2017, ou a natação (portuguesa) no feminino

João BastosSetembro 8, 20177min0

2017, ou a natação (portuguesa) no feminino

João BastosSetembro 8, 20177min0
A época 2016/2017 assistiu à revelação, confirmação e afirmação de muitos nadadores portugueses, com maior evidência no sector feminino

A época 2016/2017 terminou para a natação portuguesa e há razões para considerar que foi uma época positiva, apesar de falhas assinaláveis em momentos chave. O Fair Play faz a retrospectiva do que aconteceu dentro de água, uma retrospectiva que se escreve no feminino


Em 2014 escrevi este artigo que falava sobre a tendência cada vez mais acentuada do domínio feminino na natação, com a afirmação daquela que é, provavelmente, a melhor geração feminina de sempre (se descontarmos os fantásticos e dopados talentos da RDA nos anos 70 e 80).

Nessa altura (em 2014), Sarah Sjöström não tinha nenhuma medalha olímpica no currículo, Katie Ledecky ainda não tinha baixado dos 4 minutos aos 400 metros, Katinka Hosszu ainda não era detentora de nenhum record do mundo em piscina longa e Missy Franklin estava no topo do mundo, depois dos 6 ouros que tinha trazido dos mundiais de Barcelona no ano anterior.

Adivinhava-se que a orfandade a que Phelps tinha dotado o trono de melhor nadador do mundo quando se retirou da natação (na primeira vez )iria terminar às mãos de uma nadadora. Bastava saber qual delas, tamanha a quantidade de qualidade no sector feminino.

Chegados a 2017, o balanço da época 2016/2017 na natação portuguesa pode ser feito estabelecendo paralelismos com a natação internacional em 2014. Apesar de terem sido vários os nadadores masculinos em destaque (serão referidos mais à frente), o resumo pode ser escrito no género feminino.

Começando quase pelo fim, Diana Durães emergiu da principal competição do ano – os Mundiais de Budapeste – como o principal destaque da selecção portuguesa. Da Hungria, a nadadora do Sport Lisboa e Benfica trouxe três novos recordes nacionais, duas classificações entre as 16 melhores do mundo e, acima de tudo, apresentou-se no primeiro ano do novo ciclo olímpico a um nível que permite pensar em Tóquio com objectivos mais ambiciosos do que “apenas” carimbar o passaporte.

Em termos pessoais, a importância do desempenho que teve na Hungria não se fica só pelas marcas e classificações. Depois de nas últimas duas grandes competições internacionais – Europeus de Londres e Mundiais de Windsor – Diana não ter estado no seu melhor nível, os grandes resultados apareceram na altura certa para inibir quaisquer dúvidas que pudessem surgir quanto à sua capacidade de evoluir em grandes palcos internacionais.

Foto: FPN

Mas apesar de ter sido a única nadadora a quebrar recordes nacionais na capital húngara, não foi a que melhor se classificou. Tamila Holub foi o destaque da comitiva portuguesa, em termos de classificação, ao conseguir o terceiro melhor lugar de sempre de um português em mundiais. A nadadora do Sporting Clube de Braga foi a 10ª melhor do mundo nos 1500 metros livres, mesmo nadando mais de 3 segundos acima do seu record pessoal.

Numa prova recentemente promovida ao calendário olímpico, ter batido à porta da final num mundial é um excelente augúrio para a nadadora, que a partir deste ano competirá nos EUA.

Foto: FPN

É costumeiro afirmar-se que a “última imagem é a que fica” e, tendo em conta que a última imagem de Victoria Kaminskaya esta época foram uns Mundiais (e a etapa da Taça do Mundo em Moscovo) que não lhe correram de feição, a última imagem não foi consentânea com a que a nadadora do Estrelas de São João de Brito foi dando ao longo de toda a temporada.

Ninguém em Portugal, este ano, bateu tantos recordes nacionais absolutos em piscina longa como Victoria Kaminskaya. Ao todo foram seis (duas vezes o dos 200 bruços, duas vezes o dos 200 estilos e duas vezes o dos 400 estilos), o que projectou a portuguesa para outro patamar no plano internacional (os seus tempos dos 200 bruços e dos 400 estilos davam classificações nas 16 primeiras no Mundial de Budapeste). Venha agora a próxima oportunidade para que o comprove.

Foto: FPN

Nas restantes provas internacionais da temporada, continuaram a ser as senhoras a dar cartas. Nas Universíadas foi Ana Catarina Monteiro a conseguir a melhor classificação entre os três nadadores presentes (11ª nos 200 mariposa), nos Europeus de Juniores as únicas meias finais foram obtidas por Inês Henriques e Raquel Pereira. Nos Mundiais de Juniores, Portugal só esteve representado com um elemento, e mais uma vez no sector feminino, novamente por Raquel Pereira.

A única excepção no plano internacional foram os Mundiais de Piscina Curta, onde os homens conseguiram maior destaque ao trazer para Portugal três lugares entre os 16 primeiros e três recordes nacionais absolutos.

Também nas competições internas a toada foi a mesma. Nos nacionais de juniores e seniores de piscina curta, a já referida Raquel Pereira foi o maior destaque com 4 provas ganhas, com 4 novos recordes nacionais de juniores. Nesta competição, o único record nacional absoluto que caiu, também foi no sector feminino, da responsabilidade da colega de equipa de Raquel no Sport Algés e Dafundo, Rita Frischknecht.

Nos nacionais de juvenis, juniores e seniores, foram vários os destaques. A melhor competição do ano em Portugal teve grandes momentos “para o menino e para a menina”. Se por um lado assistiu-se ao truelo entre Alexis Santos, Diogo Carvalho e Gabriel Lopes nos 200 estilos, culminado com o record nacional de Alexis, por outro aconteceu um momento memorável na prova dos 200 bruços femininos com Victoria Kaminskaya e Raquel Pereira a nadarem abaixo do anterior record nacional absoluto. Se por um lado Guilherme Pina e Gabriel Lopes estrearam-se na lista de recordistas nacionais absolutos, por outro Ana Rodrigues foi a rainha da velocidade vencendo os 50 metros livres, bruços e mariposa e ainda os 100 metros livres, com direito a record nacional absoluto nos 50 bruços.

Por último, no Open de Portugal, mais uma vez as senhoras a darem melhor conta de si. Nuns campeonatos desfalcados de muitas figuras de primeiro plano (decorreram em simultâneo com os Mundiais de Budapeste e com a Taça Comen), outras figuras se destacaram. O único record nacional absoluto estabelecido foi pela estafeta feminina de 4×200 metros livres do Sport Algés e Dafundo, Ana Rodrigues voltou a destacar-se com o maior número de vitórias no Open (3) e Francisca Mesquita foi a juvenil que mais brilhou, ao subir ao primeiro lugar do pódio por 5 vezes.

Mesmo nos escalões inferiores, as raparigas tiveram em maior plano de destaque do que os rapazes (mas isso ficará para um próximo artigo).

Há três anos escrevi sobre Ledecky, Sjöström e Hosszu, as líderes de uma revolução feminina que estava a acontecer na natação internacional. Em três anos, as três nadadoras confirmaram os prognósticos e são, na actualidade, as três principais referências da modalidade. Mas também houve o exemplo de Franklin que em três anos desceu do céu ao inferno, tentando reencontrar o seu melhor nível desde então.

Por Portugal, vamos esperar que o destino das nossas nadadoras se confirme mais Ledeckiano, Sjöströmico ou Hoszzusico e menos Frankliniano…a avaliar precisamente daqui a três anos.


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