Como o Recorde caiu perante a força da Irlanda
A Irlanda pôs fim ao recorde de 17 jogos da Nova Zelândia, suscitando algumas questões e perguntas sobre como o conseguiram. A qualidade no transporte da bola, a intensidade imposta durante 80 minutos e a melhor execução de processos simples foram alguns dos pormenores da Irlanda de Joe Schmidt.
De um lado estava uma Nova Zelândia, sem derrotas na sua História contra a Irlanda (28 jogos disputados) e que seguia em 17 jogos sem perder; e do outro uma Irlanda à procura da primeira vitória contra os All Blacks em 111 anos e motivada pela memória de Anthony Foley, antigo jogador do Munster (1995-2008), antigo internacional irlandês (1995-2005) e treinador do Munster (2014 até 2016) que a 16 Outubro “partiu”, vitima de um edema pulmonar enquanto dormia.
No final do encontro vitória para a Irlanda por 40-29… os invencíveis All Blacks tinham caído por terra na sua tentativa de atingir outros números no seu recorde de vitórias consecutivas. Como foi possível, à Irlanda (3ª classificada das últimas 6 Nações) vergar a selecção neozelandesa?
Na primeira parte o jogo foi dominado pela Irlanda que sabia que tinha de estar a 100% e garantir todos os “sectores” de jogo para obrigar a Nova Zelândia a errar. Para isso apostou na manutenção da posse de bola que foi de 67% na primeira parte, tendo estado 2/3, desta parte do jogo, no meio-campo adversário. Obrigaram a Nova Zelândia a cometer faltas, onde por duas vezes tiraram partido disso com Johnny Sexton a converter duas penalidades (4’ e 24’), sendo que as restantes faltas foram jogadas para alinhamento e aproveitadas com a formação de mauls, uma das principais armas da Irlanda. Fizeram uso desta situação de jogo inúmeras vezes, tendo conseguido chegar ao primeiro ensaio por Jordi Murphy convertido por Sexton.
O Pack avançado da Irlanda continuava a dominar e aproveitava os bons movimentos das suas linhas atrasadas, que acabavam por quebrar a linha defensiva da Nova Zelândia. Mais uma vez, esse domínio viu-se com novo ensaio de um dos 8 avançados, desta feita por CJ Stander a partir de pick and go. A 7 minutos do término da primeira parte, a Irlanda, de forma inteligente, voltaria a ir à área de validação. Conor Murray explorava o buraco deixado por Aaron Smith à volta do ruck e dilatava a vantagem da Irlanda.
A capacidade do Pack Avançado irlandês
A Nova Zelândia apenas respondeu por duas vezes com um ensaio de George Moala (5’) e uma penalidade de Beauden Barrett (21’), levando para o intervalo o marcador do jogo em 25-8.
Na segunda parte a Nova Zelândia “acordou” e foi obrigada a correr atrás do resultado, mas não correu de feição aos bicampeões mundiais já que a Irlanda se apresentou muito motivada. A selecção de Steve Hansen assumiu o jogo, invertendo os papéis da primeira parte e controlando a posse de bola (64%) e a posse territorial (69%).
Mesmo assim a Irlanda reabriu as “hostilidades” na 2ª parte com um ensaio através de Simon Zebo (48’). Depois veio uma “avalanche” dos All Blacks, que meteram o pé no acelerador e marcaram 3 ensaios convertidos (TJ Perenara 52’, Bem Smith 56’ e Scott Barrett 63’), encurtando a vantagem da Irlanda para 33-29.
Os últimos 15 minutos foram de grande intensidade e nervos para os adeptos de ambas as equipas, que viram a Nova Zelândia acelerar ainda mais o jogo, valendo aos irlandeses a consistência defensiva que vinham impondo desde o início com as figuras principais a serem CJ Stander (14 placagens), Robbie Henshaw (12), Josh Van Der Flier (13) e Jamie Heaslip (10), conseguindo segurar o último esforço da Nova Zelândia.
A 4 minutos do final da partida, após uma má decisão de Julian Savea, a Irlanda aproveitava a formação ordenada a 5 metros da área de ensaio da Nova Zelândia que lhes foi concedida e marcou o último ensaio do jogo, por intermédio de Robbie Henshaw, após uma saída de oito de Jamie Heaslip, garantindo assim a vitória final e histórica da Irlanda.
De notar que ao contrário do habitual a Nova Zelândia perdeu 3 dos alinhamentos com introdução própria, concedeu 12 penalidades e ainda esteve 10 minutos a jogar com 14 jogadores, fruto do amarelo de Joe Moody.
Pode visualizar todo o jogo em: goo.gl/0D6s1Z
Postura errada e pressão consentida alguns dos problemas dos All Blacks
Uma partida marcada pela entrada dos homens de negro em campo algo adormecidos e a deixar os irlandeses dominar a partida por mérito próprio. Nas formações ordenadas ambas as equipas ganharam as próprias introduções, mas nos alinhamentos a história foi diferente, sendo que a Irlanda conquistou 3 dos 15 alinhamentos adversários e perdeu 2 dos 12 alinhamentos com introdução própria. Não sabemos qual é a chave para derrotar os All Blacks, mas parece que uma defesa pressionante sem dar espaço ao ataque, a manutenção da posse de bola, a posse territorial e uma boa e inteligente utilização do jogo ao pé, em conjunto com bons mauls dinâmicos, parecem ser alguns dos ingredientes para o sucesso diante daquela que é a selecção bicampeã do mundo e a número um do ranking mundial.
A Nova Zelândia vai ter oportunidade de seguir para novo jogo frente à Irlanda, desta vez em Dublin no Aviva Stadium. O que se espera dos All Blacks? Melhores mecanismos de defesa (“agressividade” não significa jogar fora das leis), entrar no jogo com a intensidade correcta (a Nova Zelândia acusou alguma lentidão e falta de qualidade na execução de movimentações durante os primeiros 40 minutos) e assumir o favoritismo desde o 1º minuto (os All Blacks permitiram que a Irlanda tivesse direito a mais bola que o suposto). Do outro lado estará uma equipa muito motivada, carregada de confiança e que procura dar seguimento ao excelente jogo das últimas semanas… conseguirá a Irlanda fazer História, mais uma vez? Notem bem o trabalho em redor do ruck, a forma como os centros atacaram o canal de dentro de Beauden Barrett ou a intensidade dada a cada momento de rotura defensiva adversária. Será um encontro de grande interesse e de qualidade.
Artigo da autoria de João Duarte
