para jogar rugby. Como nessa altura, encontrou mais 2 ou 3 pessoas que jogavam em Arcos de Valdevez, formou-se um grupo que iria ter como primeiro treinador Carlos Machado, irmão de um dos vice-presidentes do CRAV. Ao fim de 2 ou 3 meses a jogar, num convite para ir até aos Arcos, encontrou uma equipa com 7 anos de vida, ainda a dar os primeiros passos mas por lá foi ficando, tendo sido jogador, treinador (desde 2003, depois da reforma do saudoso Sr. Júlio Faria) e pertencido aos corpos sociais. Saiu em 2008 e desta feita, com mais experiência, avançou para Braga determinado e formou uma Escolinha, que devido ao sucesso que teve, permitiu que em 2010, se avançasse para a constituição de um clube em Braga.

No dia 26 de Novembro, o clube faz 15 anos, com Pedro, ao leme dos acontecimentos.

A entrevista decorreu no Minho Center, num fim de tarde chuvoso e frio, mas a boa disposição e índole de Pedro Aguilar, depressa fizeram esquecer a questão metereológica. Um homem calmo, pausado, que emana conhecimento de rugby em cada poro, “porque sabe Helena, Braga estava sedenta de um clube; havia muita gente a querer praticar e muita vontade”.

“Braga tem gente mas não tem as infraestruturas que há em Arcos de Valdevez, por exemplo, e nesse sentido temos desafios diferentes, mas temos tido capacidade de superar os desafios que têm surgido”.

Não acha que com 40km de distância, a modalidade não merecia uma maior cooperação entre Braga e Arcos?

Nós cedemos muitos jogadores nossos de escalões mais baixos mas não houve um casamento ideal e nós crescendo, passamos a ter mais autonomia e isso acabou por cair por terra.

Sempre fui acarinhado no CRAV e lembro-me muitas vezes das nossas idas de Braga para os Arcos (era o sr. Júlio Faria que nos dava boleia, a mim, ao Priminho e ao Pinóquio). Quando o Sr. Júlio não podia, apanhávamos o autocarro para lá e no regresso, às vezes, esquecíamo-nos de pedir boleia e os mais velhos, faziam ali um “vaquinha” e pagavam o táxi para regressarmos.

Era jogador da primeira linha, certo? (Risos)

Era primordialmente pilar direito mas cheguei a jogar como pilar esquerdo, embora tenha quase quatro centenas de jogos pelo CRAV.

Ainda joguei no Técnico por 8/9 anos, pois tive em Lisboa em trabalho e de facto, joguei mais concretamente 2/3 anos, porque depois só treinava no Técnico e vinha para cima e jogava pelos Arcos.

O Braga tem uma academia. Como é que está estruturada e qual os objectivos da sua criação?

Nós temos uma academia de formação dividida em dois níveis: um nível dos sub-6 aos sub-12 e outro com os sub-14, 16 e 18. A sua formação prendeu-se com a possibilidade de fazer um melhor desenho no que ao ensino do rugby diz respeito  (os diferentes escalões têm características muito próprias), conciliando os ritmos de aprendizagem diferentes, pois no rugby, ninguém fica para trás.

Num universo de cerca de 190 atletas inscritos, pelo menos 50 estão no primeiro nível da academia, o que augura um futuro interessante.

Alguns problemas com que o Braga se depara actualmente?

Todos os escalões treinam à mesma hora, na Caseta, 3 vezes por semana mas temos sempre de gerir com o futebol e futebol americano. Isso tem sido um problema, mas temos de continuar a insistir em ter um espaço de treino próprio e um espaço social dedicado. Precisamos de um espaço social para todos poderem falar sobre rugby e não só e também para podermos desenvolver actividades importantes para a vida do clube. Já várias vezes tentamos junto da Junta de Nogueira, para que houvesse cedência de um espaço.

Outra questão tem a ver com os recursos humanos, sobretudo no que diz respeito a treinadores e dirigentes. Temos sempre dificuldade em arranjar treinadores devidamente formados (nos últimos 5 anos fomos o clube no Norte com mais treinadores formados, mas não tem sido fácil). Temos de garantir continuidade e redundância de recursos humanos e isso é sempre uma batalha.

Devemos tentar repartir o peso por várias costas, para facilitar o levantamento do peso; temos necessidade de ter várias pessoas além do treinador, a acompanhar as equipas; é essencial.

Têm todos os escalões representados no clube?

Feminino já tivemos e agora não temos. Gostávamos de reactivar o que tivemos no passado nesse departamento, mas infelizmente não tem sido possível.

Rugby nacional? O que acha que está bem, mal, o que pode melhorar?

Eu acho que o rugby nacional sofre um bocado de um problema de imagem e que nós não temos conseguido dar a volta.

 Por um lado, colou-se aquela imagem que é um desporto elitista e que nos penaliza mas depois também é um desporto em que não conseguimos ter uma organização/suporte  que a modalidade merece.

O Mundial é sempre uma altura que o balão enche mas rapidamente se esvazia. Acabamos todos por ter responsabilidade, mas os clubes alertam nas assembleias da Federação; distribuem umas bolas aqui e acolá e não se fez mais nada. Em 2007 alguém na televisão, meteu o rugby nos Morangos com Açúcar e muitos miúdos chegaram assim ao rugby. Mas foi uma fortuitidade.

Falta pensamento sobre o que precisa de ser feito.

Por exemplo?

Estas coisas deveriam a ser preparadas desde já para o próximo Mundial. Por exemplo, imagine-se que o boom com o Mundial era tanto, que houvesse uma duplicação de atletas (actualmente temos entre 6 ou 7 mil atletas federados). Que infraestruturas os clubes teriam para aguentar com  isso? Tem de ser tudo pensado e planeado e eu percebo que em muitas coisas as pessoas não estejam a olhar para o médio-longo prazo, mas tem de se fazer um esforço de planear, a pensar no futuro.

Eu conheço um miúdo em Vila Flor, que queria criar um clube de rugby há 4 ou 5 anos atrás e assim continua. Jogou no Cascais e família mudou-se para aí e eu ainda fui lá dar um treino no âmbito da ARN e falei com o vereador mas lá está, era preciso haver alguém que ficasse lá a dar treinos e o que eu digo, é isso, é preciso um pensamento estratégico da Federação para tornar o rugby numa modalidade que não se jogue só (com excepção do Alentejo) num raio de 50 Km da costa, porque tirando Tondela, clubes no interior não há. Há capitais de distrito sem rugby!

Temos de expandir, garantindo uma cobertura geográfica mais equilibrada e temos de  dotar os clubes que existem de infraestruturas logísticas e humanas.

Outra coisa que é incrível, é a nossa comunicação. Nós estamos no Séc. XXI! Nos anos 80 até se compreendia; já fizemos 25 anos de séc. XXI!

 O exemplo que dou a toda a gente, é ter um pai do seu atleta e dizer “Oh Pedro, o meu João, sei que faz aí uns jogos mas já estive a ver na internet e não vejo lá nada”. Se queremos tornar o rugby atrativo, em primeiro lugar, tem que se dar a conhecê-lo, depois, trazer coisas boas. Quando as próprias pessoas, vão à procura de informação e não encontram, isso faz com que as pessoas interiorizem que “isto é um desporto para aqueles, só aqueles é que têm acesso”.

Efectivamente a comunicação é vital! A boa comunicação.

Nos escalões mais jovens, temos na realidade de captar os pais e depois os miúdos, daí que tenhamos que passar uma mensagem digna e clara do que se passa.

Braga séniores masculinos, na divisão de Honra em 2030?

Gostava de estar na divisão de honra mas nestas coisas, temos uma perspectiva de formação. Não contratamos jogadores por princípio porque nós, aquilo que sentimos, é que teríamos talvez uma subida de qualidade da equipa sénior mas talvez estivéssemos a tapar um dos miúdos da formação.

Quando tivermos uma equipa formada em Braga, lá estaremos, mas para ficar por muito tempo! Aquilo que nos interessa é sustentabilidade.

Nota: Entrevistar uma pessoa que fala de rugby, sem pejo nem subterfúgios, olhos nos olhos e com tanta clarividência, é raro mais ainda é possível, e faz-me sentir que o rugby ainda tem muito futuro com pessoas assim ao comando das tropas!

Foto de Destaque de Braga Rugby.


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