Stranger Rules: Roger Neilson e como explorar um regulamento

Rui MesquitaMaio 10, 20204min0

Stranger Rules: Roger Neilson e como explorar um regulamento

Rui MesquitaMaio 10, 20204min0
Roger Neilson é uma espécie de mestre para esta rubrica. Um treinador que explorava o livro de regras da NHL como ninguém. Descobre a sua história e as suas regras aqui!

Esta rubrica está cheia de exemplos de atletas e treinadores que se aproveitaram de buracos nas regras do seu desporto. Há quem procure ativamente por esses buracos para explorar e hoje falamos de um desses casos. O protagonista desta história chama-se Roger Neilson e foi treinador na NHL durante 35 anos. Durante esse tempo treinou 8 equipas diferentes e levou à mudança de 3 regras na liga.

Perder tempo sem quebrar as regras

A primeira regra que Neilson aproveitou era uma limitação nos árbitros do hóquei no gelo. Por mais infrações que uma equipa cometesse, os árbitros não podiam penalizar uma equipa que estivesse apenas com 3 jogadores em campo. Sabendo isto, o treinador aproveitou muito bem a situação.

Com uma vantagem no marcador e apenas 3 jogadores em campo, Neilson fazia entrar um jogador a mais a cada 10 segundos. Isto levava a que os árbitros parassem o jogo e tivessem de o recomeçar. Fazendo isto até ao final do jogo, Neilson ganhou a partida. No mesmo jogo, o treinador aproveitou a mesma regra para que o jogo fosse parado quando adeptos atiravam objetos para o gelo. Tudo isto sem uma única penalização.

A NHL percebeu que Neilson tinha encontrado um buraco nas regras e apressou-se a mudar isso. A partir daí, quando uma equipa reduzida a 3 elementos cometer uma infração, é punida com um penalti. Isto acabou com a estratégia vencedora de Neilson, mas o treinador ainda tinha algumas cartas na manga.

Roger Neilson, o protagonista deste artigo (Foto: Hockey Sumo)

Penalti? Não há problema

Se a sua estratégia agora levava a penaltis contra si, Neilson focou-se nesses mesmos penaltis para explorar outro buraco. Nenhuma regra dizia que os penaltis tinham de ser defendidos por um guarda-redes. E nenhuma regra dizia que quem defendia os penaltis tinha de ficar junto da baliza.

Pegando nestas duas ausências de regra, Neilson colocava defesas a defender os penaltis e mandava-vos correr para o atacante. O defesa ou tirava o disco do atacante ou diminuía muito o seu ângulo de remate. Isto diminuía muito a probabilidade de sucesso de um penalti e, mais uma vez, tudo dentro das regras.

Mais uma vez a NHL foi rápida a agir para limitar as ideias brilhantes de Neilson, colocando as duas limitações que não existiam. A partir daí, apenas guarda-redes podiam defender penaltis e estes têm de ficar na linha de baliza até o atacante tocar pela primeira vez no disco.

Nesta altura, Neilson já era famoso pela sua capacidade de dobrar as regras. O público olhava para ele como um inventor e esperavam pela próxima invenção. A NHL certamente via os seus jogos com apreensão, pronta a mudar mais uma das suas regras.

“Deixa o taco para trás, ou um monte de gelo”

Tal como noutros desportos, também na NHL é possível os treinadores tirarem o guarda-redes para meter mais um jogador avançado. Isto é normalmente feito para tentar recuperar de uma desvantagem, mas deixa a baliza desprotegida. Se o adversário recuperar o disco é só apontar à baliza deserta.

Neilson decidiu fazer algo quanto a esta última parte. O treinador disse ao seu guarda-redes para, quando saísse do campo para entrar um atacante, deixasse o seu taco em cima da linha de golo, obstruindo a entrada de um disco vindo naquela direção.

Uma das mentes mais brilhantes do hóquei no gelo (Foto: HHOF.com)

Nenhuma regra proibia um jogador de fazer isto. Apenas ninguém se tinha lembrado de tal coisa. Tal como nas outras duas regras, Neilson foi inovador e encontrou mais um buraco nas regras da NHL. Mais uma vez, a liga interveio e criou uma regra para evitar isto.

A liga instituiu que se um disco embater em qualquer objeto (ou mesmo amontoado de gelo) deixado em frente à baliza o golo deve ser contado. Isto acabou, pela terceira vez, com as ideias de Neilson.

O fim de uma era e um Hall da Fama

Este foi o último grande buraco que o treinador explorou e, depois de tantos anos na NHL e tantas invenções que fizeram a liga melhorar, Roger Neilson entrou no Hall da Fama da NHL como “builder” (construtor). Uma distinção mais que merecida para um treinador tão inovador e decisivo para o futuro da NHL.

Neilson foi diagnosticado com um cancro em 1999 e acabou por falecer em 2003. Antes disso, voltou a treinar alguns jogos como treinador principal enquanto era treinador assistente. Isso para conseguir aos 1000 jogos como treinador na NHL. Uma carreira incrível de um treinador inteligente e com um conhecimento profundo sobre o jogo.


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