Quando a Imprensa “brinca” aos empresários: o caso Bruno Fernandes

Francisco IsaacJulho 30, 20198min1

Quando a Imprensa “brinca” aos empresários: o caso Bruno Fernandes

Francisco IsaacJulho 30, 20198min1
O melhor jogador da Liga NOS 2018/2019 tem estado nas bocas da Imprensa desde que chegou a Alvalade e nos últimos meses instalou-se o discurso que está "de saída". Estará a imprensa a empurrar Bruno Fernandes para fora de Alvalade?

É factual que actualmente a Imprensa gosta de se imbuir de plenos poderes e decidir o destino de jogador X ou Y, nem que seja para movimentar o clique e aguçar o interesse do leitor numa notícia irrealista mas que “assusta” principalmente os adeptos afectos ao clube desse jogador. No caso dos adeptos do Sporting Clube de Portugal, o “susto” mantém-se lá mas já não tem o mesmo impacto de surpresa, isto quando falamos de Bruno Fernandes.

O espectacular médio dos leões tem sido referência de notícia da imprensa desportiva desde que chegou a Alvalade, mas os últimos 7 meses foram de intensificação de notícias em redor da sua possível/provável/iminente saída, isto de acordo com os mesmos órgãos de comunicação social.

De negócio fechado com o Manchester City por 70M€ com alguns jogadores dispensados envolvidos, uma ida hipotética para o Manchester United por 50M€ ou até uma viagem para Milão onde ficaria a troco de 40M€ e mais uns “pós”, estes foram alguns dos cenários avançados pela imprensa nacional entre Abril e Julho, em boa medida vinda de OJogo que tem lançado todos os dias um mínimo de 1 notícia digital em relação ao internacional português.

Mas o que há de tão especial nesta postura ou na repetição de notícias em relação à saída do internacional português? Poderíamos dizer que a repetição era por si já um problema, revelando uma insistência peculiar ao ponto de repetirem as mesmas questões a Marcel Keizer durante toda a pré-época, moldando-se com qualidades negativas da imprensa sensacionalista, algo que adveio da forma de fazer “jornalismo” do Correio da Manhã (se não os consegues derrotar, junta-te a eles).

O DIA-A-DIA DO SPORTING CP NO VERÃO DE 2019

Mas talvez a maior questão de todas é a ética profissional que fica abandonada e a invenção de notícias constantes no que quase parece ser para simplesmente prejudicar a estabilidade ténue do Sporting Clube de Portugal, lançando dúvidas e tremores aos adeptos de forma constante e, porque não, à própria equipa que é alvo deste tipo de acção.

Vejamos algumas das notícias “fabricadas”, que entretanto uma parte das mesmas caíram no esquecimento por razões pouco inteligíveis:

21 de Abril de 2019: A revista Sábado explica que a SAD verde-e-branca já tem como adquirida a saída de Bruno Fernandes mal abra o período de transferências;
22 de Abril de 2019: A SAD do Sporting CP dá como perdido Bruno Fernandes para a próxima época, sendo um cenário inevitável para o clube e jogador de acordo com o Ojogo;
11 de Maio de 2019: Ojogo noticia na capa da sua versão digital e imprensa a saída de Bruno Fernandes para o Manchester City a troco de 55M€ (negócio fechado);
29 de Maio de 2019: Correio da Manhã notícia que Bruno Fernandes tem a saída alinhavada com o Sporting Clube de Portugal por suposta “conversa” com o empresário do jogador;
2 de Junho de 2019: Sporting CP já tem substituto para Bruno Fernandes, que está a limar detalhes para a saída com clubes ingleses de acordo com OJogo;
20 de Junho de 2019: Empresário de Bruno Fernandes em contacto com o Manchester United e Tottenham de acordo com a Abola;
19 de Julho de 2019: Bruno Fernandes prestes a sair do Sporting CP por 70M€ de acordo com o Ojogo;
21 de Julho de 2019: Ojogo noticia na sua versão online que Bruno Fernandes vai ser reforço do Manchester United (negócio em debate mas quase finalizado);

Edição de 11 de Maio do Jornal OJogo (Foto: OJogo)

Estão aqui oito notícias que saíram nos últimos meses, mas que facilmente poderíamos colocar uma centena de recortes ou links em relação às palavras: Bruno Fernandes e transferência. É uma forma de operar que tem sido normal por parte de alguma imprensa desportiva e no caso de Bruno Fernandes chegou-se ao ponto de atribuir palavras a Frederico Varandas. O presidente do Sporting CP, perante uma questão em relação se o clube leonino estava preparado para uma saída de um jogador respondeu que,

“Estamos sujeitos ao mercado e eu vivo muito bem com ele. Mas os sportinguistas que estejam tranquilos, porque se porventura sair alguém, virá alguém com qualidade para o seu lugar”.

Pouco depois, no lançamento da notícia os jornais tomaram a lide de dizer que “Frederico Varandas promete substituto à altura de Bruno Fernandes”, evocando o nome do jogador quando este não foi sequer proferido pelo presidente dos leões. São apenas presunções e suspeições, mas tanto um conceito como o outro não podem coexistir numa notícia quando é para distorcer palavras e discursos, empurrando na direcção que o Jornal X ou Y desejam (fica aqui um exemplo dessa notícia).

Mais, Marcel Keizer, que levou o Sporting CP fazer a sua melhor época nos últimos 10 anos com a conquista de dois títulos na mesma temporada, tem sido questionado todas as semanas sobre o tema Bruno Fernandes, repetindo-se as perguntas com a mesma fórmula ou com algumas derivações, invés de se discutir constantemente o tema futebol.

Notem, que aqui não se coloca em causa o valor do jogador e de merecer uma saída por um valor avultado, pois perante a qualidade que espelhou nas suas exibições pelo Sporting CP não há dúvidas que merece ir para outro patamar. Nem se põe em dúvida que pode sair até ao fecho de mercado de Verão de 2019, uma vez que nos dias que correm é fácil para um dos maiores emblemas das Big-5 desembolsar 50 milhões de euros e adquirir um jogador de alto calibre das ligas periféricas.

Mas o que se contesta aqui é a forma como alguma da imprensa desportiva portuguesa vem a tentar desmontar consecutivamente a estabilidade, equilíbrio e “paz” de um designado clube (curiosamente, o SL Benfica não foi “atacado” desta forma nem o FC Porto, quando tinham alvos também apetecíveis para vários emblemas internacionais caso de Rúben Dias ou Alex Telles), apostando em confirmar negócios que talvez nunca foram realmente discutidos entre direcções.

A IMPRENSA CAIU OU DEIXOU-SE CAIR NAS NOTÍCIAS FÁCEIS?

As Media Wars dos últimos 30 anos chegaram a Portugal há mais de duas décadas e a imprensa desportiva foi, talvez, a primeira a alinhar no “esquema” de construir notícias falaciosas e falsas, sem depois ter o discernimento e a capacidade de fazer um pedido de desculpas, defendendo-se nas fontes. Ironicamente, algumas destas fontes não existem ou são contas de Twitter ou Instagram sem profundidade, como já se viu em alguns momentos (a suposta vinda de Taíson para o Sporting CP em Janeiro de 2018), o que prova a falta de trabalho na procura da veracidade e validade das notícias, preocupando-se só em “publicar”, “publicar” e “publicar” e esperar pelo clique fácil.

A isenção dos jornais desportivos e da imprensa desportiva nacional está cada vez mais em xeque, tanto devido ao teor das notícias, à procura de um clima de conflito e de construção de artigos sem uma argumentação inabalável. Só no Jornal Ojogo, foram mais de 100 entradas sobre Bruno Fernandes nos últimos dois meses, com algumas capas de jornal (seja em primeira notícia ou como nota-de-rodapé), duplicando este número quando somamos a Abola, Record, para além da imprensa generalista como o Observador, SIC, TVI, Sapo ou a sensacionalista como o Correio da Manhã.

O futebol atingiu nos tempos modernos um patamar de loucura desenfreada na forma de viver e a imprensa tem tido problemas em se adaptar a esta realidade, entrando numa roda-viva autêntica quando se fala de Mercado de Transferências. Tomar rumores como certezas, escolher as notícias a passar (porque é que não se fala o que vem sendo reportado em Espanha ou Itália da hipotética saída de Alex Telles por exemplo?), silenciar outros pontos de informação e a criação de fontes são alguns dos elementos do modus operandi da imprensa desportiva nacional.

A febre dos empresários e agentes não está portanto resumida a estes e a forma como a imprensa desportiva se mexe, é demonstrativo que há uma vontade de entrar nesse jogo, montando notícias com valores de transferência, etiquetando jogadores com uma panóplia de qualidades e valor de mercado, aferindo quem pode estar realmente interessado, tomando isto tudo como certezas. Porém, não terá o leitor culpa de incentivar esta falange de notícias quando clica no link por simples curiosidade? Ou a responsabilidade é inerente só ao órgão de comunicação social?

Bruno Fernandes até pode estar de saída para o United ainda antes do final de Julho, mas em Abril do mesmo ano foi dado como certeza que o “maestro” tinha contrato alinhavado e transferência fechada com o Manchester City, Tottenham, Chelsea, etc, ficando a dúvida do profissionalismo e seriedade de quem trabalha na área.

De saída desde que chegou? (Foto: Lusa)

One comment

  • António Silva Ferreira

    Agosto 1, 2019 at 11:24 am

    Análise interessante, enquadrada e, quanto mais não seja por isso, merece ser elogiada. Isto sim, é jornalismo. Penso, contudo, que faltou abordar, ainda que fosse ao de leve, o porquê de a realidade apontada ter, normalmente, como alvo só o Sporting Clube de Portugal.

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