Luís Salvado, o Globetrotter Minhoto conta a sua experiência
aventura de vida e de rugby.
Luís Salvado, ex-jogador do CRAV e CDUL, deu-nos uma entrevista em 2018, onde foi apelidado por Francisco Isaac de papa-trofeús, na medida em que detinha um campeonato CN1 (actual Divisão de Honra)e um campeonato CN2, (actual 1ª divisão), sendo abertura na maior parte das ocasiões, podendo também ter sido visto a jogar como defesa e formação.
Os anos passam e de papa-troféus, seguimos Salvado até ao outro lado do Mundo, onde reside e trabalha actualmente: um convertido papa-léguas!
Em fevereiro de 2023, Luís e Júlia Araújo (ex-jogadora do CRAV e Sporting), decidiram embarcar numa aventura e de gestor de operações numa empresa de manutenção de eólicas (com licenciatura em Desporto e Educação Física pelo ISMAI) e de directora de categoria na Worten E-commerce ( licenciatura em Economia pelo ISEG), tornaram-se agora dois felizes agricultores de algodão em Narrabri, província de New South Wales, Austrália.
“Nós vivemos actualmente numa vila chamada Wee-Waa [We-Wó], que fica a 40 minutos de Narrabri, onde trabalhamos numa empresa que detém uma área de cultivo de algodão de 7000ha (nem consigo perceber bem essa dimensão) e apesar de que no âmbito do tipo de visto que temos, termos de trabalhar no sector primário 88 dias, acabamos por gostar e continuar além desse tempo. Estamos no cultivo, na produção do algodão e todos os outros serviços, como colheita e transporte é feito por outros. Eu conduzo tractores com grandes alfaias acopladas e durante 8 a 12 h, estou a olhar para um horizonte que parece que nunca mais acaba.”
“Fascina-me um pouco a dimensão de tudo e por exemplo, a rega do algodão é assim: aquilo é tudo arcaico e não há estruturas de apoio, é só terra e a rega é tudo por gravidade. Eles bombeiam a água de um riacho que passa ali, além de terem furos; alagam canais e nós temos de redireccionar a água por sifonagem pelos vários tubos nas várias galgueiras; o nível daquilo é impressionante com cerca de 1 milhão de litros de água por hectare de plantação (nem sei o que isso é!); são números impressionantes.”
As prioridades de Luís são claras: “antes de ter casa já tinha um clube onde jogar (Narrabri Blue Boars) e no dia em que lá cheguei e depois de 7h de viagem de comboio a partir de Sydney, fui logo treinar, comecei logo a integrar-me. Aquilo é rugby Union e não rugby League, embora o rugby League tenha lá muitíssima tradição”.
“Jogo a formação, porque antes de ter chegado a sénior, foi sempre a minha posição (era mais pequenino, mais franzininho), por isso estou á vontade, além de que era a necessidade do clube naquele momento, porque o “9” deles rompeu os ligamentos logo na primeira semana”. A Júlia ainda jogou pelo Narrabri mas num jogo, logo no início, lesionou as costelas e o fígado e decidiu parar porque podia comprometer o trabalho…ela aliás, já tinha parado de jogar porque numa final ibérica pelo Sporting partiu o maxilar e o nariz e olhou para o futuro e achou que tinha de abrandar. Mas aquilo é muito giro porque no mesmo dia, joga o feminino, a equipa B e a equipa principal, tudo no mesmo estádio contra a mesma equipa; acaba por ser um sábado completo com muito rugby e muita diversão, com o devido churrasco e a devida competição de penalties”.
“New South Wales (NSW) está dividido em sete regiões e nós competimos na região Central Norte. Esta equipa foi campeã da região no ano passado numa pool de oito equipas; a época começa em Abril e acaba em Setembro.”
Aquando desta entrevista, realizada na esplanada do Bar do CRAV, Luís menciona que nesse sábado seguinte (dia 19 de agosto) a sua equipa iria jogar o jogo decisivo para saber se iria às finais ou não. Ia acompanhar de longe mas sentia-se a emoção.
“O nível do jogo nos Blue Boars e nas equipas que competem no NSW é parecido com o nível de uma equipa como o CRAV, joga-se bom rugby, sem dúvida; a diferença diria, é que lá, toda a gente sabe jogar, sabem todos o básico e há mais contacto, mais agressividade”.
Sobre o CRAV e o momento em que saiu, “o Jason é muito experiente e muito bom jogador e a posição ficou muito bem entregue; adorei trabalhar com o Andrew Fenton, o treinador principal, já sabia que ele era um homem com muito conhecimento, com uma parte humana muito forte, sabendo passar a mensagem de uma maneira muito eficaz e conseguindo sempre tirar o melhor dos jogadores. Foi pena não terem conseguido ganhar na ponta final, e tive pena de não ter vivido esses últimos tempos com eles, mas a equipa estava a jogar bem, com um ambiente óptimo e uma boa dinâmica e isso é o mais importante.”
Reavivando o início da vida artística nas artes ovais, “comecei a jogar no CRAV com 5, 6 anos porque a minha mãe jogou umas vezes na universidade e levou-me uma vez aos treinos e eu adorei logo aquilo! Quando me placaram com mais intensidade, aí fiquei rendido!”.
Joguei sempre no CRAV até 2016, onde estive um ano no Cdul, chamado pelo Damien Steele e depois foi o Jack Farrer que tomou conta da posição de treinador onde acabei por jogar menos, porque não entrava no estilo de jogo que ele queria e até porque havia lá jogadores muito melhores que eu”.
Quem acompanhou o trabalho de Luís, sabe que estamos a falar de um atleta fisicamente muito competente e tecnicamente muito dotado, com uma entrega plena e boa leitura tática durante os jogos; com uma carreira tão vasta, era inevitável saber o momento mais impactante em cerca de vinte e três nos de CRAV ao peito e um de CDUL.
Depois de alguns momentos de reflexão, diz-nos que “ eu joguei com aquela casta galáctica de Nuno Neto, Jorge Peixoto, Ricardo Alves e demais e cheguei aos séniores no ano a seguir a eles terem sido campeões em Lisboa e esse período foi muito importante para mim porque sempre, desde miúdo , olhava para eles como os meus ídolos e ter partilhado o campo e balneário com eles foi especial. Houve um jogo, que se calhar, a nível pessoal foi importante para mim, em que jogámos uma meia-final contra a Lousã e eu marquei o chuto de conversão de penalidade, que foi decisivo para passarmos à final frente ao Cascais; eu era novo, devia ter os meus 20 anos, tremia muito mas correu bem!”
Redireccionamos a conversa para o Mundial e em particular a Selecção, Luís diz-nos que “mais que os resultados, um bom desempenho de Portugal seria disputar pelo menos dois jogos, contra Fiji e Geórgia e quiçá ganhar mas principalmente tentar jogar olhos nos olhos com estas duas selecções; os três quartos jogam muito bem, a equipa está a jogar bem e há que seguir com fé. A Austrália também, por exemplo, á partida vai jogar com a equipa C…vamos ver se não se apanham a jeito.”
Depois da participação de Portugal em 2007 e com esta nova participação em 2023, “há que aprender com os erros, canalizar os fundos para onde é preciso: na formação e nos árbitros, é essencial. Há muita necessidade de canalizar o foco para fora de Lisboa, apostar numa colaboração ibérica e noutras colaborações e sinergias.”
Relativamente ao futuro, “a ideia é tentar progredir até á costa, mudar um pouco para experimentar coisas diferentes e um dia mais tarde, o mais provável é regressar a Arcos de Valdevez.”
Esta história mostra o percurso de um atleta em que os valores do rugby são muito importantes dentro do campo mas são bem mais importantes fora dele!