O Paradigma da Violência no Futebol em Portugal

João NegreiraMaio 4, 20194min0
Artigo de opinião sobre um dos maiores cancros do futebol português: a violência. Para além de comentarmos, é altura de perceber porque os casos continuam a aparecer e cada vez com mais frequência.

Apesar de já muito se ter escrito sobre este tema, decidimos ir um pouco mais além e para além de refletirmos sobre os vários casos, iremos também tentar perceber porque é que quem está no poder, nada faz para anular esta tendência.

É necessário falar sobre este tema. Sem tabus. Apontar o dedo aos culpados. Virar o paradigma. Viver em paz. Viver o futebol.

Um problema de cultura

A violência no futebol tem-se propagado por todo o país, dos mais novos aos mais velhos. Os números envergonham-nos. Desde a temporada 2016/2017 até ao final do mês de fevereiro do corrente, a Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol registou 118 agressões a árbitros de futebol e futsal.

É importante referir que o presidente da APAF, em entrevista à SAPO Desporto, afirmou que a esmagadora maioria dos casos de violência acontecem nos campeonatos distritais e que mais de metade acontecem nas camadas jovens.

E isto será talvez o que mais preocupa. Que os jovens sejam os grandes obreiros de toda esta violência. Mas é necessário termos a consciência de que esses jovens estão a receber um mau exemplo dos profissionais séniores e dos próprios pais.

Os pais são os que o pior exemplo, dão. Tanto nas bancadas, com insultos aos árbitros, aos adversários e, por vezes, ao próprio treinador, como em casa, quando se preocupam apenas com o resultado do jogo, em vez do crescimento do filho.

Avançamos ainda para outro nível quando pais se agridem entre si. Pensa-se que não, mas ao normalizarmos estas situações ou ao tentarmos esquecê-las, perpetuamo-las e fazemos com que as crianças achem que isso é normal.

Há também que falar daquilo que vêm dos jogadores profissionais, que apesar de não serem a maioria, também têm peso. Estão em casa, a ver um jogo de futebol e tudo aquilo que os seus ídolos fazem, eles também vão fazer no seu jogo.

Por outro lado, alguns afirmam que o problema está na competitividade. Que estamos a formar mal os atletas. Incutimos-lhes demasiada competitividade. Uma sede de vencer exagerada desde muito cedo. É, definitivamente, um dos grandes problemas da formação em Portugal.

Estamos a ensinar os jogadores a gostar de ganhar e não a gostar de jogar futebol.

Mas como explicar todas estas situações? Como é que casos de violência passaram de serem pontuais, para serem normais? Está claro que existe um grande problema de cultura futebolística e de ética.

Desde o nascimento de Cristiano Ronaldo para o futebol, que todos os pais querem que os seus filhos sejam os próximos CR7’s. E isso deixa-os cegos, olhando apenas para dentro e mesmo assim, sendo alguém nocivo para o crescimento do filho.

A competitividade, que já foi referida, também é danosa para todos, já que não olham a meios para atingir os fins.

E ainda, o saber estar, que vem com a educação. Os pais que não sabem estar, passam esse exemplo para os filhos que passam a também não saber estar. Nem no futebol, nem na vida.

Imagem da agressão de um jogador (sub-19) do FC Porto a um oficial da GNR. (Foto: SAPO Desporto)

Como resolver?

Não somos nós que temos que trazer as respostas. São as autoridades responsáveis pelo desporto. O Secretário de Estado do Desporto, nomeou Rodrigo Cavaleiro, em novembro do ano passado, para criar a Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no Desporto que – diga-se de passagem – ainda não fez nada.

O próprio Secretário de Estado também nada tem feito para que a Assembleia da República acelere a mudança de lei, quanto mais vir a público para dar o exemplo que não podemos permitir que estes casos de violência continuem.

O Instituto Português do Desporto e da Juventude, tem vindo a querer alertar para os riscos, tentando mudar mentalidades, mas não chega para quem tem tanto poder no mundo do futebol.

É com a morosidade dos processos e a fraca punição que normalizamos estas situações e que deixamos a ideia de que estes comportamentos não têm consequências.

É com o mau exemplo das bancadas que damos a entender aos mais jovens que eles também podem – e devem – fazer isso.

É necessário cortar o mal pela raiz. É necessário mudar mentalidades. É necessário que quem manda, seja a cara da mudança. Para isso não podemos permitir que estes casos de violência continuem.

Que se punam os culpados! Que se acabe com a violência no desporto, em Portugal!


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