O mistério do futebol alentejano

Guilherme CatarinoJulho 15, 20204min0

O mistério do futebol alentejano

Guilherme CatarinoJulho 15, 20204min0
Açores, Madeira, Algarve, Porto, Minho, Lisboa, são regiões que estão representadas na Primeira e Segunda liga de futebol em Portugal, mas não o Alentejo. Uma reflexão sobre o futebol alentejano e o seu futuro

Desafiado a comentar sobre esta temática num passado recente, questionei-me, primeiramente, sobre o porquê de tão poucos entes público-desportivos a debaterem no seio nacional. Como parte integrante (e relevante!) do nosso país, a região do Alentejo aparente ser, por vezes, esquecida aquando dos debates futebolísticos públicos.

Enquadre-se neste “esquecimento”, naturalmente, os grandes canais de comunicação social portuguesa que transportam uma das maiores fatias deste bolo que alimenta a informação dos portugueses. Felizmente tenho a oportunidade de elaborar e ler publicações das mais diversas índoles, num site fielmente comprometido com a região alentejana – Tribuna Alentejo, a quem deixo desde já um agradecimento especial – e foi essencialmente desde aí que percebi a beleza e importância que o interior traz a esta nação.

Apesar desta importante menção, o nosso foco hoje deverá ser total na premissa que dá título ao texto. Desde a presença do histórico Campomaiorense – que desde o ano de 2013 nem apresenta equipa de seniores… – que os palcos profissionais não vestem as peles alentejanas e as equipas da região do centro-sul de Portugal apenas se espalham por campos amadores por esse Portugal fora.

O histórico Lusitano de Évora, por outro lado, como representante do Alentejo com mais presenças na principal liga portuguesa – 14 entre os anos de 1952 e 1966 -, está atualmente no modesto campeonato distrital da Associação de Futebol de Évora, onde habita igualmente o vizinho Juventude de Évora. Mas por que razões tal acontece? Poderemos tentar enunciar algumas, a partir das raízes do problema em si, numa especial perspetiva de lhe encontrar soluções.

Em primeiro lugar podemos apontar um caso específico nacional, abordado nomeadamente no Diário de Notícias, que se estende muito para além do desporto e que se prende com a deslocação dos jovens (universitários) para os centros urbanos mais populosos.

Com as mais conceituadas universidades nacionais a situarem-se nas principais metrópoles do país, inúmeros jovens veem a necessidade de largar as academias dos clubes onde nasceram e foram criados, para perseguir o mundo académico que, como todos sabemos, apresenta probabilidades de sucesso muito maiores do que o sonho do futebol que, porém, ainda é almejado por muitos. Com esta transição, muitos clubes alentejanos perdem os seus principais talentos futuros, e são obrigados a sobreviver à base de jogadores estrangeiros e (os poucos) jovens que se mantêm nos clubes.

O investimento público a estes clubes poderia facilitar em muito a manutenção de certos valores (e principalmente jogadores), mas o maior fator que facilitaria tal processo – eventuais receitas televisivas – pouco ou nada se faz valer, perante o escalão onde se inserem estes clubes. Tal se confirma aliás, para termos um termo de comparação, na Primeira Liga portuguesa, onde a discrepância de receitas entre os denominados “3 grandes” e os restantes clubes é evidente e factual.

Numa outra perspectiva, importa destacar a progressiva desertificação/despovoamento do Portugal interior como outras das causas marcantes da falta de qualidade atual no futebol alentejano. Num recente inquérito, elaborado a pedido da Direção-Geral dos Recursos florestais, as áreas de Trás-os-Montes, com 23,9%, e Alentejo, com 19,1% foram votadas como as regiões “potencialmente mais afetadas” pelo fenómeno supra referido, a curto médio prazo. E refira-se ainda que a maioria dos votantes foram habitantes do interior do país, facto este que não deixa de ser curioso perante a realidade em questão… Apesar da manutenção dos clubes dos seus maiores “ativos”, o futebol é ainda hoje em dia uma realidade com ínfimas hipóteses de sucesso para a maioria dos jovens que almejam maiores palcos. O mesmo se dirá não apenas dos jovens, mas igualmente de adultos – homens e mulheres – que buscam melhores vidas no estrangeiro ou nas grandes metrópoles deste país.

Almejámos com esta exposição um objetivo específico e realçado ao longo do texto: tentar perceber o porquê do desaparecimento do mapa dos clubes alentejanos que, anteriormente marcavam presença regular na maior Liga do futebol nacional.

Abordámos duas questões importantes que acabam por se bifurcar numa só – o progressivo decréscimo populacional – e que, na sua essência, comportam prejuízos notórios a nível desportivo, social e até económico na região do Alentejo. Apesar de conectado intrinsecamente com o futebol na sua essência, o despovoamento no interior é um tema sério e preocupante, agora e nas gerações futuras.


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