730 dias depois… Portugal ainda é Campeão Europeu – o que foi e o que é

Francisco IsaacJulho 10, 20189min0
A lesão de Cristiano Ronaldo, o golo de Éder, Fernando Santos a negar-se aos festejos antes do tempo... recordações de como Portugal ainda é Campeão Europeu. Qual a tua melhor memória?

Um momento que fica para a memória, um momento que pareceu durar uma eternidade mas que na realidade só “aguentou” um ou dois segundos no máximo. Éder dispara, o público quer interrogar mas não dá… é golo. Um golo que arranca uma pressão imensa dos ombros, pernas, peito e cabeça dos portugueses, depois de 109 minutos de um sofrimento incalculável.

Já sabemos, ouvimos e re-ouvimos, que Éder era aquele patinho feio gozado pela maioria do público, ridicularizado pela sua tentativa de jogar futebol e por não ser uma opção credível para a Selecção Nacional. Também já vimos um milhar de vezes a foto e vídeos de Cristiano Ronaldo a sair lesionado, em sofrimento, com uma borboleta a tocar-lhe no rosto que deu para algumas pessoas poetizarem de uma forma estranha.

Os momentos vividos naquele Europeu foram vários, as críticas foram imensas pela forma como Portugal se apresentou em campo, sempre mais à defesa, apostando forte num contra-ataque meio “torto” que tentava fazer jus ao que a Itália, nos seus anos de ouro, fez aos seus adversários.

Derrotaram a Croácia (a mesma que está nas meias-finais do Mundial em 2018), anularam com o País de Gales por completo (falavam do fantástico Gareth Bale, mas afinal nem três remates conseguiram fazer), sofreram (sofremos…) com a Polónia (Renato Sanches pode ter feito uma final e meia-final a nível medíocre, mas foi quem desbloqueou o jogo contra Robert Lewandowski e companhia) e lá se chegou à final.

Naquele jogo Pogba, Griezmann, Payet (ainda hoje é relembrado como o saboteur, que arrancou CR7 do jogo com uma entrada complicada), Lloris, Martial ou Evra (duvidamos que tenha dito no final I love this game!) só tinham de ganhar em frente do seu público. E Portugal? Era quase a mesma exigência, já que milhares de adeptos portugueses suspiravam por a redenção de 2004.

Isso foi um dos apontamentos mais irritantes do Euro 2016, o facto de toda a publicidade centrar-se na frase “Somos 11 milhões!”, quando os adeptos portugueses eram muito mais que esse número. Então e aqueles que nasceram fora de Portugal e usam a bandeira do Vermelho e Verde com as Quinas ao centro com um orgulho fantástico? Os que emigraram para fora e mudaram de residência à procura de um Mundo melhor? Não contam todos estes?

Os portugueses são muito mais que os 11 milhões que vivem dentro de “casa”, são aqueles todos que relembram os grandes nomes da História do futebol português, gritando bem alto pelos actuais. Ao fim de 2 anos esquecemos-nos daquele constante apoio dado pelos luso-descendentes no centro de estágios de Domaine de Bellejame, perto de Maroussis que deu uma motivação extra aos jogadores com toda a certeza.

Mas isso é o fado dos portugueses, menosprezar, inferiorizarem-se perante a sua existência e capacidade de atingir outra dimensão, preferindo jogar pelo seguro e de ser o underdog. Foi assim que se ganharam tantas finais das provas europeias, que surpreenderam adversários, atingindo troféus e glórias que muitos ao início diziam “é impossível… não só é impossível, como não vai acontecer mesmo!”.

Contudo, olhe-se para o exemplo de Cristiano Ronaldo… nunca quis ser underdog, optou por controlar o seu destino, de encetar por um domínio total com uma agressividade sem recordação e os resultados estão à vista, não valendo a pena enunciar a sua longa, muito longa… extremamente longa lista de conquistas colectivas e individuais. Poucos foram os jogadores portugueses que tiveram este desdém perante o espírito nacional tão bem representado pelo Velho do Restelo.

É destino dos portugueses ter medo de ir mais além, de arriscar, de tentarem algo diferente e de se assumirem como actores principais e não secundários? Todos aqueles que viram a final do Euro 2016 podem contestar isto que acabámos de dizer, porque ganhámos o jogo sem “jogá-lo”, sem armar mais que dois remates durante 120 minutos, sendo mais vilões da uma bonita história que a França estava a escrever em casa.

Todavia, mudem a perspectiva dessa película best-seller… tirem a França de actor principal, colocando Portugal no seu lugar. Um jogo num ambiente infernal, com milhares de tropas francesas aos gritos e a vociferar um chamamento de guerra apelidado da Marselhesa, uma equipa munida de estrelas imparáveis e um momento de realidade versus fantasia. Para adicionar mais suspense à trama, o líder principal caiu por terra logo ao início, sacrificando-se pela sua equipa… substituição e todos já diziam, “ou Portugal se motiva com isto ou é o descalabro.”.

O actor secundário, a França, fazia de tudo para ganhar, mas até o poste decidiu criar amizade com Rui Patrício. Depois de muito sofrimento, Fernando Santos decide adicionar mais uns “pozinhos” para aguçar o drama… mete Éder. O silêncio à frente dos pequenos ou gigantes ecrãs foi notável, acompanhado de alguém a dizer (aquele amigo que percebe de bola mais que os outros), “Mas que raio está este homem a pensar? Agora é que não vamos ter bola!”.

Perante o silêncio, Éder decide revoltar-se contra tudo e todos e conquistou todas as bolas que chegaram pelo ar, roubou inúmeras faltas, transfigurando-se em algo que nunca tínhamos visto. E do nada, depois de um pormenor delicioso de João Moutinho, Éder recebe a bola e atira um remate a 100 metros da baliza! Bem, não foram 100, mas andou perto disso, talvez? A verdade é que Lloris não teve hipótese.

Da dúvida à emoção, das questões à paixão, da dura realidade ao saboroso concretizar do sonho… Portugal estava na frente. E passado 10 minutos, Portugal era Campeão Europeu. Campeão Europeu… quem diria depois de três empates na fase-de-grupos que as Quinas iriam subir ao pódio como vencedor? Que aquela melodia fez-se ouvir por todas cidades, vilas, aldeias, aglomerados, localidades, casas ou carros durante dias a fim, de Portugal a França, de França ao Brasil, de Brasil a Macau.. “Ai que Saudades eu já tinha da minha bela casinha tão modesta como eu….”.

Num dia de recordação (para não esquecer nunca mais, em jeito da obra magna de Luís de Camões, Os Lusíadas, ou de Fernando Pessoa, A Mensagem) falámos com alguns portugueses (e não só) e de como viveram aquele momento,

Nuno Fernandes, fotógrafo, encontrava-se na Praça do Comércio a registar o jogo em fotomontagem,

“Num Primeiro momento não acreditei que tínhamos marcado golo muito menos do Éder mas quando vi a repetição, já que estava a ver no écran gigante da praça do comércio e estava bem longe, gritei, gritei muito. Estava ao pé de alguns adeptos franceses e a minha alegria passou para eles e brincámos e falámos algum tempo sobre o jogo..”

Tomás Cardoso, auditor na altura estudante, estava com amigos,

“Euforia e surpresa… é como me lembro do momento. Festejámos tanto que um dos meus amigos, aos saltos, deu-me uma cotovelada e abri o lábio… sangue, lágrimas de felicidade e muito suor por faltarem ainda 10 minutos para o fim. Mas senti que íamos ganhar.”

Fernando Santos, autor do site Muda o Teu jogo, relembrou os seus pensamentos,

“Pensei como é bonito o desporto. Acredito que há muitas vezes uma justiça poética invisível e o que senti a seguir foi: “toca a defender como nunca!”

Sebastião Sequeira, é controlador aéreo na Força Aérea,

“É difícil… foi inesperado, o Éder entrou muito bem no jogo e só me apercebi que era golo quando a bola entrou. Não sei descrever… chorei, foi como um conto de fadas mas real: o Cristiano Ronaldo lesionado, o underdog a marcar um golo impossível a uma grande França que jogava em casa. Ainda hoje em dia não consigo encaixar que fomos e somos campeões europeus.”

Filipe Ótão, consultor imobiliário,

“Epá! Lembro-me que fiquei sem reacção, não percebi logo o que tinha acontecido, mas depois foi uma explosão de alegria. Depois pensei que já não nos fugia o campeonato da Europa, vi o resto do jogo sem medo e certo de que íamos ganhar.”

José Duarte, autor do Norte de Alvalade e consultor,

“A primeira coisa que me passou pela cabeça é que não era golo. Teria que existir uma falta qualquer, um sentimento semelhante ao anticlimax que representou aquele penalti do Abel Xavier. Europeu de 2000 contra a França Depois foi uma alegria indescritível e uma satisfação inexplicável pelo golo de um patinho feio como o Éder Como que a dizer que há sempre uma possibilidade à nossa espera. Como indivíduos, como Nação, há sempre uma possibilidade de redenção. Como diriam nuestros hermanos, “de pelicula”

Victor Ramalho, director do Portal do Rugby,

“Na hora do golo realmente passou-me pela minha cabeça que Portugal ia ser campeão. Em primeiro lugar achei fenomenal Portugal 12 anos depois daquela tragédia em 2004 conseguir a redenção… aquele momento foi inesquecível… não é para qualquer país. Especialmente para países “pequenos” de dimensão populacional. É um sentimento mesmo de redenção. Ganhar o europeu foi uma prova que é um país forte no futebol!”

Rui Mesquita, autor do Fair Play e estudante em Micro e Nanotecnologias Universidade do Minho ,

“Assumo-me como não merecedor do milagre de Eder. Quando o avançado chutou pensei “porquê?”, mas quando a bola entrou saltei do sofá e corri pela casa como se o golo tivesse sido meu. Momento mais épico que vivi desde que vejo futebol!”

Diogo Rodrigues, designer comercial e industrial,

“No golo tivemos sorte, existe aquela sucessão de toques com a posse a ficar do nosso lado e sem ser assinalada uma falta (do João Moutinho???) sobre um jogador francês. Marcamos num lance em que só o Eder percebeu que era possível e o primeiro pensamento que me veio à cabeça foi “como portugueses que somos, vamos ter que sofrer até ao final, andámos a qualificação agarrados à calculadora e agora não largamos o relógio!”. Após o golo não consegui sentar mais. Sofremos mas ganhámos”


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